- Folha de S. Paulo
Steve Pinker mostra como a vida melhorou ao longo dos séculos, apesar do nosso pessimismo
Em “A Vida de Galileu”, o dramaturgo Bertolt Brecht concebe uma cena em que o cientista toscano fracassa em convencer seus interlocutores (um filósofo, um matemático e o grão-duque de Florença) a dar uma espiadela pelo telescópio e observar as luas de Júpiter, o que comprovaria sua tese de que o sistema ptolomaico não era completo. Eles preferem agarrar-se a suas velhas crenças.
Foi essa a imagem que me veio à cabeça ao terminar “Enlightenment Now” (iluminismo já), o novo livro de Steven Pinker. O autor exibe dezenas de gráficos que mostram que, ao longo dos últimos séculos e décadas, a vida dos humanos melhorou (e muito) em praticamente todos os aspectos que podemos mensurar, mas é como se as pessoas se recusassem a vê-los e, agarrando-se a seus vieses, falam e agem como se vivêssemos num mundo que corre para o abismo.
O livro é muito bom e seu ponto forte são justamente os capítulos em que Pinker dá detalhes de como a humanidade experimentou melhorias expressivas na expectativa de vida, na saúde, na alimentação, no acesso a bens, na equalização de direitos, na democracia, na segurança e até na felicidade e na inteligência.
Especialistas poderão apontar problemas metodológicos que afetem um ou outro ponto levantado por Pinker, mas me parece improvável que derrubem tudo. Estamos aqui lidando com “hard data”, e o mundo efetivamente se tornou um lugar melhor. Também me parece correto afirmar, como faz o autor, que o avanço das ciências e de ideais que poderíamos genericamente chamar de iluministas e humanistas têm algo a ver com isso.
Pinker não se sai tão bem quando procura identificar as forças responsáveis pela cultura de pessimismo e se lança numa cruzada algo maniqueísta —e por vezes histriônica— contra as humanidades, o populismo, o romantismo, a esquerda, a direita, a imprensa e até contra o pobre Nietzsche.
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