Antes, as evidências de relações não republicanas com as empresas estavam concentradas no PSDB de São Paulo; agora, a suspeita de negociatas atinge outros partidos
Vários esperam o dia em que a Lava-Jato encerrará os trabalhos. Quem teme e deve algo sonha há tempos com isso. O juiz Sergio Moro já admitiu vislumbrar o fim da operação, pelo menos na primeira instância em que atua, em Curitiba. Mas reconheceu que desdobramentos da Lava-Jato abrem novas frentes de investigação, num processo quase contínuo. Porém, a corrupção tornou-se de tal forma sistêmica no país que a força-tarefa baseada em Curitiba pode em algum momento declarar seu trabalho encerrado, enquanto outros casos de roubalheira grossa estarão sendo examinados país afora.
Um desses casos pode estar surgindo, com a assinatura de acordo de leniência — a delação premiada da pessoa jurídica — entre a empreiteira Camargo Corrêa, da Lava-Jato, e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão responsável pela defesa da concorrência.
Já é conhecido um cartel com atuação em governos tucanos de São Paulo, nas gestões de Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin. A novidade é que este acordo com o Cade — sobre um grupo de que participariam, além da Camargo Corrêa, Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, outras menos conhecidas, e a própria Siemens — formaliza a ampliação da atuação do cartel de trens (batizado de “Tatu Tênis Clube”) para além de São Paulo. A delação trata de 21 licitações públicas executadas também em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia, Ceará, Paraná e Rio Grande do Sul.
Isso amplia bastante o escândalo do cartel de trens, tornando-o de vez multipartidário. Os tucanos paulistas não ficarão sozinhos nesta história, sinal de que a soma das delações tem potencial de ser uma espécie de nova Lava-Jato. Se não nas cifras, menos impressionantes que as do setor de petróleo — embora projetos de metrô e trens suburbanos também sejam de altos investimentos —, mas na amplitude do envolvimento de políticos.
Ao lado do PSDB paulista, já atingido pela denúncia do cartel, surge o governo de Sérgio Cabral no Rio de Janeiro, onde cartéis teriam operado na Linha 4 do metrô e no projeto da 3, não implementada. Assim, o PMDB, na sua ramificação fluminense, entra neste circuito.
Há citações de atuação do esquema na Brasília de José Roberto Arruda, na época do DEM; no metrô de Belo Horizonte, quando os tucanos Aécio Neves e Antonio Anastasia governaram Minas; na expansão do metrô de Porto Alegre, durante a passagem pelo Palácio Piratini, no Rio Grande do Sul, da tucana Yeda Crusius e do petista Tarso Genro; assim como de Cid Gomes (PROS) e do tucano Tasso Jereissati, no Ceará, em que o cartel teria atuado numa linha do metrô de Fortaleza.
É preciso, ainda, esperar a fase criminal, a cargo do Ministério Público e Polícia Federal. Quanto ao acordo de leniência, com o Cade, espera-se que tramite sem as dificuldades verificadas em outros acertos com empreiteiras, devido a disputas entre o órgão do Executivo que conduz o acordo e o MP.
Isso preocupa, porque a empresa fica impedida de fechar contratos com o poder público. Perde receita, desemprega e desmonta equipes técnicas de alto nível. Com isso, a engenharia brasileira padece. Mais uma chance para evitar erros.
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