- Valor Econômico
Número de servidores do MEC aumentou em 109 mil em dez anos
Um dos mitos mais disseminados na sociedade brasileira é o de que o país gasta pouco com a educação pública. Talvez, gaste mal, mas pouco, não. O Brasil desembolsa hoje, nessa área, o equivalente a 6% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano, valor superior à média dos países da OCDE - 5,5% - e de nações como Argentina (5,3% do PIB), Colômbia (4,7%), Chile (4,8%), México (5,3%) e Estados Unidos (5,4%). Olhando globalmente, o Brasil gasta mais com ensino público do que cerca de 80% dos países.
E a despesa vem crescendo rapidamente. Nos últimos dez anos, período que coincide com o aumento descontrolado dos gastos públicos, principalmente nos últimos três anos da gestão Lula (de 2008 a 2010) e no governo Dilma (2011-2016), os desembolsos da União para a área de educação cresceram impressionantes 91% acima da inflação do período - de R$ 61,4 bilhões para R$ 117,2 bilhões (a preços de 2017) - ou 7,4% ao ano, em média, em termos reais. Para se ter uma ideia, no mesmo período a receita corrente da União avançou apenas 6,7% em termos reais (0,7% ao ano).
Como proporção da receita corrente, a despesa federal com educação quase dobrou entre 2008 e 2017, passando de 4,7% para 8,3%. Em proporção do PIB, saltou de 1,1% para 1,8%.
Os dados foram compilados pela Secretaria do Tesouro Nacional e constam de estudo, intitulado "Aspectos Fiscais da Educação no Brasil", que acaba de sair do forno. O documento faz parte do esforço do secretário Mansueto Almeida de dar a maior publicidade possível à tragédia fiscal brasileira. O objetivo é mostrar à sociedade, por meio de textos claros, didáticos e rigorosamente técnicos, a difícil realidade das contas públicas - desde 2014, o setor público consolidado (União, Estados e municípios) gera déficits primários (conceito que não inclui o gasto com juros da dívida) e, por isso, a dívida pública entrou em trajetória perigosamente explosiva.
Instruir o debate com informações precisas pode diminuir a resistência de setores da sociedade, por exemplo, a reformas como a da Previdência. É com a desinformação - algo que não chega apenas às classes menos favorecidas - que as corporações, principalmente as do setor público, contam para interditar a discussão de reformas cruciais para o reequilíbrio das finanças públicas e a volta da economia à rota do crescimento sustentado.
Se o gasto com educação aumentou de forma acelerada nos últimos anos e essa despesa no Brasil já é maior que em dezenas de países, por que os indicadores do setor são tão ruins? Por que não se vê avanço significativo? Os números deixam claro que o problema não é falta de recursos. Uma pista, e este debate é mais velho que o titular desta coluna, está no rigoroso estudo elaborado pelo pessoal do Tesouro.
Em 2017, o gasto primário da União com educação superior somou R$ 75,4 bilhões e, com educação básica, R$ 34,6 bilhões. Gasta-se, portanto, mais que o dobro dos recursos com o ensino superior, quando todos sabemos que a tragédia flagrante do Brasil está no ensino médio - onde praticamente metade dos adolescentes está fora das escolas - e na baixa qualidade do ensino fundamental.
Os itens que mais contribuíram para a elevação dos gastos com educação entre 2008 e 2017 foram a despesa com os Institutos Federais de Educação Tecnológica (IFET) e os Hospitais Universitários. Também teve impacto significativo a despesa primária relacionada ao Fies, o programa que, a pretexto de financiar a formação universitária de jovens carentes, na prática, transferiu uma fortuna do Tesouro Nacional - cerca de R$ 61 bilhões, na última contagem realizada - para as contas dos acionistas das faculdades particulares do país, muitos deles sócios de fundos americanos e europeus. Uma temeridade pouco debatida e que não emociona ninguém nos redutos da esquerda brasileira e no meio intelectual.
Um esclarecimento é necessário: é evidente que as universidades públicas não têm como atender a toda a demanda por ensino superior, longe disso, mas a maneira como o governo Dilma estruturou o Fies foi calamitosa, com o Tesouro assumindo 100% do risco de calote (por causa desse incentivo, a inadimplência é superior a 50%), as escolas baixando padrões mínimos de exigência para catar aluno na rua e o governo emitindo dívida para financiar o programa. Trata-se, sem dúvida, de uma das políticas que mais concentraram renda na história do país.
"Apesar da forte pressão social para a elevação do gasto na área de educação, existem evidências de que a atual baixa qualidade não se deve à insuficiência de recursos. Tal observação não é específica ao Brasil, tendo em vista que já é estabelecida na literatura sobre o tema a visão de que políticas baseadas apenas na ampliação de 'insumos' educacionais são, em geral, ineficazes", diz o estudo do Tesouro. "Mesmo no Brasil existem casos de sucesso, como o do Ceará, que obteve em 2015 o quinto melhor Ideb nos anos iniciais do ensino fundamental, mesmo com gasto inferior à média do Nordeste e à média nacional."
O estudo cita que o melhor Ideb municipal do Brasil, em 2015, foi obtido pelo município de Sobral (CE), que, em 2017, gastou menos com educação que a média dos municípios do Ceará.
Em vez de repensar os mecanismos de financiamento das universidades públicas, os governos Lula e Dilma decidiram expandir de maneira exponencial a rede de ensino superior. Além disso, ampliaram a quantidade de institutos federais de educação tecnológica. Resulta daí um dado estarrecedor: nos últimos dez anos, o número de funcionários do Ministério da Educação saltou de 189.637 para 299.244, um incremento de quase 110 mil postos de trabalho, a maioria com estabilidade no emprego, aposentadoria quase integral e outros benefícios assegurados apenas ao funcionalismo.
Como em outras áreas, o Brasil vive na educação o pior dos mundos: gasta-se muito, mas os alunos (pobres) continuam aprendendo pouco ou nada. O debate passa pelo conhecimento dos números fiscais e pelo difícil enfrentamento - nenhum governante ousou fazer isso até hoje - das corporações.
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