- Folha de S. Paulo
Vivemos tempos histéricos. Não que isso seja o fim dos tempos. A democracia liberal permite aos cidadãos serem tão hiperbólicos quanto desejarem.
Apesar de o exagero ser permitido, não creio que seja bom conselheiro. Ao contrário, penso que uma análise equilibrada dos fatos é o ponto de partida necessário para decisões sábias. Assim, hesito entre a frustração e o divertimento (não podemos perder o bom humor) ao ver gente protestando contra a "pedofilia em museus, a "ração humana para pobres ou a "revogação da Lei Áurea.
O Congresso andou endurecendo as leis de crimes sexuais, mas, até onde sei, levar filhos a uma exposição que mostre nus ainda é uma atitude legal, assegurada pelo princípio da liberdade de expressão e pelas normas que dão à família o direito de educar rebentos segundo seus próprios valores, não os do MBL.
O prefeito João Doria, mais uma vez, pisou na bola ao privilegiar factoides em detrimento de planos consistentes, mas, até onde sei, não há nada de intrinsecamente errado ou imoral em liofilizar alimentos prestes a vencer. É tudo uma questão de mostrar que a farinha resultante é segura e útil –o que o prefeito não fez.
Já a portaria que muda a definição de trabalho análogo à escravidão tem problemas morais, legais e políticos, mas, daí a afirmar que equivale à revogação da Lei Áurea, vai enorme distância. Por mais graves que sejam os abusos hoje cometidos por empregadores, não dá para compará-los com a escravidão de verdade, que incluía chibatadas, admitia a venda de pessoas, a separação de famílias e ainda mobilizava o Estado para recapturar os "negros fujões".
Aliás, não entendo como o movimento negro, que protesta até contra o uso da expressão "black is beautiful" num comercial, nunca se insurgiu contra o uso do termo "escravo" no contexto trabalhista. Essa sim me parece uma imagem que avilta a memória da chaga que foi a escravidão.
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