- O Globo
Recebi de Cristiano Zanin, advogado do ex-presidente Lula, uma carta em que, além de considerações sobre a atuação do Grupo Globo, faz críticas ao meu trabalho e aponta o que seriam incorreções e mentiras da coluna publicada na sexta-feira com o título “Segredo de Polichinelo”.
As opiniões do advogado sobre minha atuação ou a do Grupo Globo não têm a menor importância, mas fatos que ele taxa de mentirosos ou distorcidos merecem contestação. Diz Cristiano Zanin que o ex-presidente da OAS, Leo Pinheiro, em depoimento, admitiu que Lula jamais teve a chave ou usou o imóvel; jamais manteve qualquer pertence pessoal no local; jamais teve qualquer título de propriedade do apartamento, o que demonstraria que não é o proprietário do imóvel.
Esqueceu-se o advogado de que Leo Pinheiro respondeu a perguntas sobre o tema de maneira bastante direta: não havia chave nem poderia haver objetos pessoais porque o apartamento estava em obras. E, a pedido do próprio ex-presidente, a transferência do título de propriedade não feita por questões políticas, pois desde 2009, quando o Globo denunciou a existência do tríplex no Guarujá, Lula pediu sucessivamente para adiar a assinatura.
Zanin diz ainda que Leo Pinheiro “negou quando perguntado se algum recurso utilizado no tal tríplex era proveniente da Petrobras”. Quem se dispuser a ver o vídeo do depoimento do ex-presidente da OAS constatará, a partir de 1h57m de gravação, que a história é bem outra.
Leo Pinheiro realmente negou que a propina fosse da Petrobras, mas de forma irônica: “Quem paga propina é a contratada, não a contratante”. E relatou que a propina paga pela OAS ao PT e ao PP era proveniente de três obras da empreiteira para a Petrobras, entre elas a Refinaria Abreu e Lima, e foi paga num acerto de contas do equivalente a 1% da obra para cada partido. O dinheiro gasto no tríplex do Guarujá e também no sítio de Atibaia foi abatido dessa propina do PT, por autorização do próprio Lula.
A certa altura, Leo Pinheiro chega a afirmar claramente que houve “pagamento de propina da Petrobras”, o que não quer dizer que o dinheiro tenha sido pago pela estatal, mas que saiu de suas obras superfaturadas.
Zanin tem razão quando diz que atribuí a ele um comentário feito por seu colega Roberto Batochio. Como no vídeo não aparecem rostos, mas apenas vozes, devo ter confundido. Mas a crítica é a mesma, pois ao afirmar que “se o apartamento é de Lula, a empreiteira cometeu um crime ao dizer-se dona do apartamento”, e exigir uma ação do Juiz Sérgio Moro, o advogado admitiu o que a defesa de Lula nega. E como Zanin garante que apoia a declaração de seu colega de defesa — que, aliás, parece estar deixando o caso —, a crítica vai para ele também.
O advogado de Lula diz também que fiz “ataques diretos e levianos” a ele e ao advogado Roberto Teixeira, que meu relato sobre a combinação de Alexandrino Alencar, da Odebrecht, e seu sogro, Roberto Teixeira, sobre notas frias para justificar as obras do sítio de Atibaia “jamais existiu e não tem amparo sequer na delação premiada do executivo da Odebrecht, que jamais fez referência a notas frias. Isto é criação sua, com a evidente intenção de caluniar o advogado Roberto Teixeira, ex-presidente da OAB/SBC e que tem uma história ilibada de 47 anos de advocacia”.
Para assistir ao vídeo com o depoimento de Alexandrino, basta ir ao YouTube e buscá-lo com o título “Obras no sítio de Atibaia tiveram notas fiscais forjadas”. Lá verá o próprio Alexandrino contando que em março de 2011 recebeu um telefonema de Teixeira pedindo que fosse a seu escritório, pois estava preocupado em “formalizar” as obras no sítio Santa Bárbara: “Fui lá e ele estava preocupado, digamos, como é que poderia aparecer essa obra sem vínculo com proprietários do sítio. Então marcamos uma reunião uma semana, dez dias depois. Fui eu e o engenheiro (da Odebrecht) Emir conversar com ele. Ele estava preocupado, claramente preocupado”.
“Aparece um pessoal de engenharia, construiu a coisa, foi embora. E essa conta, como é que aparece?”. Alexandrino disse que Teixeira fez o pedido: “Ele falou: a obra terminou. A obra de Atibaia, porque o sítio é do Fernando Bittar e precisamos, como se diz, formalizar a obra.”
A saída encontrada, segundo Alencar, foi emitir notas fiscais das obras, que haviam terminado dois meses antes: “Isso foi feito com notas fiscais através... que o Emir conseguiu falar com o Carlos Rodrigues Prado (empreiteiro subcontratado para a obra) para fazer uma nota fiscal mostrando que foi pago pelo Fernando Bittar”.
Segundo Alencar, os documentos fiscais foram feitos de maneira a caberem no perfil econômico de Bittar: “Foi feito um escalonamento do pagamento para não ficar uma coisa muito cara que inviabilizasse, digamos, como é que o Fernando Bittar ia pagar toda a obra?”. O total da obra foi de R$ 1 milhão.
Se isso não é fazer “notas frias”, não sei o que é.
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