sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Claudia Safatle: Programas de governo entre slogans e bordões

- Valor Econômico

Programas se dividem em relação ao papel do Estado

Os programas de governo dos principais candidatos à Presidência da República, entregues à Justiça Eleitoral, não trazem informações suficientes sobre o que pretendem fazer, na economia, para tirar o Brasil do baixo crescimento. Em meio a promessas gerais, slogans e bordões há alguns caminhos desenhados e pistas de como persegui-los.

Ciro Gomes, do PDT e Geraldo Alckmin, do PSDB, se comprometem com a eliminação do déficit primário das contas públicas da ordem de R$ 139 bilhões, em 2020. Jair Bolsonaro (PSL) e Alvaro Dias (Podemos) assumem metas mais arrojadas, marcando a eliminação do déficit primário para 2019 e a realização de superávits à partir do ano seguinte. Dias vai além e sustenta que vai zerar em 2023 o déficit nominal, hoje de 6,5% do PIB, ou R$ 489,3 bilhões.

Ciro e Bolsonaro pregam o Orçamento base zero. "Não haverá mais dinheiro carimbado para pessoas, grupos políticos ou entidades com interesses especiais", adianta Bolsonaro. Por trás da defesa do Orçamento base zero há medidas duras e emendas constitucionais a serem propostas para desvincular as receitas de despesas preestabelecidas, que bate de frente com os interesses das corporações.

É difícil julgar se o presidente eleito terá força política para derrubar os carimbos do orçamento e para fazer as reformas necessárias.

Tal como o candidato do PSDB, Ciro quer criar o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) no lugar de vários outros tributos. O PDT quer instituir o Imposto de Renda sobre lucros e dividendos e aumentar as alíquotas do imposto sobre heranças e doações.

Henrique Meirelles (PMDB) prega reforma para simplificar o sistema tributário e, como Marina Silva (Rede), Bolsonaro e Alckmin, defende a abertura do país, com revisão das tarifas de importações para que a economia se integre às cadeias globais de valor.

O programa do PT pretende a "refundação democrática" do país. Defende a convocação de uma Assembleia Constituinte; a regulamentação da mídia e o controle social de todos os poderes da União; a suspensão das privatizações; a revogação do teto para o gasto público e da reforma trabalhista e a "recuperação" do pré-sal.

Propõe, ainda, um novo projeto de desenvolvimento com dois eixos. Um de natureza emergencial - com a retomada das obras paralisadas, dos investimentos da Petrobras e do Minha Casa, Minha Vida, para a criação de empregos.

O programa de Lula/ Fernando Haddad, do PT, não se compromete com metas fiscais e, ao contrário da maioria dos candidatos, não pretende preservar o tripé macroeconômico dado pelo superávit fiscal, regime de metas para a inflação e câmbio flutuante. Como segundo eixo, de natureza estrutural, defende uma nova orientação macroeconômica, voltada para o desenvolvimento, que não detalha, e mandato dual para o Banco Central - que teria junto à meta de inflação uma de crescimento. Ciro também quer dar ao BC duas missões - meta para a inflação e para o emprego e, como o PT, disse que vai revogar a medida do teto de gasto.

O PT afirma que vai fazer tributação progressiva dos bancos para incentivar a redução do spread e isentar do Imposto de Renda quem ganha até cinco salários mínimos.

Praticamente todos os candidatos querem reforma tributária para simplificar a vida do cidadão e reduzir a carga de impostos. Colocam, também, entre suas prioridades máximas a melhoria das políticas de educação, de saúde e de segurança, além de avanços em ciência, tecnologia e inovação. Todos querem combater a corrupção, o crime organizado e o tráfico de armas e drogas.

Uns, como PDT e PT, são mais intervencionistas e, em maior ou em menor grau, adeptos de um Estado grande e do nacional desenvolvimentismo. Tal como João Goulart Filho, do PPL. Outros, como Bolsonaro e João Amoêdo (Novo), são claramente liberais e advogam menos Estado.

Bolsonaro diz que reduzirá em 20% a dívida pública com a geração de superávits primários a partir do segundo ano de governo. O programa do PSL trata da privatização das empresas estatais, mas não aponta quais das 147 empresas estatais serão vendidas, preservadas ou extintas. O PSDB fala em privatizações criteriosas e o Rede diz que não venderá a Petrobras, o Banco do Brasil e a Caixa. O Novo, de Amoêdo, porém, quebra tabus e assume privatizar BB, Caixa e Correios.

A reforma da Previdência citada nas propostas dos principais candidatos é diversificada. Alckmin quer "um sistema único de aposentadoria, igualando direitos e abolindo

privilégios". Marina diz que seu governo apresentará proposta de idade mínima para aposentadoria, eliminação dos privilégios e um processo de transição para sistema misto de contribuição e capitalização.

O PT rejeita postulados "neoliberais" da reforma da Previdência, mas defende a convergência entre o regime dos funcionários do setor público e o do setor privado.

Alckmin quer a reforma política com voto distrital. Marina fala em fim da reeleição e em voto distrital misto. O PT e Ciro prometem a reindustrialização do país. Alvaro Dias garante criar 10 milhões de empregos em quatro anos, uma das metas do seu plano inspirado em JK. Meirelles sustenta crescimento de 4% ao ano, tal como ocorreu quando comandou o Banco Central (de 2003 a 2010).

Cortar as desonerações fiscais em 15%, como diz Ciro, acabar com todos os benefícios fiscais ao setor privado, como prega Amoêdo, ou rever as renúncias fiscais e suspender o Refis, como quer Marina?

Nada será fácil para quem assumir o governo em 2019. Tudo começa pelo entendimento de que o Estado brasileiro faliu. Sem consertar as finanças públicas, o novo presidente não irá longe. Slogans e bordões embalam campanhas mas podem fazer muito pouco para o cumprimento de promessas.

A surpresa negativa fica por conta do PT, cuja chapa puro-sangue e a linguagem esquerdista, antidemocrática e cheia de mágoas do programa leva o partido a retroceder para antes de 2002. Ali o PT ampliou seu arco de alianças rumo ao centro e foi vitorioso.

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