Para a Fazenda, ministro é articulador das reformas
Citado por amigo de Temer, ele ficará licenciado pelo menos até dia 6
Citado pelo advogado José Yunes, amigo do presidente Temer, como destinatário de envelope que, segundo delator da Odebrecht, continha dinheiro de propina, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, deverá ter a licença médica estendida. A ausência do ministro nas negociações de reformas importantes com o Congresso, como a da Previdência, preocupa a equipe econômica do governo. Padilha é visto como a “voz forte” do Planalto na condução dos projetos.
Incerteza ameaça reformas
Equipe econômica teme que, sem Padilha, propostas para Previdência sejam desfiguradas
Geralda Doca e Cristiane Jungblut | O Globo
BRASÍLIA - As incertezas em relação ao retorno do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, ao cargo preocupam a equipe econômica. Segundo um interlocutor, Padilha é hoje o “homem forte e fiador” da reforma da Previdência, uma das prioridades do Planalto no Congresso. Aprovar a reforma é importante para consolidar a retomada da credibilidade na economia ao sinalizar para os investidores maior controle das contas públicas.
Padilha encampou o estudo dos técnicos da Fazenda e da Casa Civil que sustentou o texto enviado ao Legislativo. Além disso, disse a fonte, ele tem habilidade política e pertence ao “clube” (dos políticos).
— Não há alguém com esse perfil, que seja capaz de assumir com rigor a negociação da reforma com os parlamentares — afirmou integrante da equipe econômica.
DERRETIMENTO DO NÚCLEO DURO
O receio é que se a negociação ficar por conta do presidente Michel Temer, a proposta final saia totalmente desfigurada O presidente, destacou o interlocutor, tem dificuldade de tomar posições. O ministro Antonio Imbassahy, da Secretaria de Governo, também tende a fazer concessões na opinião dos técnicos da área econômica.
Delegar a missão ao ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, seria arriscado, porque o entendimento no governo é que falta habilidade política ao ministro. Deixar a negociação por conta dos técnicos também é complicado porque eles não são do “clube” e estão sofrendo só para explicar a reforma aos parlamentares.
Ao montar o núcleo decisório do governo de transição, colocando em postos-chave amigos de 30 anos de militância no PMDB, Temer não imaginava que em pouco tempo veria a queda de um a um, abatidos por escândalos e denúncias de corrupção, levando-o a um isolamento no Planalto que preocupa aliados dentro e fora do PMDB.
Enquanto a equipe econômica começa a colher algumas conquistas, a crise política e o derretimento do núcleo duro do governo ameaçam afetar esses resultados, inclusive com impacto na base durante a votação das reformas. O baque mais forte para Temer foi originado pelas denúncias do advogado José Yunes, amigo pessoal do presidente, de que foi “mula” do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, ao receber em seu escritório um pacote entregue pelo doleiro Lúcio Funaro. Segundo delação de executivo da Odebrecht, propina de R$1 milhão para campanhas do PMDB foi entregue no escritório de Yunes. A denúncia do amigo do presidente joga a Lava-Jato no colo de Temer, dentro do Palácio do Planalto.
Afastado para fazer uma cirurgia e com retorno incerto, Padilha deixa sem comando uma pasta considerada o coração do governo. E Temer cada vez mais refém de outros partidos da base, principalmente do PSDB. Do núcleo duro de colaboradores de Temer, apenas o ministro da Secretaria Geral, Moreira Franco, ainda permanece no cargo. Padilha está afastado; o senador Romero Jucá (PMDB-RR), investigado na Lava-Jato, teve que deixar o ministério do Planejamento; Geddel Vieira Lima também teve que deixar a Secretaria de Governo.
Do núcleo mais próximo a Temer, ainda caiu o ex ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, que foi presidente da Câmara . O grupo do PMDB que há anos desfruta da intimidade do presidente é facilmente identificado: todos o chamam de “Michel” apenas e não de Temer ou de presidente.
O inferno astral de Temer ainda foi agravado, essa semana, com o desfalque no comando do Ministério das Relações Exteriores. José Serra (PSDB-SP) alegou problemas de Saúde e retomou seu mandato no Senado. A perda dos colaboradores mais próximos faz Temer se fixar na dupla Moreira Franco e Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, o que tem irritado a base dos parlamentares na Câmara.
Temer queria partir para um feriado de Carnaval tranquilo na Bahia, mas a semana termina com problemas acumulados. Entre aliados, a preocupação é que o trunfo de Temer no Congresso — uma maioria sólida na Câmara e no Senado — caia por terra e comprometa a aprovação das reformas da Previdência e trabalhista. Os estragos na condução política podem comprometer o momento de respiro na economia. O próprio anúncio da liberação de recursos de contas inativas do FGTS — que tinha causado boa reação na população —e a nova queda da taxa de juros viraram notícias de menor importância nas últimas horas.
— Temer está vivendo um momento muito complicado. Todo o núcleo duro está saindo. E ficar sem pessoas para conversar é muito complicado para um governante — confidenciou um aliado.
Mas a maior consequência do isolamento do presidente é uma preponderância do PSDB. O presidente do partido, senador Aécio Neves (MG), tem ido cada vez mais ao Planalto. O PSDB já conseguiu emplacar o deputado Antonio Imbassahy na Secretaria de Governo, que tem o papel de fazer a ponte política com o Congresso.
— Essa aproximação só causa mais ciúmes no PMDB — observa um aliado.
— A decorrência natural é que Temer, para fugir do isolamento, demande cada vez mais a presença de quadros do PSDB que possam apoiá-lo e com quem trabalhe com um grau de confiança maior. Lamentavelmente, ele perdeu esses interlocutores de confiança no PMDB, não sobrou ninguém e a bancada é um deserto.
Ele tem chamado o Aécio cada vez com mais frequência ao Planalto, e o Imbassahy vai crescer muito. É discreto e confiável. Vai gerar ciúmes? Vai. Mas lamentavelmente eles não têm como reagir a isso — disse um dirigente tucano.
O desmantelamento do grupo mais próximo de Temer chegou a ser batizado ontem de “jogo do resta um”. Entre os interlocutores do presidente, há divergências sobre as reais intenções do advogado José Yunes, amigo do presidente, ao declarar ter recebido um pacote a mando de Padilha. Abatido e com problemas de saúde, Padilha pediu licença médica. Oficialmente retorna dia 6, mas deve prolongar a licença por tempo ainda não sabido. Médicos e amigos dizem que uma cirurgia como a que ele fará requer repouso de 12 a 15 dias. Seria o tempo de avaliar as consequências das declarações de Yunes.
O sentimento político é que Padilha poderá não voltar, se a sangria das denúncias for maior e seu retorno significar mais desgaste no Planalto.
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