Ministro veta uso de depoimentos obrigatórios, um dos pilares da Lava Jato
Rafael Moraes Moura Amanda Pupo, Luiz Vassallo / O Estado de S. Paulo.
BRASÍLIA - O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes proibiu ontem – por meio de liminar concedida em ações movidas pelo PT em abril de 2016 e pela Ordem dos Advogados do Brasil – a condução coercitiva de investigados para a realização de interrogatórios, uma das principais medidas usadas pela Operação Lava Jato. Gilmar concedeu a liminar na última sessão do ano. Ao encerrar os trabalhos, ministros da Corte tomaram pelo menos oito decisões ligadas a políticos e que afetam a Lava Jato. Na véspera, a Segunda Turma do STF, da qual Gilmar faz parte, já havia decidido rejeitar denúncias contra quatro parlamentares.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes proibiu ontem, por meio de liminar concedida em ações movidas pelo PT e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a condução coercitiva de investigados para a realização de interrogatórios, uma das principais medidas usadas pela Operação Lava Jato. Gilmar concedeu a liminar na véspera do recesso do Judiciário – ontem o Supremo realizou a última sessão do ano. Ao encerrar os trabalhos, ministros da Corte tomaram pelo menos oito decisões ligadas a políticos e que afetam a Lava Jato.
Entre os temas estão o alcance do foro privilegiado, a possibilidade de réu ocupar a linha sucessória da Presidência da República e até determinar o cumprimento da prisão do deputado Paulo Maluf (PP-SP). Na véspera, a Segunda Turma do STF, da qual Gilmar faz parte, já havia decidido rejeitar denúncias contra quatro parlamentares (mais informações nas págs. A6 e A7).
A ação do PT foi ajuizada em abril de 2016, após o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter sido levado coercitivamente para prestar depoimento na 24.ª fase da Lava Jato. Entre março de 2014 e novembro deste ano, foram cumpridos 256 mandados de condução coercitiva pela força-tarefa determinados pela primeira instância em Curitiba e no Rio. A decisão foi comemorada por advogados e criticada por procuradores e promotores.
Em 8 de dezembro deste ano, o PT reiterou o pedido de liminar para suspender o uso de condução coercitiva, alegando que não há previsão para julgamento do processo pelo plenário – o julgamento das ações pelo plenário da Corte chegou a ser marcado para maio deste ano, mas não foi realizado. A medida foi adotada após uma juíza federal mandar conduzir coercitivamente o reitor da Universidade Federal de Minas Gerais na Operação Esperança Equilibrista.
Um dos principais críticos da Lava Jato no STF, Gilmar apontou que a condução coercitiva para interrogatório afronta a Constituição Federal ao impor restrição tanto da liberdade de ir e vir quanto à presunção de inocência. “As conduções coercitivas para interrogatório têm se disseminado, especialmente no curso da investigação criminal. Representam uma restrição importante a direito individual, alegadamente fundada no interesse da investigação criminal”, argumentou Gilmar, em decisão assinada anteontem.
“A condução coercitiva representa uma supressão absoluta, ainda que temporária, da liberdade de locomoção. O investigado ou réu é capturado e levado sob custódia ao local da inquirição. Há uma clara interferência na liberdade de locomoção, ainda que por um período breve”, concluiu o ministro.
Gilmar também considerou que a condução coercitiva para interrogatório é “ilegítima”, de acordo com a legislação atualmente em vigor. “O essencial para essa conclusão é que a legislação prevê o direito de ausência ao interrogatório, especialmente em fase de investigação. O direito de ausência, por sua vez, afasta a possibilidade de condução coercitiva”, avaliou.
O advogado do ex-presidente Lula, Cristiano Zanin Martins, manifestou apoio à decisão de Gilmar Mendes. Para a defesa do petista, a decisão de Gilmar é “correta e representa um alento ao estado de direito”. “Inegavelmente, as conduções coercitivas para investigados não têm qualquer cabimento porque significam uma indevida restrição à liberdade de locomoção e uma grave violação da presunção de inocência e por isso afrontam a Constituição Federal e diversos tratados internacionais que o Brasil assinou e se obrigou a cumprir”, disse o advogado.
O conselheiro da OAB, advogado Juliano Breda, que subscreve a ação da entidade, disse que Gilmar “decidiu em nome da Constituição da República e pronunciou-se de modo veemente contra o símbolo das arbitrariedades desse novo modelo de persecução penal”.
Já para o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho Cavalcanti, a liminar pode causar aumento nos pedidos de prisão temporária. Segundo ele, a condução coercitiva é muitas vezes usada por investigadores e juízes para possibilitar que a polícia cumpra mandado de busca e apreensão para coletar provas e, ao mesmo tempo, possibilitar que o investigado seja ouvido.
De acordo com Robalinho, a decisão de Gilmar foi “equivocada” e sua associação espera que ela seja revertida pelo plenário do Supremo. “Você tirou uma arma pequena e deixou só um canhão, mas que pode ser usado pela lei.”
O procurador da força-tarefa da Lava Jato no Rio Sérgio Pinel vai na mesma linha. “A condução coercitiva não é gravosa, mas benéfica, pois depois o investigado é liberado.”
Suspensão Gilmar Mendes suspendeu a prisão preventiva dos empresários Gustavo Estellita e Miguel Iskin, investigados na Lava Jato, em troca de recolhimento domiciliar noturno e em fins de semana.
Colaborou Constança Rezende
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