A ressurreição da proposta equivocada da votação em lista fechada serve ao propósito de esconder do eleitorado candidatos processados
Não se discute a necessidade imperiosa de uma reforma política, urgente há mais de década. Mas não esta que acaba de ser tirada do baú de políticos que se apressam a blindar-se diante da segunda lista de Rodrigo Janot, procurador-geral da República, enviada ao relator da Lava-Jato no Supremo, ministro Edson Fachin, na terça-feira. Trata-se de óbvia proposta de ocasião, feita sob encomenda.
Inexiste coincidência fortuita entre o encaminhamento ao Supremo de 83 pedidos de abertura de inquérito sobre deputados, senadores e ministros de Estado —é a segunda vez, durante a Lava-Jato, que Janot encaminha nomes à Corte com este objetivo —e o surgimento de um conjunto de medidas para alterar regras eleitorais, com a sugestiva ressurreição do sistema de voto em lista fechada. Pela qual ao eleitor cabe apenas avalizar uma relação de candidatos a deputado e a vereador montada autocraticamente pelas direções partidárias.
Sistema já rejeitado no Congresso, o método da lista fechada volta agora de carona com a percepção, surgida no decorrer da Lava-Jato, de que seria impossível financiar campanhas pela via legal. Ato contínuo, voltou-se a defender a estatização total das finanças político-eleitorais — já não fosse o bastante a pesada carga tributária no país —, depois de já terem elevado o Fundo Partidário de pouco menos de R$ 300 milhões para R$ 800 milhões. Será mais um abuso contra o contribuinte a criação de uma despesa adicional bilionária para gastos em campanhas, em que é seguro que o caixa 2 continuará em ação. Mesmo que haja alguma retração agora, na esteira da repercussão dos inquéritos abertos a partir das delações da Odebrecht.
Reuniram-se anteontem, no Planalto, com o presidente da República, Michel Temer, o ministro do STF, Gilmar Mendes, atual presidente do TSE, e os presidente da Câmara e do Senado, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) e senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), dois listados por Janot. Na agenda, o tema óbvio.
Há enorme pressa, porque, para as mudanças valerem já no ano que vem, precisam ser avalizadas pelo Congresso até setembro. Justifica-se a lista fechada como para viabilizar o financiamento público total de campanha. Mas há um motivo forte, oculto: ao instituir a eleição por lista fechada de candidatos, o Legislativo não exporá nomes sob investigação no Supremo e mesmo já denunciados pela Procuradoria-Geral da República. Será um estrondoso estelionato eleitoral, cometido por vias legais. Com a suprema distorção de que, em muitos partidos, os caciques que escolherão os candidatos também farão parte da lista de Janot.
A ousada manobra em curso ajuda a ressaltar a necessidade de uma reforma mínima, que toque em poucos pontos-chave, como a instituição de cláusula de desempenho, para que apenas partidos que tenham uma determinada quantidade de votos consiga acesso ao Fundo Partidário, ao horário dito gratuito de propaganda política e a outras facilidades. Nada mais democrático.
Nem é preciso começar do zero, porque já tramita no Senado, aprovada no primeiro de dois turnos exigidos por lei, emenda à Constituição que institui a cláusula, comum em muitos países. Reforma de sistema eleitoral não pode se prestar a truques.
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