terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Míriam Leitão: Otimismo curto

- O Globo

Os estoques deixados pela supersafra de 2017 vão garantir a estabilidade dos preços dos alimentos este ano. A produção vai cair, mas os preços não terão altas muito fortes. O desemprego ficará alto, mas o consumo pode continuar aumentando. Essa é a visão do economista José Roberto Mendonça de Barros. Ele aposta em um crescimento do PIB de 3,5%. Mas não tem visão positiva sobre 2019.

Todo mundo sabe que o ano passado foi excelente para a agropecuária brasileira, mas nem sempre se tem uma medida desse desempenho. José Roberto comparou a primeira previsão de safra de 2017, feita ainda em 2016, com o que acabou sendo colhido e chegou a um número impressionante:

— Foram 30 milhões de toneladas de grãos além da estimativa.

Isso não vai se repetir, e a colheita deve ser menor. Muita gente acha que isso significa forte pressão nos preços, mas ele acredita que não haverá isso porque os estoques de passagem (de um ano para o outro) estão altos:

— O milho terá uma produção menor mas o estoque é de 12 milhões de toneladas. Na soja, a queda da produção deve ser de apenas 3%. Com o país bem abastecido de milho e soja, não há por que ter grande variação nos preços da carne.

Mendonça de Barros esclarece que o desempenho do agronegócio não foi apenas pelo excelente ano climático. Foi também pelo aumento constante da produtividade. Isso significa que, mesmo com um ano climático não tão bom quanto 2017, o país continuará elevando a competitividade.

Acha que a inflação será baixa, em torno de 4%, porque outros fatores vão manter os preços estáveis:

— Os mecanismos de realimentação da inflação estão baixos porque os IGPs ficaram negativos e haverá até quem queira reduzir os preços de aluguéis, o IPCA ficou abaixo do piso da meta, e o INPC ficou em 2%.

Ele também não teme que o câmbio possa ser um fator de pressão caso a volatilidade aumente pela incerteza eleitoral e crise política. Pondera que o país “está cheio de dólar”. Houve um superávit histórico na balança comercial, o país recebeu investimento direto, e o balanço de transações correntes está perto de zero. Com abundância de oferta da moeda americana, e as reservas do BC, o país pode absorver, na opinião do economista, qualquer instabilidade no câmbio.

E o desemprego? Não há visão positiva que negue o problema, que permanece alto demais. José Roberto acha que os números continuarão negativos e o desemprego permanecerá em níveis elevados:

— Mas está caindo aquela sensação de que ‘eu posso ser o próximo na fila do desemprego.’ Essa sensação segurou muito o consumo no ano passado, porque mesmo quem estava empregado temia perder o posto de trabalho. Mas, agora, a escalada de demissões diminuiu. Há empresas que voltaram a contratar. E isso pode manter o consumo das famílias.

Ele acha que uma das provas desse fenômeno está nos dados de vendas de varejo. Os bens de maior valor, que precisam de financiamento, estão com um crescimento maior do que os que não precisam de crédito porque têm valor menor. Por isso, no seu cenário está um aumento do consumo, apesar de não haver uma melhora significativa no mercado de trabalho.

O desemprego hoje, na opinião de Mendonça de Barros, é um freio na retomada do crescimento. A recuperação econômica, após a recessão, está sendo mais lenta porque o desemprego está alto.

Se os dados positivos do cenário se confirmarem, o país atravessará um ano tumultuado na política com a economia em recuperação branda, não criando marolas. Afinal, a política já produzirá bastante tremor. O conflito se dará, segundo o economista, entre candidatos populistas e reformistas:

— O problema é que o candidato reformista ainda não está definido.

Mesmo um economista com uma visão otimista sobre a economia em 2018 nada garante sobre 2019. Para sustentar essa recuperação será preciso aumentar o investimento e isso exige um horizonte de estabilidade fiscal para alavancar investimentos públicos e privados. O país vai comemorar o dado bom de cada dia — como o de ontem, em que o IBC-Br teve alta 1% em 11 meses do ano passado — mas não tem qualquer certeza para além de 2018.

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