Fernando Hideo I. Lacerda* / O Estado de S. Paulo.
A condução coercitiva para interrogatório em sede policial é um ato ilegal e arbitrário. O Código de Processo Penal prevê a sua decretação apenas durante a fase judicial – ou seja, não é possível conduzir perante a autoridade policial –, desde que o investigado tenha sido regularmente intimado e não compareça em juízo na data designada para seu interrogatório.
Não obstante a manifesta ilegalidade, temos assistido à banalização de conduções coercitivas decretadas sem prévia intimação em operações policiais espetacularizadas. Na tentativa de se fazer justiça violando-se a lei, fundamenta-se a necessidade de tais conduções para “evitar que investigados combinem versões” segundo a lógica de que “quem pode o mais (prender), pode o menos (conduzir)”.
É um raciocínio falacioso, pois prisão e condução são medidas com finalidades totalmente distintas, e, no processo penal, os juízes não podem aplicar medidas que não estejam previstas em lei (poder geral de cautela). Em verdade, trata-se de uma forma arbitrária de prisão com o intuito de inviabilizar a defesa – uma forma de burlar a proibição de investigações sigilosas, impedindo que o investigado tenha tempo e meios adequados para se defender –, coagir delações premiadas e submeter os conduzidos à humilhação em arena pública. Viola-se não apenas a literalidade do Código de Processo Penal (art. 260), mas as garantias constitucionais do devido processo legal, presunção de inocência, ampla defesa e vedação à autoincriminação.
Nesse contexto, a decisão do ministro Gilmar Mendes revela-se acertada ao proibir novas conduções coercitivas para interrogatórios policiais. A decisão é liminar (pode ser revertida no julgamento colegiado) e não resulta em anulação de interrogatórios pretéritos, que deverão ser objeto de ações autônomas e específicas. Em todo o caso, pode simbolizar o início de uma retomada da legalidade e lealdade à Constituição Federal por parte do STF.
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*Fernando Hideo I. Lacerda professor de direito processual penal da Escola Paulista de Direito e advogado criminalista
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