De saída da Procuradoria Geral da República, Rodrigo Janot parece obcecado em condenar o presidente da República, Michel Temer. Deve-se lembrar, no entanto, que Janot é o mesmo procurador que em abril de 2016 acusou a então presidente Dilma Rousseff de tentar levar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a Casa Civil com o intuito de livrá-lo das mãos do juiz federal Sérgio Moro.
No caso Lula-Dilma, Janot se serviu da gravação de uma conversa por telefone entre Lula e Dilma obtida ilegalmente para fundamentar sua acusação à ex-presidente. No caso agora de Temer, o procurador-geral é acusado de precipitação ao apresentar uma denúncia contra o presidente da República, baseado em apenas uma gravação ambiental, embora haja outros elementos complicando a situação do presidente, uma vez que seu assessor, o deputado Rocha Loures, foi filmado recebendo mala com dinheiro de propina.
Caberá à história julgar se Rodrigo Janot, nos dois casos, apenas seguiu à risca o paradigma de que ninguém está acima da lei ou fora de seu alcance, nem mesmo os poderosos de plantão, muito embora a mão longa do procurador só os tenha alcançado em momentos de grande fragilidade política. No caso de Dilma, reformando posição anterior do próprio Janot.
O que não ajuda o país é a decisão do procurador de fatiar as denúncias, o que, nas palavras do ex-ministro do STF Carlos Velloso, em entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo", "só serve para tumultuar o tribunal, o Poder Legislativo e o próprio governo". O fatiamento, na opinião do ex-ministro, "prejudica a própria denúncia e é totalmente político".
Sem julgar as intenções do procurador-geral, pode-se afirmar que a decisão de Janot praticamente joga por terra o esforço feito pelo governo e a equipe econômica para aprovar as reformas e reabre incertezas em relação ao futuro. Isso porque, a partir de agora, será virtualmente impossível a abertura de uma janela que permita, por exemplo, a votação da proposta da reforma previdenciária, capítulo considerado essencial para o ajuste da economia.
O centro de gravidade do Congresso, nos próximos dias, estará na Câmara, onde será votada a autorização para o Supremo processar o presidente. Mesmo considerando-se que o presidente Temer ainda reúne em torno de si apoio suficiente para barrar a autorização, o processo político pode ser longo, penoso e paralisar o governo. Isso sem falar nos riscos de que, no esforço para salvar o mandato, Temer ceda à tentação de abrir os cofres públicos e comprometer o ajuste fiscal.
O processo contra Dilma levou oito meses no Congresso. Se a Câmara conceder a autorização, o STF terá até 180 dias para concluir o julgamento do presidente, a menos que Temer renuncie ao mandato ou sofra o impeachment no meio do caminho. A julgar pela disposição mostrada pelo presidente nos últimos dias e a menos que surjam fatos novos, essa é uma hipótese hoje considerada pouco provável.
Se Temer tiver maioria na Comissão de Constituição e Justiça, a base aliada pode correr para derrubar a autorização, mas ainda assim estará sujeita aos entraves que a oposição deve colocar para adiar as votações tanto na CCJ quanto no plenário da Câmara.
A exemplo do que aconteceu no julgamento da ex-presidente Dilma Rousseff, qualquer avanço na estratégia do governo será questionado judicialmente pela oposição, inclusive o PT, que andava meio escondido, mas agora parece disposto a sangrar politicamente o presidente e dividir o protagonismo com Rede e PSOL.
A judicialização não interessa ao governo, que quer votar logo. O tempo trabalha a favor da oposição, que não tem nada a perder se judicializar o processo. A oposição pode até perder nos plenário da CCJ e da Câmara, mas terá alongado e desgastado um pouco mais o governo. O crescimento de Lula nas pesquisas mostra o quanto o PT está confortável de volta à condição de estilingue.
O cenário hoje prevê o julgamento do primeiro processo de Janot para fins de julho ou meados de agosto, dependendo da decisão do Congresso de fazer ou não recesso parlamentar em julho. E se tudo correr bem para o governo. Na hipótese de fatiamento e Janot apresentar mais uma ou duas denúncias, pode-se considerar perdido o semestre legislativo. Pior para as reformas e para o país. O Congresso deve considerar a ideia de cancelar o recesso.
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