segunda-feira, 3 de julho de 2017

Mudar para ficar igual – Editorial | Folha de S. Paulo

Enquanto o descrédito do governo emperra sua agenda, as energias dos congressistas voltam-se, de modo cada vez mais explícito, para a própria preservação.

Enfraquecem-se as reformas, avançam remendos para dar ares de mudança ao conservadorismo.

A proposta de emenda constitucional destinada a reformular a Previdência, da qual depende o programa de reequilíbrio do Orçamento da União, tende a ser desfigurada —restaria para votação uma versão mínima, a deixar para o futuro incerto medidas essenciais.

A reforma política parece fadada ao mesmo destino. Há textos distintos em tramitação no Congresso, mas o que lideranças da Câmara dos Deputados e do Senado têm discutido não passa de um pacote de ocasião, sob medida para preservar o statu quo.

As mudanças devem ser aprovadas até setembro para que disciplinem as eleições de 2018. O desinteresse em inovações substantivas e a exiguidade do prazo, tudo indica, contribuirão para a inércia.

De maior prioridade para a confraria é a aprovação de um fundo de campanha, a ser irrigado com R$ 3,5 bilhões em dinheiro público. Viver de caixa dois se tornou mais perigoso; doações individuais não bastam para as exorbitâncias do marketing das candidaturas.

No mais, tudo é incerto, quase improvável. É possível que se aprove alguma cláusula de barreira —a exigência de um patamar mínimo de votos para que um partido tenha acesso a tempo de rádio e TV e a recursos orçamentários.

Já muito permissivo, o piso aprovado pelo Senado, de 2% dos sufrágios, ameaçaria cerca de metade das legendas hoje representadas no Congresso. Logo, corre o risco de ser rebaixado.

Há também grande interesse em descartar a emenda que proíbe coligações em eleições proporcionais.

A associação entre siglas incentiva a proliferação de agremiações negocistas, que buscam no consórcio com as maiores um trampolim para eleger seus candidatos. Em troca, oferecem tempo de TV e atos de pirataria eleitoral, como ataques grosseiros a adversários.

Já o desejável sistema distrital misto deve ficar para 2022, se tanto. No lugar, ameaça-se aprovar o chamado distritão, sistema em que os nomes mais votados em cada Estado levam as cadeiras da Câmara, sem levar em conta o desempenho de partidos ou coligações.

O mecanismo, nota-se, favorece os políticos já estabelecidos e as celebridades oportunistas, em prejuízo da identidade partidária.

Entende-se a mudança. A imagem dos partidos afunda no lodaçal de escândalos. Melhor não fazer alarde da filiação, mas antes safar-se de modo individualista.

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