- Valor Econômico
Existe ambiente para uma candidatura de Meirelles
Uma leve brisa chamada Henrique Meirelles principiou no ar rarefeito de Brasília. Bastou um conjunto de indicadores econômicos melhores do que o esperado neste terceiro trimestre para que esta hipótese entrasse no cenário de 2018. Há circunstâncias que conspiram a favor do ministro, e os protagonistas desta conjura querem acreditar que a economia está descolada da política.
É visível que Michel Temer, que por ora poderia ter o cognome de governante mais impopular do planeta Terra, está com dificuldades de influenciar na própria sucessão, sobretudo depois do escândalo da delação da JBS, em 17 de maio. Antes da variável Meirelles, alimentou um balão de ensaio a respeito de uma mudança de sistema de governo sem consulta popular. Muito difícil. Mesmo parlamentaristas históricos temem a reação que a iniciativa despertaria, e também suas consequências.
O Centrão acuado pelo Ministério Público estava sem cartas nas mãos. O governismo de base parlamentar e sem expressão eleitoral própria, do qual Gilberto Kassab é um emblema, procurava apenas algum abrigo legal na reforma política para a sobrevivência, com fantasmagorias como distritão, distritão misto e outras.
As forças empresariais assistem a divisão e o declínio do PSDB. Um dado que se sobressai nas últimas pesquisas é a posição desfavorável tanto de Alckmin quanto de João Doria nas sondagens. Depois de uma arrancada firme, Doria parou de subir. O governador paulista perde substância. Estão ambos no quarto lugar, no meio do caminho que leva de Ciro Gomes a Marina Silva. São derrotados em todas as simulações de segundo turno, por todos os rivais.
O PSDB paga o preço da indefinição em relação ao destino de Temer, e no caso dos paulistas a conta é paradoxalmente amarga: a bancada paulista do partido votou pela aceitação da primeira denúncia contra o presidente, mas Alckmin e Doria parecem contaminados pela toxicidade do pemedebista.
O antipetismo para os tucanos parece ter se convertido em uma armadilha. Engrossou um caldo de rejeição à atividade política que por ora resultou em Jair Bolsonaro. É o deputado fluminense, sempre isolado, sempre visto como um político folclórico, com seus preconceitos, suas incoerências e seu extremismo, que se converteu no antagonista a Lula e ao lulismo.
Muitos apostam que a máquina eleitoral, o tempo na televisão e a capacidade de arrecadação dão a Alckmin ou Doria o favoritismo na hora decisiva. Tanto um quanto outro se empenham em construir alianças amplas. O governador com PSB e PTB e Doria com DEM, PMDB e o próprio PSD de Meirelles, mas a força da internet e a enormidade da descrença desencadeada pela Lava-Jato, além das mudanças na legislação, relativizam estes fatores. Parte expressiva do eleitorado encontrou seu anti-Lula e ele é um radical de direita sem compromisso com as reformas. Cabe ao centro encontrar seu espaço. Avançaram contra a esquerda e agora precisam de um antibolsonaro.
Caso o ex-presidente seja inabilitado pela Justiça, o que é muito provável que aconteça, a situação fica ainda pior tanto para Alckmin quanto para Doria. Um terço do eleitorado brasileiro se tornará imensamente ressentido contra toda e qualquer força que identifique como responsáveis pela queda do líder. Candidaturas mais palatáveis aos náufragos do petismo tendem a ganhar alguma substância.
Neste sentido Meirelles pode ser providencial. Seria um outsider, apesar de fruto da elite goiana (seu pai foi procurador geral de contas; seu avô prefeito de Anápolis; seu tio vice-governador). O sucesso como executivo, a gestão inegavelmente bem sucedida no Banco Central e os feitos no Ministério da Fazenda borram o fato de já estar em seu terceiro partido. Em tempos de reputações em derretimento, Meirelles serviu a Lula e a Joesley Batista e agora trabalha para Michel Temer, sem que qualquer acusação lhe maculasse até o momento.
Estando em todas as partes sem estar em nenhuma, pode-se ler Meirelles como a salamandra da mitologia grega. Anda nas brasas e não se queima.
Existe ambiente político para sua candidatura, caso Doria e Alckmin não consigam, um ou outro, agregar a centro-direita. Duvidoso é se existirá ambiente econômico. Uma coisa é despertar confiança em investidores, a outra é criar este sentimento na massa do eleitorado. Um em cada quatro pesquisados no levantamento CNT/MDA divulgado esta semana pensam que o nível de emprego irá melhorar. Há sete meses, era um em cada três. As expectativas estão se deteriorando. Para a massa eleitoral, não há descolamento entre política e economia. Os tomadores de decisão apostam que pode haver.
Fernando Henrique conseguiu reverter de modo abrupto o cenário eleitoral e fazer convergir as expectativas da base e do topo da pirâmide em 1994. No binômio que tira o sono de qualquer eleitor médio, que é o de inflação e o de desemprego, não havia comparação possível no quadro de 23 anos atrás. A inflação desorganizava não apenas a economia, mas a vida cotidiana e seu combate tinha mais apelo do que o do desemprego.
Nesta recessão o nível de emprego se deteriorou de um modo que estava esquecido há muitos anos. A inflação causou algum espanto no ano da correção dos desequilíbrios provocados pelo governo Dilma, mas nada que se ombreie ao desmantelamento do mercado de trabalho. Enquanto o eleitor médio se sentir vulnerável, um ministro da Fazenda não tem ativos a oferecer.
Esta sensação de vulnerabilidade tende a diminuir nos próximos meses. Conforme as projeções da consultoria Tendência, ainda que a taxa de desemprego patine, a renda real deve crescer 2,4% este ano e 1,2% no próximo; a massa salarial deve subir 2,6% agora e 2,8% em 2018 e a ocupação da população sai de 0,1% de crescimento para 1,6%. É mais gente conseguindo se virar, ainda que em ocupações precárias. Se isso seria suficiente para blindar Meirelles dos miasmas do Palácio do Planalto é uma incógnita.
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