- Valor Econômico
"Só há espaço para choque fiscal", avisa Wahba, da Garín
Hoje é feriado nos Estados Unidos pelo Dia do Trabalho. Portanto, um "quase" feriado global para transações financeiras. Na sexta-feira, é feriado no Brasil pelo Dia da Independência. Três dias de negócios no mercado local em funcionamento alternado com Wall Street são suficientes - a qualquer tempo - para que gestores e chefes de tesouraria assumam posições defensivas e travem os negócios até a segunda-feira seguinte. Desta vez, porém, empurrar os negócios pode não ser tão simples. O mercado tem novos riscos a administrar, a partir da decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de rejeitar o registro da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva às eleições de outubro e da limpeza de gavetas a ser feita pelo governo Michel Temer.
Na última semana, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) aumentou o preço do óleo diesel, congelado desde a greve dos caminhoneiros em maio e já há manifestações contra reajuste de 13% nas refinarias; a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) conseguiu realizar, na sexta, o leilão de energia correndo contra o tempo e ações judiciais; a equipe econômica detalhou e encaminhou ao Congresso o Projeto de Lei do Orçamento de 2019, que estabeleceu em R$ 1.006 o valor do salário mínimo a partir de janeiro, sendo que em abril uma nova regra de cálculo será discutida para o mínimo de 2020.
O ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, formalizou a transferência, para 2020, do reajuste salarial dos servidores civis do Executivo e manutenção do reajuste do Judiciário em 2019, em troca da extinção do auxílio-moradia.
Nesta semana, o processo eleitoral ganha traços excepcionais com a perspectiva de o PT deflagrar uma batalha jurídica junto aos Tribunais Superiores para tentar reverter a decisão da Justiça Eleitoral sobre o registro da candidatura de Lula. Hoje, o partido se reúne para definir estratégias de atuação que, sendo ou não efetivas, provocarão ruídos.
Rejeitado o recurso pelo registro de Lula, a atenção do mercado tende a se voltar para o potencial de transferência de votos do ex-presidente para o seu sucessor na cabeça de chapa petista para a eleição à presidência da República.
A decisão do TSE era esperada entre os participantes do mercado financeiro. Alguns se mostraram positivamente surpresos com a suspensão da campanha do partido no horário eleitoral gratuito até a definição - no máximo em dez dias - da nova chapa que deve ser encabeçada por Fernando Haddad, vice de Lula na composição anterior.
Surpreenderam também, mas negativamente, o TSE ter voltado atrás e autorizado a campanha petista desde que Lula não fosse mencionado como candidato e a possibilidade de participação do ex-presidente em 25% do tempo da propaganda eleitoral como apoiador do partido, como prevê a legislação.
O nome de Lula nas pesquisas intenção de voto já era apontado por operadores e analistas de mercado como um elemento perturbador aos resultados alcançados pelos institutos de pesquisa. Até porque, mantendo a liderança em todas elas, quando mencionado o seu nome, Lula indiretamente emperra o processo de redistribuição de votos entre os demais concorrentes.
Pesquisa nacional Ibope, encomendada pela Rede Globo e jornal "O Estado de S.Paulo", poderá ser divulgada a partir desta terça e terá particular relevância para a revisão de expectativas eleitorais. Essa pesquisa vai trazer o nome de Lula em um cenário, mas o seu resultado já estará incorporando reações dos eleitores sobre a rejeição de sua candidatura. O instituto iniciou a sondagem em 29 de agosto e o trabalho de campo estará concluído nesta terça, dia 4 de setembro, segundo informações registradas no TSE.
A decisão do TSE sobre a candidatura de Lula marca, na prática, o início da disputa eleitoral que tende ao remanejamento de votos. "O jogo está só começando", avalia a Garín Investimento s, fundada no ano passado, por experientes executivos do mercado e que inaugura sua área de venture capital com a chegada de Saulo Mendes de Almeida, ex-Head de Capital Markets do Citi no Brasil.
Três dos oito sócios receberam a coluna na sede da instituição, em São Paulo, na quinta-feira, dia em que o peso argentino explodiu, aprofundando a crise já instalada e levando o país de Macri novamente ao Fundo Monetário Internacional (FMI).
Richard Wahba, diretor geral da Garín, acredita que a crise na Argentina e Turquia fortalecerá a opinião já existente no mercado de que não há espaço para propostas de candidatos a presidente do Brasil, além de ajuste fiscal imediato. "O que assistimos hoje na Argentina corrobora as propostas do Pérsio Arida de zerar o déficit público em dois anos e do Paulo Guedes que pretender fazer o mesmo em um ano. Depois de ver o que aconteceu hoje [o caos na Argentina e a rapidez da repercussão no mercado brasileiro] é improvável que alguém pense em fazer diferente porque o risco do descrédito é muito alto", afirma Wahba que vê em medidas gradualistas um atalho para um câmbio descontrolado e com forte potencial para desorganizar a economia.
Ivan Kraiser, gestor-chefe da Garín, avalia que a "oxigenação" que haverá no Congresso - com renovação da Câmara e parte do Senado - somada à pressão do investidores por reformas, "pressão que, aliás, já começou" será positiva para acelerar o processo de ajuste da economia brasileira.
Referindo-se à renda variável, Kraiser explica que o mercado brasileiro está muito "desalocado" e não é de agora. "A alocação está em níveis baixos desde o Joesley Day, em meados do ano passado. A bolsa brasileira está barata. Veja um papel como Cemig que chegou a US$ 15 e agora está a US$ 1,50. Outro exemplo, em 2008, o Brasil respondia por 3% do valor de mercado global. Agora, 1%", diz.
Lika Takahashi, estrategista chefe da Garín, considera que a bolsa só não estará melhor se o mercado estimar que a economia brasileira estará em recessão no ano que vem. Quanto à turbulência observada na Turquia e na Argentina, Lika entende que deveria preocupar o Brasil. "Estamos todos em uma mesma cesta de ativos de risco e assim somos avaliados. Às vésperas da eleição estaríamos melhor se a reforma da Previdência tivesse sido aprovada neste governo."
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