Pré-candidata da Rede passou a adotar tom menos rebuscado em discursos
Joelmir Tavares | Folha de S. Paulo
SÃO PAULO- Marina Silva em fevereiro, ao comentar em entrevista à Folhaa desistência do apresentador Luciano Huck de disputar a Presidência:
“Eu acho que é fundamental que haja um adensamento em termos de suas participações no processo político para poder otimizar e potencializar sua contribuição”.
A mesma Marina, dias atrás, falando da eliminação da seleção brasileira da Copa antes de começar bate-papo ao vivo com seguidores no Facebook:
“Na política eu sou contra reeleição, mas, no futebol: fica, Tite”, disse ela, sorrindo.
No que depender da equipe da pré-candidata da Rede, o tom mais direto, com palavreado acessível e pitadas de humor, ocupará o lugar do linguajar rebuscado do passado, jocosamente chamado por adversários de “marinês”.
Em sua terceira tentativa de chegar ao Planalto, a ex-senadora vem sendo aconselhada por pessoas de seu entorno a transmitir suas mensagens de forma mais clara, principalmente nas participações em canais de TV e rádios.
Como ela terá apenas 8 segundos no horário eleitoral obrigatório (caso dispute a eleição sem se coligar com outros partidos), as aparições são consideradas essenciais na campanha. A ordem é aproveitar as chances e aceitar o máximo possível de convites.
A pré-candidata vem adaptando o estilo aos poucos —segundo sua assessoria, sem “media training” (treinamento para lidar com a imprensa).
Parlamentar por mais de 15 anos (ela foi vereadora, deputada estadual e senadora), Marina é avaliada como boa oradora, especialmente quando fala para plateias com nível educacional mais alto ou quando precisa tratar de assuntos técnicos que domina.
Mas há a necessidade, transmitida a ela por assessores que a acompanham desde a candidatura de 2010, de tornar mais palatável sua fala de candidata, para quando sobe em palanques ou dá entrevistas voltadas para eleitores.
O ponto de virada, na visão do grupo, foi a participação de Marina no Pânico, programa da rádio Jovem Pan apresentado por humoristas. Na entrevista, em abril, a presidenciável se mostrou mais solta.
Rebateu o comediante Carioca, um dos condutores da conversa, quando ele disse que basta não votar em políticos investigados por corrupção para tirá-los do poder.
“Ah, então você está defendendo o mesmo argumento dos que dizem que o presidente Lula não deveria ser punido, que era só concorrer à eleição. Não é isso”, disse ela.
Em outros momentos, fez troça. Ao falar de um projeto de energia solar, afirmou que gostaria de pôr uma placa de geração de eletricidade em seu xale ou no coque do cabelo para carregar a bateria do celular. Os entrevistadores gargalharam no estúdio.
“Eu sempre falo com a Marina para ela deixar vir à tona esse lado engraçado que as pessoas da convivência diária dela já conhecem”, diz a jornalista e ex-vereadora Andrea Gouvêa Vieira, uma das coordenadoras da campanha.
Para dissipar a imagem de séria ou brava, ela busca ainda rir de si mesma.
Marina tem repetido uma brincadeira em eventos: no meio de um pensamento, ela revela sua idade (60 anos) e depois reclama, em tom de piada, que ninguém da plateia se surpreendeu ou disse algo do tipo “nossa, não parece”.
Para deixar o discurso mais atrativo, a ex-senadora também costuma lançar mão de parábolas bíblicas e de histórias de quando vivia na floresta.
Outra estratégia tem sido usar o tempo em entrevistas para martelar ideias que norteiam sua candidatura. O conselho é para que Marina não deixe de dar respostas às perguntas, mas evite se perder em minúcias. E, se possível, tente emendar posicionamentos.
“Ela nutre um profundo respeito pelo interlocutor. É incapaz de deixar alguém sem resposta ou de fugir do debate”, diz o ambientalista João Paulo Capobianco, que coordena o programa de governo e conhece a ex-senadora há anos.
Dois meses atrás, quando a Folha reuniu em uma entrevista sete eleitores da pré-candidata da Rede, um dos problemas que eles apontaram nela foi justamente o “marinês”.
“Acho que ela se expressa de uma forma, não sei dizer... Mais complicada de entender”, disse a auxiliar de cozinha Debora de Carvalho, 33, moradora do Belenzinho (zona leste de São Paulo).
A presidenciável é hoje a segunda colocada no Datafolha em cenário sem Lula (PT), com 15% das intenções de voto. Jair Bolsonaro (PSL) lidera, com 19%.
Marina antes
“Quando me perguntam se sou direita ou esquerda, digo que sou sustentabilista progressista. Uma visão sustentabilista é capaz de integrar questões econômica, cultural, social, política, ética, estética, para criar novos ideais identificatórios e, a partir desses ideais, elaborar novos projetos”
no Facebook, em dez.2013
“Quando o desapreço pelo exercício da alteridade disputa instaurar-se como regra, abre-se o perigoso caminho pelo qual marcham, sem escrúpulos, os que se arvoram o direito de decretar destinos, eliminar as diferenças, usurpar a construção coletiva e cumulativa da verdade”, no Twitter, em nov.2017, reproduzindo trecho de artigo
Marina agora
“Até chamei minhas amigas para fazer um brechó para ver se renova o guarda-roupa da candidata”, a jornalistas, durante evento em SP, em abr.2018
“O problema é que os que têm essa maioria, com centrão, confusão, esculhambação, não estão governando”, na sabatina Folha/UOL/SBT, em mai.2018, sobre relação com o Congresso
“[Tenho] acordado às 4h da manhã para pegar um voo mais barato. Um dia desses, o pessoal exagerou na dose. Não precisava comprar um voo de volta do Rio na hora do jogo da Copa. Eu disse: ‘Pelo amor de Deus, não precisa economizar tanto assim!’”, em evento da Rede em Brasília, em jun.2018
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