sábado, 25 de agosto de 2018

O cerco a Trump: Editorial | Folha de S. Paulo

Novo escândalo envolvendo o presidente dos EUA reaviva debate sobre impeachment

Que Donald Trump se apresentava uma figura inapropriada para ocupar a Presidência dos Estados Unidos, sabia-se desde sua campanha. Uma vez vitorioso, transpôs para o cargo os aspectos condenáveis que exibia ainda candidato, tais como o desprezo à liberdade de imprensa e a promiscuidade entre a vida privada e a pública.

A mais recente prova desse conflito de esferas deu-se na terça (21), quando Michael Cohen, ex-advogado pessoal de Trump, disse à Justiça ter comprado, a mando do então postulante à Casa Branca, o silêncio de uma atriz pornô e de uma ex-modelo que teriam mantido um caso com o republicano —o que pode ferir a lei de financiamento eleitoral.

Bem à sua maneira, o presidente fez pouco do episódio. Declarou que não se tratava de um delito, tampouco “um grande problema”, pois não teria recorrido a fundos de campanha. Reavivou-se, entretanto, o debate sobre a possibilidade de se deflagrar um processo de impeachment.

A cada novo desdobramento do extenso rol de episódios no mínimo desconfortáveis para Trump, parte da opinião pública americana, em especial integrantes do Partido Democrata, volta a cobrar sua remoção. Já se ventilou até uma suposta insanidade como argumento para apeá-lo do poder.

Convém aqui reafirmar que as atitudes de Trump têm diminuído sobremaneira a instituição que representa, em constante desserviço à imagem dos EUA no mundo.

No entanto nenhuma das várias evidências de má conduta, ao menos por ora, justifica o impedimento. O emprego de instituto dessa natureza deve se restringir a situações de fato excepcionais, como a comprovação de um crime que inviabilize politicamente o exercício da função.

Esta Folha valeu-se de lógica semelhante ao defender a renúncia da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), e não sua deposição, posto que as pedaladas fiscais não se afiguravam como razão irrefutável para o uso de tal mecanismo —em que pese a legalidade do processo.

Em sua robusta história de mais de 200 anos, a democracia americana jamais testemunhou a destituição de um mandatário. Isso não significa, claro, que não se possa desenhar um cenário no qual Trump venha a deixar o comando do Executivo por decisão do Congresso.

A investigação sobre a suspeita de conluio entre a campanha republicana e o governo da Rússia durante a eleição de 2016 tem potencial para conduzi-lo a um julgamento político, caso se confirme que o presidente tentou obstruir a Justiça —uma hipótese, diga-se, bastante plausível.

Tudo dependerá, porém, da composição de Câmara e Senado após o pleito legislativo marcado para novembro, em que os republicanos podem perder a maioria que possuem nas duas Casas. Nesse caso, os rivais democratas fariam o possível para perseguir o impeachment, sem se importar se há fundamentação ou não para tanto.

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