- O Globo
Faltavam quatro semanas para a eleição. Na noite de terça-feira, 4 de setembro, o deputado Luiz Martins atendeu o telefonema de um cabo eleitoral de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Eram 22h46m, registrou o gravador: “Luiz, tão prejudicando você aqui em Austin, tá?”
Líder da bancada do PDT na Assembleia do Rio, Martins lutava pela quarta eleição, e Austin, bairro pobre de 30 mil votos, havia sido relevante em 2014, quando sua votação cresceu 50% na Região Metropolitana.
“É a Cedae, tá?”, prosseguiu o auxiliar. “Estão mandando pro outro candidato. É dois, três caminhão por semana... o André Ceciliano, pô! Entendeu? A Cedae parece que quer que tu perde a eleição, tá?”
A Cedae é uma joia do governo estadual: fatura cerca de US$ 1,5 bilhão, ou R$ 6 bilhões, em serviços de qualidade questionável de água e esgoto.
Martins decidira impedir a privatização da Cedae. Seu adversário Ceciliano, líder do PT na Baixada, era a favor no verão, mas no inverno mudou e ficou contra. Ambos disputavam os mesmos redutos pobres, onde água vale como moeda.
Dias depois, Martins telefonou a Marcello Motta, diretor da Cedae. Eram 8h13m de domingo, 9 de setembro: “Pô, vê se manda pra aquele lado que não foi ontem, a porra do caminhão-pipa hoje, cara... Tá me enchendo o saco, cara. Manda hoje?”
Motta foi obediente: “Ah, tá bom... Mando, mando...”
Martins ainda ligou para Jorge Briard, presidente da estatal. Reclamou por ele estar a serviço de outro adversário, Jair Bittencourt, do PP.
Quando faltavam duas semanas para a eleição, Martins, Ceciliano e Bittencourt se uniram a outros 42 deputados estaduais. Aprovaram emenda constitucional proibindo a privatização da Cedae. A venda era exigência contratual do empréstimo federal que salvou o Estado do Rio neste ano.
O acervo de gravações telefônicas ordenadas pela Justiça na Alerj mostra o loteamento e a submissão da Cedae aos interesses privados de deputados. Martins foi preso semana passada por “movimentação atípica” de R$ 18 milhões, entre outras razões.
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