Políticos terão poder de influir em nomes de lista fechada em eleições
Jeferson Ribeiro | O Globo
O processo interno dos partidos para definir os candidatos a deputados federais e estaduais na eleição de 2018 será comandado por políticos que são alvo de investigações no Supremo Tribunal Federal. Dos dez maiores partidos da Câmara dos Deputados, oito têm presidentes com inquéritos no STF. Além dos presidentes, muitos investigados ocupam cargos nas comissões executivas dos partidos em âmbito nacional e também comandam as legendas em suas bases regionais.
No PMDB, que tem a maior bancada, a situação é emblemática. Além do presidente da legenda, senador Romero Jucá (RR), outros quatro membros da comissão executiva são alvos de investigações na LavaJato. Entre as dez maiores bancadas, apenas os presidentes do PSB, Carlos Siqueira, e do PT, Rui Falcão, não são alvos de investigação. Os petistas, porém, elegerão um novo comando em junho, e os dois senadores que concorrem à presidência, Gleisi Hoffmann (PR) e Lindbergh Farias (RJ), são alvo de inquéritos na Lava-Jato.
CACIQUES TERÃO MAIS PODER
A importância dos caciques no processo de escolha interna aumentará se o Congresso aprovar do jeito que está a emenda constitucional que muda o sistema eleitoral, parte da reforma política. O projeto institui o chamado voto em lista. Em vez de o eleitor escolher um candidato, ele pode votar apenas no partido, que definirá a ordem dos nomes na lista. Se a sigla receber votos para eleger dez deputados, entram os dez primeiros da lista. Se forem vinte, os vinte primeiros, e assim por diante.
Cabe à cúpula partidária definir as regras para composição das listas de candidatos. Ou seja, o novo sistema permitiria que políticos com problemas na Justiça tivessem mais poder, até mesmo para indicar pares também investigados. Uma vez eleitos, estes políticos mantêm o foro privilegiado e trabalham com a perspectiva de processos mais lentos.
A pressão pela manutenção do foro privilegiado e por mudanças no sistema eleitoral para implantar o modelo de listas tende a aumentar depois que o ministro Edson Fachin autorizou a investigação contra 24 senadores e 39 deputados, com base dos depoimentos de exexecutivos da Odebrecht.
A mudança no sistema eleitoral é o centro da proposta de reforma política analisada pela Câmara dos Deputados. Sem poder contar com o financiamento empresarial, o relator da reforma política, Vicente Cândido (PT-SP), propõe criar um fundo eleitoral com dinheiro público para financiar as campanhas.
Mas, na visão do relator, o financiamento público só funciona com o sistema de votação por listas fechadas, quando os candidatos são ordenados numa lista depois que os partidos fazem eleições internas para decidir quem concorrerá. Assim, os candidatos dos mesmos partidos não disputariam entre si, e a campanha ficaria mais barata.
O relator até tomou cuidado de exigir processos democráticos para as escolhas, com regras claras, mas as máquinas partidárias brasileiras sempre favoreceram decisões de cúpula e há dúvidas de que essa cultura seria deixada para trás.
Cândido integra a lista de parlamentares que passaram a ser investigados no Supremo Tribunal Federal depois da delação de executivos da Odebrecht. Ele foi acusado de receber R$ 50 mil, via caixa 2, em troca de ajuda na aprovação do financiamento do estádio do Corinthians, o Itaquerão, construído para a Copa do Mundo de 2014. Ele ainda não comentou a abertura de inquérito. O GLOBO tentou falar com ele, mas não conseguiu.
O deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), membro da comissão, disse que o atual sistema eleitoral está esgotado e gerou uma irracional fragmentação partidária. Porém ele avalia que este é o pior momento para o debate, por causa da crise política instalada pelas investigações da Lava-Jato. O tucano não acredita que a emenda com o sistema de lista partidária seja aprovada.
— Não acho que isso passaria. Dado o ambiente de desconfiança após a crise e as revelações da Lava-Jato, (esse sistema) autoriza essa leitura de que (os investigados) vão se esconder atrás das listas partidárias — disse o tucano.
— O sistema partidário é muito frágil e não há tradição de democracia interna. Há um pé atrás de como as listas serão formadas e uma tremenda percepção de caciquismo — acrescentou Pestana.
PRESSÃO DAS REDES
Já o cientista político Jairo Nicolau critica o debate de mudanças tão profundas no sistema eleitoral sob coordenação de um Congresso desacreditado. Para ele, contudo, o argumento de que os partidos usariam as listas para blindar seus correligionários investigados é fraco.
— Usar esse argumento é pressupor que o eleitor está em completa desinformação. Imagina o bombardeio que um partido que fizer isso vai ter nas redes sociais. Isso é pressupor que o eleitor, principalmente das grandes cidades, vai cair nesse conto — disse.
Nicolau argumenta que o número de parlamentares investigados é menor do que o daqueles que estão fora dos holofotes e não veem motivos para mudar o sistema, com o qual estão acostumados a vencer eleições. Para que as novas regras eleitorais sejam aplicadas nas eleições do ano que vem, devem ser aprovadas até o final de setembro.
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