- Valor Econômico
"Descotização" das hidrelétricas dará somente R$ 7,7 bi
Enganaram-se aqueles que achavam que a proposta do governo de privatizar a Eletrobras e, ao mesmo tempo, cobrar um bônus em troca da "descotização" das hidrelétricas operadas pela empresa fosse resolver o problema fiscal da União no próximo ano. Na proposta orçamentária para 2018, encaminhada ao Congresso Nacional no fim de agosto, o governo incluiu uma receita de apenas R$ 7,7 bilhões pela nova concessão dessas usinas, que passarão a trabalhar com tarifas de mercado e não mais pelo "regime de cotas", com preços artificialmente baixos.
Na verdade, mesmo com o bônus a ser obtido com nova concessão das usinas operadas atualmente pela Eletrobras, a receita da União com concessões no próximo ano será inferior ao previsto para este ano (R$ 25,7 bilhões) e menor do que foi em 2016 (R$ 21,8 bilhões). Para se ter uma ideia, o processo de "descotização" vai gerar uma arrecadação menor do que a que o governo espera obter com a concessão de aeroportos no próximo ano, que é de R$ 8,8 bilhões.
Todos já devem ter entendido que a União não ganhará um centavo sequer com a privatização da Eletrobras, simplesmente porque não venderá ações da estatal. O controle da empresa passará para a iniciativa privada porque o Tesouro não irá subscrever ações durante o processo de aumento de capital da Eletrobras, que será realizado, conforme deseja o governo, no início do próximo ano.
Mesmo que venda algumas ações da Eletrobras, a receita obtida não poderá ser utilizada para pagar despesas correntes primárias ou para ajudar a cumprir a meta fiscal do ano. A legislação em vigor não permite isso. Outro engano incorrido por alguns foi achar que as privatizações iriam possibilitar receita suficiente para o governo reduzir o déficit primário do próximo ano. Mesmo que o dinheiro seja utilizado para pagar investimentos, que é uma despesa primária, a metodologia do Banco Central para o cálculo do resultado da meta fiscal exclui essa receita.
As dificuldades para fechar as contas da União no próximo ano continuam grandes. Aqueles que acompanham a política fiscal estão percebendo com maior clareza que a dificuldade em 2018 não será deixar as despesas da União dentro do teto de gastos. O problema principal será obter receitas suficientes para custear as despesas obrigatórias que não param de crescer e, ao mesmo tempo, cumprir a meta fiscal de déficit de R$ 159 bilhões.
Quem se der ao trabalho de olhar a estimativa da arrecadação federal feita pela Secretaria da Receita Federal para 2018 verá que o crescimento previsto é de apenas 4,1%, em termos nominais, na comparação com o projetado para este ano. O governo elaborou a proposta orçamentária com a estimativa de inflação de 4,2% no próximo ano. Assim, não haveria aumento real da receita, que ficaria menor na comparação com o Produto Interno Bruto (PIB).
Como provavelmente não contará com uma receita extraordinária tão elevada como neste ano, estimada pelo Tesouro Nacional em R$ 59,8 bilhões, o governo terá que encontrar alternativas para compensar essa queda. Em 16 de agosto passado, o governo anunciou uma série de medidas que aumentariam a arrecadação do próximo ano, como a tributação sobre fundos de investimentos, a reoneração da folha de pagamento de vários setores da economia e a elevação da contribuição previdenciária dos servidores.
Essas medidas, juntamente com a mudança no programa do Reintegra, somariam R$ 14,5 bilhões. Mas, com exceção do Reintegra, todas as demais medidas anunciadas até hoje não foram editadas pelo governo. A mensagem modificativa da proposta orçamentária de 2018 somente será encaminhada ao Congresso depois que essas medidas forem formalizadas, disseram fontes oficiais ao Valor.
Há um dado que precisa ser considerado. O recente otimismo com a recuperação da economia brasileira poderá alterar as projeções para a receita em 2018. O Ministério da Fazenda já admite rever a previsão de crescimento econômico para este ano, que passaria de 0,5% para 0,8%, e para o próximo, que subiria dos atuais 2% para algo em torno de 2,5%.
Dependendo do desenrolar dos acontecimentos no campo político e do encaminhamento da reforma da Previdência, é possível que a economia ganhe ainda mais força e o crescimento possa até mesmo superar 3%. Se este cenário vier a se confirmar, a receita tributária poderá apresentar uma surpresa positiva e ajudar o governo a fechar suas contas e cumprir a meta.
Em sua mensagem modificativa, o governo vai alterar bastante a proposta orçamentária de 2018, que foi encaminhada ao Congresso com menos despesa do que o permitido pelo teto de gasto, definido pela emenda constitucional 95. A despesa orçada ficou R$ 42 bilhões abaixo do que poderia ter sido, pois não havia receita disponível. O governo foi obrigado a apresentar uma proposta antes da mudança da meta fiscal, que elevou o déficit primário do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) de R$ 129 bilhões para R$ 159 bilhões.
Assim, a mensagem modificativa será apresentada com uma ampliação dos gastos em R$ 42 bilhões. Muita coisa vai mudar, principalmente em relação aos investimentos da União, que foram reduzidos quase a zero na proposta orçamentária inicial para que o governo conseguisse cumprir a meta fiscal.
Há dois aspectos da proposta orçamentária inicial que precisam ser observados. O primeiro é que o Executivo continua cedendo uma parte do seu limite de gasto para acomodar o excesso de despesa dos demais Poderes. Em 2018, o espaço cedido será de R$ 2,1 bilhões. O Judiciário absorverá quase toda essa margem, pois está com um excesso de gasto de R$ 1,748 bilhão.
O segundo aspecto é que se o governo não conseguir aprovar no Congresso o adiamento do reajuste salarial dos servidores do Executivo, como anunciou que vai fazer, a despesa com pessoal em 2018 vai crescer 5,7%, na comparação com este ano - bem acima do índice utilizado para corrigir o teto de gasto, que foi de 3%
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