Cortes ou pastas com superpoderes não suprimem o imperativo de negociar com o Congresso
O pensamento antipetista que floresceu no país ao longo dos últimos anos costuma dar importância exagerada à bandeira do corte de ministérios no Executivo federal —proposta encampada pelos presidenciáveis Jair Bolsonaro (PSL) e Geraldo Alckmin (PSDB), que disputam essa faixa do eleitorado.
Não que o tema seja irrelevante. O número de pastas chegou ao recorde de 39, dez acima da quantidade atual, no governo de Dilma Rousseff(PT), sem que se apresentasse nenhuma justificativa em termos de melhora da gestão pública.
Ao contrário, a proliferação de cargos de comando tende a provocar conflitos de atribuições e a atrasar o processo decisório. O problema talvez não tenha sido mais grave porque a maioria dos postos criados tinha poderes mais próprios do segundo escalão.
De todo modo, inutilidades como ministros da Pesca, da Aviação Civil ou da Pequena Empresa acabaram associadas à gastança que produziu a ruína do Orçamento, quando não aos múltiplos escândalos de corrupção do período.
O equívoco mais comum, devidamente explorado pelo mundo político, está em imaginar que a mera extinção de pastas corresponda a enxugamento do Estado ou combate ao desperdício —expressões que se encontram em documentos divulgados pelas campanhas de Bolsonaro e Alckmin.
Os cortes promovidos desde a redemocratização não passaram de realocações de órgãos, programas e servidores. Tome-se o exemplo da reforma promovida por Michel Temer (MDB), em que o antigo Ministério da Previdência, de longe o campeão de despesas da Esplanada, foi basicamente absorvido pelo Desenvolvimento Social.
Isso não se dá por acaso. O funcionalismo dispõe de garantias legais contra demissões; eliminar ações inteiras de governo é tarefa complexa dos pontos de vista técnico e político —que independe, aliás, do fim da pasta responsável.
Outras fantasias recorrentes envolvem equipes de “notáveis”, profundos conhecedores de suas áreas, ou superministérios detentores de grande poder e autonomia, como o que Bolsonaro prevê na economia.
Nada há de errado, a priori, na fusão de órgãos, muito menos na escolha de expoentes do setor para o comando. Entretanto será ilusório supor ou fazer crer que expedientes do gênero bastarão para livrar o Executivo das restrições impostas pela barganha de cargos, verbas e votos com o Congresso.
A negociação parlamentar permanecerá imperativa, e o modo como ocorre no Brasil não mudará com facilidade. Os ministros da Fazenda mais bem-sucedidos em tempos democráticos foram os que obtiveram respaldo do Planalto nas disputas legislativas cruciais. Essa será uma responsabilidade intransferível do presidente.
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