sábado, 12 de agosto de 2017

Maia: fundão é ‘mau sinal’

Presidente da Câmara critica financiamento público e defende doações privadas em eleições

Jeferson Ribeiro | O Globo

A aprovação na comissão especial de reforma política do fundo público de aproximadamente R$ 3,6 bilhões para financiar campanhas eleitorais foi um mau sinal para a sociedade, disse ontem, no Rio, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Segundo ele, seria mais compreensível se o fundo fosse reduzido gradativamente ao longo dos anos e tivesse “começo, meio e fim”.

— Havia uma previsão no texto inicial do relator para que fosse reduzido ao longo do tempo. Mas, infelizmente, optou-se pela aprovação do fundo permanente num valor alto, que, na atual conjuntura política, a sociedade não aceita. Ele (ser) permanente gera na sociedade uma visão muito equivocada — criticou Maia em palestra na Fundação Getulio Vargas.

Apesar de criticar a mudança, Maia admitiu que os parlamentares ficaram sem opções para custear suas campanhas depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional o financiamento empresarial dos candidatos. O presidente da Câmara disse que o fim abrupto aprovado pelo Judiciário não foi a melhor solução. E defendeu a volta das doações de empresas para as campanhas no futuro, mas dentro de novos limites que seriam estipulados.

— Eu entendo o que aconteceu, mas acabar com o financiamento privado não necessariamente limpa a corrupção e acaba com os problemas da política. Nós precisamos financiar o processo eleitoral. O ruim, do meu ponto de vista, não é o financiamento privado. O ruim é que o financiamento privado não tinha regras claras. Não havia limites claros por setor, não tinham limites claros para concentração de doação — argumentou Rodrigo Maia.

A comissão especial da reforma política aprovou, nos últimos dias, várias mudanças para as próximas eleições. As medidas só serão aplicadas, porém, se forem aprovadas no plenário da Câmara e do Senado.

Entre as mudanças aprovadas na comissão está a nova regra para eleição de cargos legislativos: deputados federais, estaduais e vereadores. O atual sistema proporcional é considerado falido pelos deputados. Eles decidiram na comissão que, em 2018, os parlamentares serão eleitos no sistema distritão. Vencem aqueles que tiverem mais votos.

RESISTÊNCIA AO DISTRITÃO GANHA CORPO
Maia disse que o distritão só deve ser aprovado como um sistema de transição para que, em 2022, os postulantes a cargos legistativos sejam eleitos pelo voto distrital misto, segundo o qual o eleitor escolheria metade dos parlamentares por voto direto. A outra metade seria escolhida a partir de uma lista determinada pelos partidos.

— Eu acho que se a gente tiver o distrital misto para 2022 é maravilhoso. O sistema atual faliu e acho que distritão sem cláusula de desempenho muito alta e com financiamento público é muito ruim — disse, em crítica direta ao que foi aprovado pela comissão.

A resistência à aprovação do distritão vem ganhando corpo na Câmara e uma frente com parlamentares de vários partidos tem defendido que não aprovará a mudança caso não haja um amplo acordo para que o distritão seja aplicado apenas em 2018. O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), disse na quinta-feira que, caso os deputados não aprovem dessa forma, os senadores irão mudar o texto, o que pode até mesmo colocar a aprovação de qualquer mudança inviável pela falta de tempo. Qualquer alteração nas regras eleitorais precisa ser aprovada ao menos um ano antes do próximo pleito. E, como a mudança nesse caso é constitucional, é preciso que as duas Casas aprovem a mesma versão do texto em votações de dois turnos.

Cientistas políticos e críticos do distritão têm dito que o sistema facilitará a reeleição dos atuais deputados, muitos envolvidos em investigações da Operação Lava-Jato e com interesse em manter o foro privilegiado e serem julgados apenas no Supremo Tribunal Federal (STF).

Maia discorda e diz que o sistema provocará mais renovação.

— Ao contrário. O sistema majoritário aumenta a renovação. Na França, o Macron só fez maioria porque o sistema é majoritário. O sistema que é conservador é o sistema atual. O distritão é ruim porque, com financiamento público, é uma eleição cara.

Segundo ele, a renovação política que existe no país hoje é de nomes, mas não do perfil do voto:

— A gente fala muito da necessidade de renovação política. O que não falta na política brasileira é renovação. O problema é que esse (atual) sistema eleitoral renova com o mesmo perfil do voto, o mesmo perfil de político. São parlamentares ligados à igreja de um lado. Do outro, os ligados ao agronegócio ou quem é ligado à máquina pública em muitos estados. Renova-se quase 50% da Câmara e efetivamente há pouca renovação.

A cláusula de desempenho alta, pedida por Maia para validar o distritão, não está entre as prioridades dos parlamentares.

BARREIRA MAIS BAIXA
Em outra comissão na Câmara, a relatora da emenda constitucional que estipula a regra, deputada Sheridan (PSDBRR), propôs uma meta bem menos audaciosa para garantir aos partidos o acesso ao fundo partidário e tempo de TV nas campanhas eleitorais.

O texto aprovado no Senado, que está sendo analisado pelos deputados, previa acesso ao fundo partidário e ao tempo de TV a partidos com 2% dos votos válidos para a Câmara dos Deputados em pelo menos 14 estados em 2018. Pela proposta de Sheridan, essa meta caiu para 1,5% dos votos válidos totais para a Câmara, sendo 1% divididos em pelo menos nove estados em 2018.

Essa mudança, que pode reduzir o número de partidos no país (hoje são 35), também precisa ser aprovada com pelo menos 308 votos na Câmara e ainda terá que ser analisada pelos senadores.

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