- O Estado de S.Paulo
STF é maior fonte de incerteza num País que não consegue acordar das repetições de suas mazelas
O Brasil parece viver, sem perspectiva de acordar, uma versão nada engraçada do Dia da Marmota vivido por Bill Murray no filme “O Feitiço do Tempo”. Quando se pensava que avanços no combate à corrupção, algum crescimento econômico e a perspectiva de eleições logo ali seriam a fórmula mágica para fazer o País acordar da repetição infindável de suas mazelas, eis que um conjunto de acontecimentos faz com que abramos os olhos de volta praticamente à estaca zero.
Há quatro anos, a Lava Jato desnudou o maior e mais abrangente esquema de corrupção da história do País, capitaneado por PT, MDB e seus sócios minoritários, com tal força e amplitude que, de quebra, estourou também esquemas passados e paralelos de PSDB e adjacências. O STF, então, deu em 2016 uma contribuição decisiva para esse enredo, ao decidir que o cumprimento da pena de prisão deve se dar após a condenação em segunda instância. Agora, o retrocesso se avizinha com a grande probabilidade de a mesma Corte, dois anos depois, rever a jurisprudência.
Quando parecia que Michel Temer tinha conseguido, à custa de doses cavalares de fisiologia e um trânsito político melhor que o de Dilma Rousseff, adiar seu encontro com a Justiça para depois de concluir seu mandato, eis que estamos de volta a 2017, com um presidente da República prestes a enfrentar mais uma denúncia do Ministério Público por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A terceira no intervalo de menos de um ano.
Num País que insiste em reviver seus pesadelos, a economia, que dava sinais de reação depois de anos de desvario dilmista, já vê seus agentes pisarem no freio e as projeções de crescimento ou recuperação do emprego recuarem.
O Brasil é um país que se acostumou a viver num stop and go em que mais para do que anda, em todas as esferas.
E de onde partem, hoje, as maiores razões de incerteza institucional a impedir que o País acorde de vez do Dia da Marmota?
Justamente do Supremo Tribunal Federal, uma Corte cujo nome é no singular, mas a ação se dá num plural desconjuntado que atordoa uma sociedade enfastiada de um presente eterno em que a regra é a impunidade e nunca se vira a página.
A briga entre Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso e o adiamento do julgamento do habeas corpus de Lula foram a demonstração pública, televisionada, de um tribunal cindido em dois grupos. A discussão sobre a prisão após segunda instância é o ponto mais sensível dessa divisão, e a exacerbação da tensão em torno do assunto foi contribuição decisiva da presidente, Cármen Lúcia, que sonegou a discussão de mérito definitiva do tema de modo a fazer com que, agora, ela se confunda com a decisão sobre a prisão ou não de Lula.
O petista foi condenado em duas instâncias, e teve seus embargos recusados por unanimidade em minutos. Se o Brasil fosse um País disposto a seguir em frente, já teria de haver uma regra clara, e uniforme, a determinar a partir de quando cumprirá sua pena. Regra esta que valeria para ele e para todos. Mas não há, e a culpa dessa total insegurança jurídica e política é do STF.
Enquanto uma ala da corte parece agir pra frear a velocidade do trem da Lava Jato, a outra trata de acelerá-lo, como seu viu nesta semana com a operação que levou para atrás das grades os amigos de Temer.
A Suprema Corte tem de falar por último em momentos capitais da vida de uma nação. Que os ministros se odeiem e tenham suas simpatias políticas, o problema é deles. Mas urge que se dispam de suas vaidades e preferências, vistam suas togas e ajam com a responsabilidade e a unidade que seus cargos exigem. E que indiquem qual o caminho para fazer o Brasil acordar do pesadelo regressivo a que está preso.
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