Fernando Taquari | Valor Econômico
SÃO PAULO - A eleição de 2018 terminou com um gosto amargo para o PSDB e acentuou as incertezas que cercam o partido. Não há até o momento nenhuma reunião marcada para fazer um balanço dos resultados nas urnas e projetar o futuro. Por ora, tucanos conversam nos bastidores. Há um consenso sobre a necessidade de uma autocrítica. Mas muitos divergem em relação aos rumos daqui para frente.
As diferenças colocam em lados opostos os grupos do ex-governador Geraldo Alckmin, derrotado na eleição presidencial, e do futuro ocupante do Palácio dos Bandeirantes, o ex-prefeito João Doria. Os doristas defendem um alinhamento do PSDB com o governo eleito de Jair Bolsonaro (PSL) e pedem passagem nos cargos da executiva nacional. Essa postura desagrada integrantes históricos e aliados de Alckmin.
Os tucanos fizeram neste ano a menor bancada de sua história na Câmara dos Deputados (29) e terão o menor número de governadores (3) desde 1990. Com 4,76% dos votos válidos, Alckmin ainda registrou a mais baixa votação de um tucano numa sucessão presidencial. O saldo poderia ter sido pior não fossem as vitórias no Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e, sobretudo, em São Paulo, onde o PSDB conseguiu, por uma estreita vantagem, manter uma hegemonia no Estado que já dura 24 anos.
A supremacia entre o eleitorado paulista, somada às outras duas conquistas, permitirão à sigla governar o maior número de habitantes (59,6 milhões) a partir de 2019. No entanto, ainda que tenha sido importante para evitar mais um revés, é justamente a vitória em São Paulo que pode ampliar as divisões internas. Neste momento, ninguém deve fazer um movimento de desfiliação, como foi cogitado.
Segundo um dirigente, é preciso um enredo para justificar a saída e a fundação de outro partido. Uma desfiliação em massa, explica ele, não pode ter como premissa uma questão pessoal contra a figura de Doria. Até porque sua ascensão ao governo estadual lhe confere um protagonismo inédito. Não é à toa que doristas já articulam internamente para tirar Alckmin do comando partidário, cujo mandato se encerra no fim de 2019.
Aliado de Doria, o prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando (PSDB), entende que o ex-governador pode antecipar este processo com uma renúncia para evitar desgastes. "Não faz sentido continuar com a mesma direção. As urnas deram um recado. A sociedade brigou com a gente, mas não houve separação. Precisamos fazer as pazes. Há urgência por mudanças. Temos que rever nossas posições", afirma Morando.
O prefeito de São Bernardo enxerga, inclusive, a necessidade de os correligionários avaliarem a ideia de mudar o nome da legenda. "Ficamos rotulados de forma negativa", justifica. Em busca de uma sintonia com a população, Morando propõe também a imediata expulsão dos infiéis e dos tucanos já condenados, como o ex-senador Eduardo Azeredo (MG). "Não podemos ter complacência com o desvio de conduta", alega.
Uma eventual debandada, segundo outro tucano, vai depender do comportamento de Doria nos próximos meses. Uma caça às bruxas e a pressão por uma maior presença no comando partidário antes da hora tendem a criar fissuras irreversíveis, conforme alckmistas. "Precisamos de autocrítica, mas sem um ambiente de guerra. Está na hora de agregar forças para voltarmos a ser uma referência", diz o ex-deputado José Aníbal.
Com exceção da reunião em que sugeriu que Doria seria um "traidor", Alckmin permanece recluso depois da derrota na corrida presidencial. Nas poucas conversas que teve desde então, não deu sinais de que pretende ceder aos apelos de doristas. Pelo contrário. Alckmin tem incentivado a permanência no partido de tucanos que apoiaram a reeleição de Márcio França (PSB) e ameaçaram sair do PSDB em caso de uma vitória de Doria.
Além disso, Alckmin trabalha contra a expulsão dos tucanos acusados de infidelidade partidária, como o ex-governador Alberto Goldman e o secretário estadual de Governo, Saulo de Castro Abreu Filho, entre outros. "Não é o momento para revanchismo. Nossa prioridade deve ser criar novas fórmulas de diálogo com a juventude, os movimentos sociais e a universidade, com quem sempre tivemos um laço", afirma o deputado federal eleito Carlos Bezerra (PSDB-SP).
Na contramão dos doristas, Aníbal e Bezerra acreditam que o PSDB deveria fazer uma oposição crítica ao governo Bolsonaro. "Aquilo que for bom e estiver alinhado com as nossas tradições, vamos apoiar. As reformas, por exemplo, são urgentes", aponta Aníbal. "Nunca ficamos à reboque de outro partido. As ondas são passageiras. Devemos resgatar nossa identidade", acrescenta Bezerra.
A guinada à direita, com uma pauta liberal na economia e conservadora nos costumes, como sugere Doria, não encontra eco entre correntes mais progressistas do PSDB. Para esses tucanos, esse espaço já está preenchido com o PSL, o DEM e a ascensão do Novo. O caminho, afirmam, seria o centro.
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