- Folha de S. Paulo
Eu gostaria de ver Lula concorrendo à Presidência da República e perdendo. Embora o Brasil seja um lugar "sui generis", não creio que tenha ficado tão disfuncional a ponto de recolocar no cargo máximo do país o líder da legenda que acaba de provocar uma das maiores recessões da história —e sobre o qual ainda pesam graves suspeitas de corrupção.
Penso também que um pleito sem Lula deixaria um fio desencapado no processo político. Petistas passariam o resto dos tempos se queixando de que foram desclassificados no tapetão. Para reduzir o caráter de rixa que vem marcando as últimas corridas eleitorais, seria melhor que o capítulo Lula fosse encerrado por uma decisão das urnas e não dos tribunais.
Se, porém, o ex-presidente tiver sua condenação confirmada pelo TRF-4 na próxima quarta-feira (24), não vejo como deixar de aplicar a Lei da Ficha Limpa (LC nº 135/2010), que o excluiria da disputa. Confesso que nunca gostei muito dessa norma, contra a qual já escrevi algumas colunas. Mas, se o prejuízo de uma eleição sem Lula fica restrito ao campo das conveniências políticas, passar por cima da lei para admitir o petista no pleito causaria um dano de ordem institucional. E, a essa altura, tudo o que não podemos fazer é fragilizar ainda mais as instituições.
Nesse contexto, eu diria que, se há alguma ameaça de fraude no ar, ela está menos em tirar Lula da eleição —o PT e suas ideias, afinal, não estão sendo calados, já que o partido estaria apto a lançar outro candidato —do que em deixar deliberadamente de aplicar uma lei que foi quase universalmente apontada como virtuosa apenas porque o resultado não nos agrada.
Não há como não apontar a ironia de que a Ficha Limpa leva a assinatura de Luiz Inácio Lula da Silva, que foi quem a sancionou, sob o aplauso de petistas como Dilma Rousseff.
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