Em discurso, Temer sustenta que ‘fantasma da crise política’ não pode abalar reformas
Leticia Fernandes, Eduardo Barretto e Cristiane Jungblut | O Globo
-BRASÍLIA- Após quase sete horas fechado em reunião com ministros, deputados e assessores para decidir o seu futuro, o presidente Michel Temer fez um pronunciamento ontem no qual afirmou que não irá renunciar. Em sua fala, que ocorreu no segundo andar do Palácio do Planalto, ele voltou a negar as denúncias feitas por Joesley Batista, dono da JBS, e lamentou que o “fantasma da crise política” tenha voltado a rondar o Planalto, quando o “andamento das reformas ia bem”. Ele não explicou, no entanto, o teor das acusações e não fez qualquer referência ao deputado Rodrigo Rocha Loures, um de seus mais próximos aliados e a quem incubiu de tratar assuntos de interesse da JBS.
— Não renunciarei. Repito: não renunciarei! Sei o que fiz e sei da correção dos meus atos — disse um presidente exaltado, de dedo em riste e tom de voz elevado.
— Exijo investigação plena e muito rápida para os esclarecimentos ao povo brasileiro. Meu único compromisso é com o Brasil, e só este compromisso me guiará — completou.
O presidente argumentou que demorou a se pronunciar porque queria conhecer os detalhes da denúncia. Ele contou que pediu ao Supremo Tribunal Federal o acesso à gravação feita por Joesley Batista, o que não havia conseguido até o momento da fala, ontem à tarde. No pronunciamento, Temer negou novamente ter autorizado qualquer interlocutor a falar em seu nome e afirmou que não comprou o silêncio de ninguém porque não tem o que temer e não precisa, segundo ele, de foro privilegiado.
— Repito e ressalto: em nenhum momento autorizei que pagasse a quem quer que seja para ficar calado. Não comprei o silêncio de ninguém por uma razão singelíssima, exata e precisamente porque não temo nenhuma delação. Não preciso de cargo público nem de foro especial. Não tenho nada a esconder — disse o presidente.
No pronunciamento, Temer admitiu ainda que viveu esta semana o pior momento de seu governo, mas também o melhor, com sinais de melhora dos indicadores econômicos. O presidente deixou claro que a crise econômica pode piorar ante o recrudescimento da crise política e ressaltou que não “pediu” ajuda à família de Cunha.
— Todo o imenso esforço de retirar o país de sua maior recessão pode se tornar inútil e nós não podemos jogar no lixo da História tanto trabalho feito em prol do país. Ouvi realmente o relato de um empresário que, por ter relação com ex-deputado, auxiliava a família do ex-parlamentar (Cunha). Não solicitei que isso acontecesse e somente tive conhecimento desse fato nessa conversa pedida pelo empresário.
Antes do pronunciamento, Temer ouviu de aliados o conselho de renunciar. E também o de não renunciar. Decidiu ir para o enfrentamento. Pesou o fato de que perderia o foro privilegiado. A decisão foi defender uma investigação extensa de todas as denúncias e se descolar de interlocutores que aparecem na delação premiada da JBS falando em seu nome. É o caso do deputado Rodrigo Rocha Loures. Segundo interlocutores, ele “extravasou” a “raiva” que sentia durante a fala, levantando o tom de voz.
A fala de Temer foi bem recebida pela base, que considerou um discurso “firme”. Um auxiliar destacou pontos da fala que devem marcar a postura do governo daqui para frente: fugindo ao estilo sutil, o presidente ressaltou que a conversa foi gravada “clandestinamente”“e “exigiu” investigação célere. Essa contraofensiva do Planalto traria, segundo esse assessor, uma possibilidade de “solidariedade forçada” de parlamentares.
— Hoje (ontem) uma conversa do presidente foi divulgada e um senador foi afastado. Dezenas de deputados e senadores estão na lista de Fachin, e amanhã pode ser qualquer um deles. O Congresso se sente contemplado pela fala mais firme de Temer. O governo vai mudar de postura. O Executivo e o Legislativo não têm saída a não ser se unir para se contrapor ao Judiciário.
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