O governo elevou a previsão de rombo nas contas públicas em 2018. A meta agora é ter um déficit de R$ 129 bilhões, e não mais de R$ 79 bilhões. Segundo o ministro Meirelles, a recessão de 2016 reduziu a arrecadação. Analistas elogiaram a mudança, como sinal de transparência. Mas temem que concessões na reforma da Previdência piorem a situação fiscal.
Rombo maior para 2018
Meta fiscal passa de déficit de R$ 79 bi para R$ 129 bi. Só em 2020 haverá resultado positivo
Martha Beck, Bárbara Nascimento | O Globo
Um dia depois de recuar na proposta de reforma da Previdência para tentar viabilizar sua aprovação no Congresso, o governo anunciou ontem que trabalhará com um rombo maior nas contas de 2018. A meta fiscal do governo central para o ano que vem foi revista de um déficit primário de R$ 79 bilhões para um de R$ 129 bilhões. A equipe econômica também mudou suas projeções para 2019 — de resultado primário zero para um déficit de R$ 65 bilhões — e informou que, agora, só espera um número positivo em 2020, quando a meta será um superávit de R$ 10 bilhões.
A decisão mostra o choque de realidade ao qual o governo Michel Temer foi submetido nas duas últimas semanas, tanto em relação à sua capacidade política quanto a entregar o ajuste fiscal prometido ao mercado. Primeiro, foi preciso contingenciar o Orçamento de 2017 em R$ 42,1 bilhões e acabar com a desoneração da folha de pagamento da maioria das empresas para tentar alcançar a meta deste ano, de déficit primário de R$ 139 bilhões. Depois, foi preciso alterar pontos da reforma da Previdência, o que significa uma perda entre 15% e 20% no valor que o governo esperava economizar com as mudanças no regime de aposentadorias no país. Por fim, mudou-se a meta que será apresentada no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2018.
SALÁRIO MÍNIMO VAI A R$ 979 NO ANO QUE VEM
A proposta, que será encaminhada ao Congresso na semana que vem, prevê que a economia crescerá 2,5% em 2018 e 2019 e 2,6% em 2020. Já a inflação ficará em 4,5% nesses três anos. Com os novos números, o salário mínimo só ultrapassará o patamar de mil reais em 2019. A remuneração básica do trabalhador subirá de R$ 937 para R$ 979 em 2018. No ano seguinte, irá a R$ 1.029, atingindo R$ 1.103 em 2020.
Ao divulgar os novos números, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, atribuiu a revisão das metas ao fato de a recessão da economia em 2015 e 2016 ter prejudicado o comportamento da arrecadação acima do esperado. Segundo ele, embora o Produto Interno Bruto (PIB) já dê sinais de recuperação, há um impacto defasado nas receitas. Pelas contas do governo, a receita total da União cairá de 20,6% para 20,5% do PIB entre 2017 e 2018.
— A recessão de 2016, conjugada com o ano anterior, foi mais rigorosa do que se previa e teve impacto nas projeções de arrecadação. Eram dados dos quais não se dispunha alguns meses atrás — disse Meirelles. — Os números de hoje (ontem) não surpreendem muitas pessoas porque são realistas, sólidos. Eles vão diminuir a velocidade de subida da dívida pública, que depois vai começar a cair, o que é uma trajetória natural. Não podemos esquecer que estamos saindo da maior crise do Brasil.
A nova meta de 2018 não leva em consideração as mudanças feitas no projeto de reforma da Previdência, que reduzem a economia prevista pelo governo para os próximos anos. Isso porque o governo não pode considerar no PLDO receitas e despesas provenientes de projetos que ainda não foram aprovados no Congresso.
A decisão de mudar a meta de 2018 imediatamente não era consenso no governo. Nas últimas semanas, parte da equipe econômica defendia essa medida, alegando que, diante do fraco desempenho das receitas e da dificuldade em enxugar despesas, a meta de R$ 79 bilhões não era mais realista e deveria ser alterada logo. Outro grupo, no entanto, acreditava que seria melhor mandar o PLDO com o número original e esperar a aprovação da reforma da Previdência, o que daria um compromisso mais firme com a austeridade. Temer, porém, bateu o martelo de que era preciso mostrar realismo fiscal ao mercado o quanto antes.
Para reforçar o argumento, Meirelles destacou, em seu discurso ontem, que, apesar da revisão da meta, o governo continua comprometido com a redução do déficit primário ano a ano. Segundo ele, as novas projeções não contemplam aumentos de tributos nem o impacto da reforma nas aposentadorias. Pelas contas da equipe econômica, o déficit da Previdência chegará a R$ 202,2 bilhões em 2018. Para 2017, o rombo previsto é de R$ 188,8 bilhões.
O ministro também defendeu a estratégia do governo de negociar mudanças na reforma, lembrando que as alterações fazem parte de uma margem que o governo pode acomodar. O projeto original geraria uma economia para os cofres federais entre R$ 750 bilhões e R$ 800 bilhões em dez anos. Com as alterações negociadas, esse número deve cair entre 15% e 20%.
— Não se pode pretender que, em um projeto dessa magnitude, não haja alteração em nenhuma vírgula. Essa estratégia (de negociação) me parece bastante correta e adequada — disse o ministro.
Ele ressaltou que o governo já esperava ter de negociar e que a nova configuração da reforma da Previdência está “dentro de uma margem razoável”. Meirelles ressaltou que essas mudanças já estavam incorporadas nas projeções de mercado, que estimavam, inclusive, um cenário mais pessimista, de uma economia 30% menor após as negociações com o Congresso.
O ministro evitou detalhar as medidas que o governo vai adotar para compensar as mudanças negociadas com o Congresso na reforma da Previdência. Embora nos bastidores o governo esteja estudando ações como o fim do abono salarial, Meirelles adotou um tom cauteloso:
— Ainda não temos medidas ou mudanças compensatórias. O momento, agora, é adequado para fazer negociações com o Congresso, quando o relatório está sendo preparado e será votado no plenário.
EXPECTATIVA DE MELHORA NOS ESTADOS
Os técnicos do governo reconhecem que a meta fiscal de 2017 também será um desafio, mas é mais factível, pois receitas extraordinárias ajudarão a fechar as contas. Há a previsão de ingresso de R$ 8 bilhões nos cofres públicos com precatórios. Além disso, a área econômica já estima que conseguirá arrecadar entre R$ 4 bilhões e R$ 6 bilhões a mais do que o previsto originalmente com os leilões de petróleo e gás. Também entram na conta receitas com o novo Refis e a reabertura do programa de repatriação. Nada disso está no radar para 2018:
— A meta de 2017, embora seja um rombo maior, tem condições de ser alcançada graças a receitas, muitas delas extraordinárias, que vão ajudar no fechamento das contas. Já em 2018, não se pode contar com isso — disse um integrante do governo.
De acordo com o PLDO, o setor público consolidado fechará 2018 com um déficit primário de R$ 131,3 bilhões. Empresas estatais devem ter um rombo de R$ 3,5 bilhões, enquanto estados e municípios terão um superávit primário de R$ 1,2 bilhão. Meirelles disse esperar que o resultado de estados e municípios melhore nos próximos anos. Segundo ele, isso vai decorrer da recuperação da economia. Há, ainda, os efeitos da renegociação da dívida dos estados com a União.
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