sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Merval Pereira: Derrotas sucessivas

- O Globo

Faz sentido a posição de Raquel Dodge de impugnar a candidatura de Lula sem nem mesmo abrir um processo

O bom senso manda que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) resolva a questão da candidatura do ex-presidente Lula até o dia 31 de agosto, portanto, antes de começar a propaganda eleitoral no rádio e na TV; e há razões para isso: não é possível realizar uma campanha presidencial com dúvidas jurídicas e as chicanas que o PT está fazendo.

Lula, condenado em segunda instância, não pode concorrer à Presidência da República. A posição da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, de impugnar a candidatura sem nem mesmo abrir um processo, faz sentido, pois Lula está condenado em segunda instância pelo TRF-4 e enquadra-se na Lei da Ficha Limpa.

Há ainda uma medida mais rápida à disposição do TSE, a impugnação de ofício pelo relator do processo, o ministro Luís Roberto Barroso.

Essa medida é perfeitamente cabível, pois, como disse a procuradora-geral da República, o ex-presidente não preenche as exigências legais para ser elegível, “o que impede que ele seja tratado juridicamente como candidato e também que a candidatura requerida seja considerada sub judice, uma vez que inapta mesmo a causar o conhecimento do pedido de registro pelo Tribunal Superior Eleitoral”.

Porém, quando a procuradora-geral argumenta que o ex-presidente “não pode fazer propaganda eleitoral com o financiamento de sua candidatura com recursos públicos, que são destinados apenas a financiar campanhas dos elegíveis”, considero que está forçando a interpretação da lei.

Se até a data de início da propaganda eleitoral gratuita o TSE não tiver definido sua situação, Lula é candidato dentro da lei e poderá usar o Fundo Partidário para fazer campanha. Se e quando for impugnado (e o mais provável é que seja), perderá esse direito, mas não terá que devolver nada aos cofres públicos, porque atuou legitimamente dentro da lei.

A tentativa de utilizar o Superior Tribunal de Justiça (STJ) para colocar o nome de Lula na urna eleitoral em outubro tem dado errado com frequência assustadora, na maior parte das vezes por erro técnico da defesa do ex-presidente.

Ontem, 5ª Turma do STJ rejeitou, por unanimidade, os embargos de declaração apresentados contra decisão que não suspendeu os efeitos de sua condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) no caso do tríplex do Guarujá.

A anulação do julgamento em segunda instância é a única maneira de Lula tornar-se ficha limpa. A defesa utilizou um argumento técnico em matéria civil para tentar anular a decisão contrária do STJ, pedindo a realização de um novo julgamento de um agravo regimental.

Ao julgar os embargos de declaração, o relator Felix Fischer lembrou que o regimento interno do STJ, no julgamento de agravo regimental em matéria penal, diz que não há necessidade de inclusão em pauta, nem intimação de advogado.

Segundo o relator, não há previsão de sustentação oral, bastando o recurso ser apresentado em mesa. Houve unanimidade na recusa dos embargos. Também deve ter o mesmo destino o recurso que a defesa do ex-presidente impetrou ontem no mesmo STJ, querendo o mesmo tratamento dado ao deputado João Rodrigues, acusado de fraude e dispensa de licitação quando era prefeito de Pinhalzinho, em Santa Catarina.

O deputado do PSD estava preso, mas ganhou uma liminar concedida pelo desembargador Rogerio Schietti, que suspendeu os efeitos da condenação, permitindo a ele concorrer nas eleições deste ano.

Acontece que a pena de prisão a que o deputado estava condenado prescreveu, e ele recuperou seus direitos políticos. Segundo o artigo 107 do Código Penal, há dois tipos de prescrição, que obedecem a uma tabela previamente estabelecida: a da pretensão punitiva, que é o caso do deputado João Rodrigues, ou a da pretensão executória.

Embora condenado, ele recorreu, alegando que sua condenação prescrevera, com o que concordou o STJ. A procuradora-geral Raquel Dodge não concordou e recorreu. Mas o caso nada tem a ver, portanto, com a condenação de Lula, que não prescreverá tão cedo devido ao tamanho da pena: 12 anos e um mês de prisão.

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