- Valor Econômico
Equipe de Bolsonaro quer melhorar comunicação
Poucos temas relacionados ao presidente eleito Jair Bolsonaro e sua equipe demonstraram, até agora, a capacidade de construir uma unanimidade entre aliados, adversários e observadores desapaixonados. Há uma exceção: a surpresa em relação à forma que o futuro governo se comunica com a sociedade.
Bolsonaro passou os últimos anos visitando praticamente todos os Estados. Percorreu o país, preparando a plataforma de sua candidatura a presidente e arregimentando eleitores insatisfeitos com "tudo o que está aí". Gastou sola de sapato, enquanto construía canais de comunicação direta com a população por meio de redes sociais.
Bolsonaro afastou intermediários e, à medida que sua popularidade crescia e transbordava seu tímido tempo na propaganda obrigatória de rádio e televisão, esses mesmos canais o ajudaram a direcionar o debate travado com seus adversários e a pautar veículos tradicionais de informação.
Bolsonaro e seus colaboradores mais próximos mantiveram a estratégia nas últimas três semanas, após saírem vitoriosos das urnas. Período suficiente para alguns auxiliares do presidente eleito já terem concluído que essa estratégia deve ser ajustada, para evitar ruídos e afastar crises desnecessárias do Palácio do Planalto no início do governo.
Há algumas iniciativas em discussão no Centro Cultural Banco do Brasil, onde está instalada a equipe de transição na capital federal. Sobre a mesa, por exemplo, está em pauta a nomeação de um porta-voz. Um profissional da área que participe das principais reuniões presididas por Bolsonaro, esteja a par dos principais programas e medidas em gestação no governo. Que forneça informações para a imprensa e, de quebra, ajude o presidente da República a manter-se afastado de repórteres e suas perguntas.
Bolsonaro tem concedido rápidas entrevistas coletivas, a despeito das recomendações da sua equipe de segurança de mantê-lo sob resguardo. Mas acredita-se, no Palácio do Planalto, que ele passará a viver num rígido esquema de proteção pessoal devido ao atentado sofrido durante a campanha eleitoral.
Há ainda em discussão outras ideias, como a estruturação de um grupo responsável por gerir dados e informações coletadas nas redes sociais e em pesquisas de opinião, com o objetivo de garantir que a área de comunicação do Palácio do Planalto se antecipe a eventuais crises. Entrariam nesse radar sinais de mobilizações, nas redes sociais, capazes de danificar a imagem de Bolsonaro e seu governo. Um instrumento para evitar que a máquina pública federal fique sempre na defensiva e mantenha uma postura apenas reativa.
A ideia não é substituir ou criar uma engrenagem que gere uma sobreposição em relação às atribuições do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, principalmente devido ao fato de que o GSI será chefiado pelo general Augusto Heleno, um dos auxiliares mais próximos ao presidente eleito Jair Bolsonaro. O GSI, também instalado no Planalto, é o órgão responsável pelo assessoramento direto do presidente, por monitorar os assuntos capazes de gerar riscos à estabilidade institucional, por prevenir a ocorrência e ainda articular o gerenciamento de crises.
Bolsonaristas também querem dar mais força e dinamismo à área da Presidência responsável pela realização e análise de pesquisas de opinião pública, a qual já atua para captar a percepção da população em relação a políticas públicas, assim como o humor dos cidadãos em relação às conjunturas política e econômica. Não foi à toa, por exemplo, que o governo Michel Temer fez recentemente um esforço para reduzir as tarifas de energia elétrica, tema sensível para um número expressivo de brasileiros.
Outras pesquisas também mensuraram a receptividade e expectativas dos entrevistados em relação à privatização da Eletrobras, à intervenção na segurança pública no Rio de Janeiro, a "agenda positiva" do governo, a violência no país e a reforma da Previdência. Os dados coletados em fevereiro sobre a reforma previdenciária podem, inclusive, servir de guia pela próxima administração.
À época, ainda metade dos entrevistados considerava desnecessária uma reforma da Previdência. A maioria dos entrevistados era contra uma idade mínima de 62 anos para mulheres e 65 para homens, mas defendia que servidores e trabalhadores seguissem as mesmas regras. Apoiava a aposentadoria de policiais aos 55 anos, mas se dividia em relação à idade de 60 anos para a aposentadoria de professores.
O próprio presidente eleito já vem dizendo que a proposta de reforma da Previdência em tramitação na Câmara dos Deputados é "salgada", num momento em que as centrais sindicais preparam uma mobilização nacional contra sua disposição de alterar as regras do sistema previdenciário. Mesmo assim, Bolsonaro sabe que precisará atacar o problema de alguma forma, se não quiser minar o otimismo observado atualmente entre empresários e investidores.
Há base legal para a realização de todo esse trabalho na área de comunicação social pela Presidência da República. Decretos garantem a estrutura e os meios para o Palácio do Planalto manejar redes sociais, pesquisas de opinião e verbas de propaganda.
Tudo isso está sob análise da equipe de transição. Até mesmo não é descartada a manutenção de uma televisão estatal, empresa historicamente atacada por adversários do PT. Ela é vista por alguns dos auxiliares de Bolsonaro como uma ferramenta importante para que as mensagens do governo federal alcancem milhões de pessoas que não têm acesso às redes sociais, um eleitorado a ser desbravado.
Não há ainda perspectiva, porém, de Bolsonaro abandonar o hábito de mandar recados e fazer importantes anúncios por meio de postagens na internet. Pelo contrário. A tendência é que ministros e colaboradores mais próximos adiram à prática, consagrada por Donald Trump. Nos Estados Unidos, a Justiça já precisou ser acionada para balizar o relacionamento entre o presidente e a imprensa.
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