O tal do Centrão nunca foi bom exemplo de consciência política e legitimidade da representação popular. Sempre pautou seu comportamento no Congresso Nacional pela satisfação de seus interesses no varejo da política. O Centrão apoia ou deixa de apoiar os governos de turno não em função de princípios programáticos, mas na base do famoso toma lá dá cá, cuja moeda de troca mais cobiçada são cargos em todos os níveis da administração pública. Pressionar o presidente da República dentro dessa lógica faz sentido quando se considera a qualidade do material humano de que, salvo raras e honrosas exceções, é constituído o Poder Legislativo brasileiro. Mas para tudo há um limite: prometer, por exemplo, votar contra uma reforma vital para a reconquista do equilíbrio fiscal e para garantir um direito fundamental de quem trabalha, como a da Previdência, é muito mais grave do que ameaçar o presidente da República. É ameaçar o País. Não é esse o papel de quem se apresenta como representante do povo.
Depois de terem votado majoritariamente contra a aceitação da denúncia de Rodrigo Janot contra o presidente Temer, os partidos do Centrão julgam-se agora no direito de serem compensados com os cargos, inclusive ministeriais, dos “traidores” que, embora integrantes da base governista, votaram contra o presidente naquela ocasião. Essa reivindicação é exposta sem nenhum pudor: “Decidimos não votar a reforma da Previdência. Só retomaremos o diálogo quando o governo se comunicar melhor e quando resolver quem é base e quem é oposição”, proclamou em alto e bom som, ao Estado, o líder do PP na Câmara, deputado Arthur Lira (AL).
Declaração do mesmo teor foi feita pelo líder do PSD, Marcos Montes (MG): “Não tem clima para votar (a reforma da Previdência). Quem foi fiel precisa ser prestigiado. O governo precisa dar condições para esses deputados de trabalharem a favor do governo em suas bases. E (dar) os instrumentos, que são cargos que às vezes estão com os infiéis”. E há ainda quem tente, como o líder do PR, José Rocha (BA), disfarçar a motivação por detrás das ameaças ao chefe do governo: “Já disse no Planalto. Reforma da Previdência só se vota em início de mandato. A prioridade deve ser a reforma tributária”.
Os argumentos desses porta-vozes da fisiologia poderiam ser levados mais a sério se eles, como integrantes da base do governo e beneficiários dessa condição, demonstrassem um mínimo de coerência e fossem verdadeiramente fiéis, num “clima” de debate democrático, a um programa de reformas que, afinal, foi concebido para restituir aos brasileiros a confiança no futuro. Faria sentido um parlamentar se recusar a apoiar a reforma da Previdência por não estar de acordo com seus termos. Boicotá-la por não ter sido devidamente “recompensado” para fazê-lo significa a corrupção dos fundamentos democráticos de seu mandato popular.
Um dos exemplos da “traição” à base parlamentar apresentado com maior ênfase pelo fisiologismo do Centrão é o “racha” do PSDB, que apesar de ser titular de quatro ministérios teve metade de sua bancada votando a favor da denúncia da PGR contra Temer. Os tucanos, no entanto, sempre deixaram claro que, apesar das posições pessoais de seus deputados manifestadas naquele episódio, estão fechados com a aprovação das reformas propostas pelo governo, inclusive a da Previdência. Essa atitude não absolve o PSDB das hesitações que têm colaborado para tumultuar o ambiente político nem difere muito, quanto aos objetivos, das práticas do Centrão.
Não chega a ser surpreendente, de qualquer modo, o fato de que o pior da política brasileira em termos de fisiologismo esteja concentrado nessa federação de oportunistas que já esteve reunida sob o comando de Eduardo Cunha, agora cumprindo pena em Curitiba. Os miasmas emitidos pela nefasta figura ainda são percebidos nos corredores do Congresso.
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