Após dia de reuniões, governo cedeu em negociações com caminhoneiros
Talita Fernandes , Daniel Carvalho e Mariana Carneiro | Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - Após sete dias de protesto em rodovias, cidades desabastecidas e filas quilométricas diante de postos de combustível, o presidente Michel Temer cedeu pela terceira vez aos apelos dos caminhoneiros.
Em pronunciamento no fim da noite de domingo (27), Temer anunciou uma série de concessões que, para serem cumpridas, custarão R$ 10 bilhões aos contribuintes, segundo cálculos do governo.
Após quase 12 horas de reuniões no Planalto, incluindo com representantes da categoria, ficou decidido que o preço do óleo diesel ficará congelado não mais por 15 ou 30 dias, como anunciado na semana passada. Agora, serão 60 dias, prazo menor que os 90 dias que os caminhoneiros exigiam.
Terminados os dois meses, o diesel só será reajustado a cada 30 dias.
O governo vai reduzir o preço em R$ 0,46 por litro nas refinarias e se comprometeu a fazer que este valor chegue às bombas.
Ao todo, foram divulgadas cinco medidas para atender às demandas. O Tesouro terá de ressarcir a Petrobras pelos descontos que serão concedidos e pelo congelamento do preço.
Não foi apontada a origem dos recursos, o que deve ocorrer nesta segunda-feira (28).
"Para chegar a esses R$ 0,46, o governo está assumindo sacrifícios no orçamento e honrará essa diferença de custo sem nenhum prejuízo para a Petrobras", disse Temer em um pronunciamento breve, lido e fechado a perguntas dos jornalistas.
Ao contrário do tom de sexta (25), quando endureceu o discursocontra os grevistas, desta vez o presidente buscou pacificação.
A palavra "sacrifício", por exemplo, não foi usada à toa. Ainda mais acuado, Temer procurou sensibilizar os caminhoneiros a colocarem fim à paralisação, evitando uma nova frustração e demonstrando o impacto orçamentário que as medidas terão.
Durante o domingo, houve novas rodadas de negociações com representantes da categoria —alguns deles presentes também ao acordo anunciado na quinta-feira (24).
Em seu pronunciamento, Temer disse ter assinado três medidas provisórias. A primeira delas isenta a cobrança de pedágio pelo eixo suspenso de caminhões em rodovias municipais, estaduais e federais.
O governo se comprometeu em reservar 30% do frete da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) para os autônomos. No ano passado, a estatal gastou R$ 107 milhões com o frete.
A terceira MP cria uma tabela mínima para preço de frete. Esse texto será editado em substituição a um projeto que está no Senado, onde tramita de forma mais lenta. A medida tem validade imediata.
Segundo Temer, os caminhoneiros poderão planejar melhor seus custos e valores do frete. Ele ponderou que as ações foram pensadas para não desestabilizar a Petrobras.
"Não é possível criar à Petrobras uma dificuldade operacional e de recursos que retire o prestígio que recuperou nesses dois anos."
O presidente aproveitou seu discurso para dizer que o acordo firmado pelo governo com os caminhoneiros na última quinta (24), que visava suspender as paralisações por 15 dias, continua válido.
Enfraquecido pela crise que atinge o país e seu governo, Temer usou sua fala para dizer que fez um esforço para diminuir os problemas e sofrimentos enfrentados pela população na última semana.
Em contrapartida, apelou à "responsabilidade e patriotismo" dos caminhoneiros, para o fim da greve.
"Quero manifestar a plena confiança no espírito de responsabilidade, de solidariedade e de patriotismo de cada um", disse o presidente.
Escalado para explicar melhor as medidas anunciadas por Temer, o ministro Carlos Marun (Secretaria de Governo) disse que as concessões não provocam imagem de fragilidade do governo e nem abrem espaço para pressão de outras categorias, como os petroleiros, que anunciaram greve para esta quarta-feira (30).
"Estamos concedendo o efeito [de redução dos impostos], porque zerar a Cide e o PIS/Cofins necessitaria uma substituição por outros impostos, que uma situação praticamente inexequível no momento e com a rapidez desejada. Então, optamos por produzir os efeitos da não cobrança sobre o óleo diesel", disse.
Representantes dos caminhoneiros disseram que aguardam a publicação das medidas no Diário Oficial da União desta segunda-feira para, então, começar a desmobilizar os protestos.
"Temos orientação de que, lido o Diário Oficial de amanhã [segunda], e se isso estiver contemplado, possa dar a oportunidade então de que o movimento possa reerguer", disse Carlos Alberto Dahmer, presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Ijuí (RS). " O que queríamos está contemplado", afirmou.
Neste domingo, lideranças sindicais disseram que foram informadas de que algumas delas foram multadas por prática de locaute —ação incentivada por empresas, o que é proibido.
Depois de abandonar a negociação na semana passada, José da Fonseca Lopes, presidente da Abcam (Associação Brasileira de Caminhoneiros), negou no domingo ter sido multado pelo governo, mas admitiu que está sendo investigado pela prática. "Eu não levei multa, a maioria levou."
Ele argumentou que nunca trabalhou para empresas e que sua pauta na paralisação sempre foi reduzir o preço do diesel por meio da diminuição de impostos.
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