Vencida mais uma crise política, o presidente Michel Temer e sua equipe têm de correr para salvar o máximo possível do programa de ajustes e reformas deste ano e do próximo. A meta fiscal de 2017, um déficit primário igual ou inferior a R$ 139 bilhões, dificilmente será alcançada, mas o governo ainda poderá batalhar para evitar a perda, hoje quase certa, de vários bilhões. A pauta imediata, no entanto, é bem mais ambiciosa. Se o esforço der certo, o feito mais vistoso – e mais simbólico – será a aprovação da reforma da Previdência, nos próximos meses, sem grandes mudanças no texto aprovado na comissão especial da Câmara. Será a mais notável demonstração de habilidade e influência, depois da vitória contra a denúncia de corrupção, na semana passada.
O presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia, recomendou ao presidente da República firmeza na negociação final do projeto. Maia também se manifestou, juntamente com o presidente do Senado, Eunício Oliveira, contra a mudança da meta fiscal deste ano. A alternativa, um corte maior de gastos, é uma parte importante da solução do problema fiscal, especialmente se acompanhada de uma racionalização da despesa. Mas a remontagem da estrutura orçamentária deve ser um projeto de maior alcance.
A tarefa imediata seria bem mais simples, e menos dependente de novos cortes improvisados, se o governo pudesse recolher importantes somas previstas inicialmente para este ano. Deputados têm-se mobilizado para frustrar esse plano, pressionando o Tesouro em benefício de interesses privados, alguns escandalosos.
O Executivo desistiu de tentar a aprovação final, até quinta-feira, da Medida Provisória (MP) 774, de reoneração da folha de pagamento de 50 setores. Sem isso, a MP caducará. Não haveria tempo para esse esforço, disse o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, citando uma ponderação de Rodrigo Maia. Mas nem essa aprovação seria um resultado inteiramente satisfatório. Pela proposta original, a reoneração deveria proporcionar um ganho de R$ 4,75 bilhões neste ano e de R$ 12,5 bilhões no próximo. Mas, além de aprovar outras emendas, uma comissão mista adiou para janeiro o início da vigência do novo regime. Extinta a MP, o governo deverá pensar em outro projeto.
Outro ataque aos cofres federais foi promovido pela comissão especial no exame da MP 783, que oficializa um novo programa de regularização tributária, no estilo do velho Refis. Outra tentativa, com a MP 780, havia fracassado, porque o relator, deputado Newton Cardoso Jr., havia desfigurado o texto.
Depois de uma negociação com parlamentares, o governo mandou ao Congresso um segundo texto. Mas a relatoria foi entregue ao mesmo deputado, com efeito igualmente desastroso. O relatório aprovado na comissão especial concedeu enormes facilidades aos devedores, com redução de até 99% dos encargos. Se essa versão vigorar, a receita prevista de R$ 12,3 bilhões será na maior parte perdida. A solução realmente buscada pelo governo vai muito além da aprovação. O objetivo é a consagração de um novo relatório, parecido com o texto original. O ministro da Fazenda confirmou esse esforço.
Nos dois casos, da MP 774 e da MP 783, congressistas deram prioridade a objetivos injustificáveis. A ação mais assustadora foi a deformação da MP do Refis, em benefício, para começar, de parlamentares – como o relator na comissão especial – com participação em empresas devedoras do Fisco. Mesmo sem o aspecto escandaloso, decisões desse tipo estão longe de ser excepcionais. Parlamentares agem frequentemente como se fossem isentos de toda responsabilidade em relação às finanças públicas. Se esse fosse o caso, nada justificaria a participação dos congressistas na discussão e na aprovação do Orçamento.
O presidente Michel Temer dependerá, no entanto, da parceria com grande número de congressistas, incluídos os deformadores das MP 774 e 783, para tentar a aprovação da reforma da Previdência e, além disso, salvar alguns bilhões em receitas especiais. Serão novos testes para seu poder e sua capacidade negociadora.
Nenhum comentário:
Postar um comentário