Ranier Bragon, Bruno Boghossian, Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - O placar que o governo espera obter na Câmara para barrar a denúncia criminal contra Michel Temer inclui um grupo expressivo de deputados que pretende usar a votação para impor uma derrota ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Essa ala é formada por alvos da Lava Jato e deputados críticos às investigações, além de parlamentares que dizem ver um alinhamento excessivo do chefe do Ministério Público com teses da esquerda.
Temer precisa que pelo menos 172 dos 513 deputados votem contra a denúncia ou simplesmente não apareçam na sessão, já que é preciso haver um mínimo de 342 votos para que o Supremo Tribunal Federal seja autorizado a decidir se processa o peemedebista por corrupção passiva.
"Há uma insatisfação muito grande entre os deputados com ele [Janot]. Enquanto corre no caso do Temer, nas investigações contra deputados ele abre [inquéritos] e deixa na geladeira. A tendência aqui é de os caras votarem não pelo Temer, mas contra o Janot", afirma o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP).
Alvo da Lava Jato, Paulinho da Força, como é mais conhecido, reverbera o discurso de políticos que consideram excessivamente demorada a conclusão das investigações contra os parlamentares suspeitos de integrar o esquema.
Em março, reportagem da Folha mostrou que da primeira lista de investigados pela PGR (Procuradoria-Geral da República) na Lava Jato, anunciada dois anos antes, 40% das 27 investigações haviam sido arquivadas no todo ou em parte. Outras 17 seguiam em aberto, sem conclusão.
Desde o início da Lava Jato, a PGR já abriu investigações contra 64 deputados federais: 25 mencionados nos depoimentos dos primeiros delatores da operação, como o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, e 39 citados pelos executivos da Odebrecht.
Janot ainda pode pedir a abertura de inquérito contra outros parlamentares, a partir da delação da JBS. Em depoimento, o ex-diretor Ricardo Saud disse aos procuradores que "propina" da empresa ajudou a eleger 167 deputados.
Nesse cenário, a defesa de Temer decidiu apostar no espírito de corpo da classe política e estimular um contra-ataque dos deputados ao procurador-geral, em busca de blindagem. O recado é claro: se Temer cair, os congressistas serão os próximos alvos.
"Depois que Janot vestiu a camisa do PT e fez aliança com Joesley Batista [dono da JBS], ele passou dos limites. Dá celeridade ao caso do Temer e trata com lentidão os outros processos. O que ele quer é enfraquecer o presidente para Lula voltar pelas eleições diretas", afirma o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), ferrenho defensor do presidente.
"O lado de lá está trabalhando a todo vapor, temos que trabalhar aqui", diz outro aliado de Temer, Beto Mansur (PRB-SP), referindo-se à pressão de governistas para que as prováveis outras denúncias contra Temer sejam unificadas em uma única votação.
Entre alguns deputados sem envolvimento com investigações da Lava Jato, as críticas a Janot também se sobrepõem à análise específica das acusações feitas contra Temer.
Ligado a Silas Malafaia, Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) diz que sua "vontade" é votar "não a favor do Temer, mas contra Janot". O deputado afirma que o procurador se alinha ideologicamente à esquerda e critica especificamente ações patrocinadas por ele contra prefeituras que proíbem o ensino sobre diversidade de gênero e orientação sexual.
Nas ações, Janot diz que essas proibições estimulam a homofobia e atentam contra a laicidade do Estado ao se basear em "concepção moral de marcado fundo religioso". A PGR não quis se manifestar sobre as críticas dos parlamentares.
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