sábado, 2 de setembro de 2017

Razões da não reforma | Merval Pereira

- O Globo

Há uma razão pragmática para que não se chegue a consenso sobre a reforma política, além do simples fato de que a maioria dos deputados não quer mudar o sistema que os elegeu. Mas o PRB e o PR, que juntos somam 60 votos na Câmara, têm uma motivação a mais. Eles contam em suas fileiras, respectivamente, com puxadores de votos como o deputado mais votado do país, Celso Russomano, com 1.524.286 votos, e o segundo mais votado, Tiririca, que teve 1.016.796.

Graças a isso, o PRB elegeu oito deputados em São Paulo, três levados pela votação de Russomano. Já Tiririca elegeu outros dois deputados, e o PR chegou a seis em São Paulo. Além de aumentar as bancadas de seus partidos, esses puxadores de voto aumentam também o fundo partidário distribuído pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) anualmente aos partidos que participaram das eleições para a Câmara.

A maior parte dos recursos — 95% — é distribuída entre os partidos de acordo com o número de votos obtidos na eleição para a Câmara dos Deputados (os 5% restantes são divididos igualmente). Assim, cada voto obtido por uma legenda equivale, todo ano, a uma determinada quantia.

Na sua mais recente versão, o fundo estava em cerca de R$ 800 milhões, o que dá por cada voto válido R$ 12. Assim como os grandes craques de qualquer esporte têm remuneração variável pela performance, ou executivos recebem bônus por produtividade, os grandes puxadores de voto, dizem as más-línguas, também recebem uma percentagem do que levam para o fundo partidário.

Russomano, por exemplo, “deu” ao PRB mais de R$ 18 milhões nos quatro anos de seu mandato atual. Tiririca, mais de R$ 12 milhões ao PR. Mas eles também representam a distorção da vontade do eleitor quando seus partidos fazem coligações com outros que nada têm a ver com seus programas.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso já deu declarações claras sobre o que considera ser a inconstitucionalidade das coligações proporcionais. Quando um eleitor vota em um candidato de um partido que, por exemplo, é contra o aborto, mas ajuda a eleger outro candidato de um partido que é a favor do aborto, ele está sendo fraudado em seus direitos de cidadão.

O fim das coligações proporcionais é um dos pontos possíveis de serem alterados para a próxima eleição, seja pela aprovação de uma reforma pontual na próxima semana pelo Congresso, seja por uma interferência do próprio STF, caso o impasse atual continue a impedir a aprovação da reforma política.

A tentativa de aprovar alguma coisa entre terça e quarta-feira, antes do feriadão que começa no dia 7 de setembro, tem justamente por base a possibilidade de que o Supremo seja instado a fazer modificações se o Congresso não resolver. A proposta é aprovar o projeto que dá fim às coligações proporcionais e põe em seu lugar as federações partidárias, que, por exigirem coerência programática entre os partidos que fizerem uma coligação, e sua permanência durante toda a legislatura, fogem da inconstitucionalidade apontada pelo ministro do STF.

As subfederações, que permitem coligações diferentes das nacionais e não obrigam que os partidos atuem em conjunto nos estados durante a legislatura, devem ser impedidas.

As cláusulas de barreira também estão na pauta, e talvez o índice de votação necessário para uma atuação plena na Câmara aumente para 2% nacionalmente. É possível que também tentem votar o distritão misto.

O ponto mais polêmico é o do fundo eleitoral, pois, embora tenham desistido de aprová-lo com um valor de R$ 3,6 bilhões pelo repúdio que gerou, há deputados que ainda querem fixar um valor.
Esse desencontro está dando força a uma proposta do senador Ronaldo Caiado, que não cria novas despesas. O fundo proposto por ele acaba com o horário eleitoral na TV e rádio, e usa esse recurso que iria para propaganda política para as campanhas eleitorais.

O dinheiro viria da compensação fiscal que a União concede para as emissoras comerciais veicularem a propaganda política. Segundo a Receita Federal, em 2014, esse valor atingiu R$ 1 bilhão. Em 2015, ano sem eleições, R$ 308,9 milhões. Em 2016, com eleições municipais, R$ 562,2 milhões. Os recursos também viriam do dinheiro de multas e de penalidades aplicadas aos partidos com base no Código Eleitoral.

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