sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Os avanços ambientais têm sido pendulares no mundo: Editorial | Valor Econômico

A morte de Francisco Alves Mendes Filho faz 30 anos neste sábado. O seringueiro e líder sindical Chico Mendes havia sido condecorado no ano anterior pela Organização das Nações Unidas por sua defesa do meio ambiente. Participava e organizava "empates", a forma de luta de homens e mulheres que deitavam no solo da floresta no Acre para impedir, pacificamente, a ação de tratores e motosserras que derrubavam a Amazônia. A mata vinha abaixo pela extração ilegal de madeira e era trocada por pasto. O embate vitimara várias lideranças em anos anteriores sem que os crimes fossem investigados. Chico Mendes queria preservar e criar reservas extrativistas, os fazendeiros queriam desmatar e colocar gado. Foi morto a tiros de espingarda no quintal de sua casa, em Xapuri, por Darcy Alves da Silva a mando do pai, o fazendeiro Darly Alves da Silva. O assassinato do "herói da floresta", como era conhecido, repercutiu no mundo todo. O Brasil ocupou manchetes pela derrubada da floresta, pelo sangrento conflito no campo e pela condição de impunidade dos crimes.

A agenda de luta de Chico Mendes continua atual, 30 anos depois, no Brasil e no mundo.

Os avanços ambientais nestas três décadas foram pendulares. A taxa estimada do desmatamento da Amazônia pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em 1988 foi de 21 mil km2. O desmate entre agosto de 2017 e julho de 2018 ainda é alto, mas três vezes menor do que aquele. O Brasil, contudo, lidera o ranking dos lugares mais perigosos para ativistas no mundo, com recorde de assassinatos em conflitos de terra em 2017. Foram 57 mortes (seis a mais do que em 2016), segundo o relatório da ONG Global Witness.

Quatro anos depois da morte de Chico Mendes, o Brasil sediou a Rio 92, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, uma das mais importantes reuniões de meio ambiente da história. O evento é até hoje reconhecido pela sua musculatura - produziu duas convenções, a do Clima e a da Biodiversidade e lançou os fundamentos da convenção de combate à Desertificação. Agora, na última rodada de negociações climáticas, a CoP 24, concluída há poucos dias na Polônia, o multilateralismo deu vida ao Acordo de Paris, mas sem entusiamo.

Não havia liderança na conferência de Katowice. Os Estados Unidos do presidente Donald Trump continuam negociando, até porque pelas regras só podem sair do Acordo em 2020, coincidindo com o resultado do próximo pleito eleitoral. Os EUA podem sair do Acordo de Paris como último ato de Trump, mas o futuro presidente, a depender de quem seja, pode recolocar o país de volta na sequência. Mas há danos sendo feitos e eles se traduzem em atrasos na tomada de decisão de ações urgentes, avisam os cientistas. A China poderia liderar o mundo nesta pauta, mas coloca-se como país em desenvolvimento e espera um contrapeso industrializado, que não existe no momento. A União Europeia anda tímida. A Alemanha, o nome mais forte em sustentabilidade no mundo, está constrangida pela dependência ao carvão e o não cumprimento das próprias metas climáticas.

O presidente eleito Jair Bolsonaro decidiu não sediar a próxima CoP, alegando problemas de orçamento. É uma oportunidade perdida para a imagem e a economia do Brasil. Foi, no entanto, devidamente compreendida pelo presidente chileno Sebastián Piñera, e o Chile será o próximo anfitrião da rodada climática.

O Ministério do Meio Ambiente do novo governo, já se sabe, quase nasceu com defeito de origem. Depois de intenso debate se a pasta deveria ou não ser fundida à Agricultura, salvou-se da extinção, mas o argumento final parece ter vindo mais dos exportadores do agronegócio do que de preocupações centradas no tema ambiental. O titular da pasta foi o último do gabinete a ser indicado, sugerindo a dificuldade de se encontrar o nome certo para a orientação que o novo governo quer conferir ao MMA, de dar celeridade ao licenciamento ambiental e terminar com o que Bolsonaro chama de "festa de multas" do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, o Ibama.

Na quarta-feira, o futuro ministro do MMA Ricardo Salles foi condenado pela Justiça de São Paulo por improbidade administrativa e teve seus direitos políticos cassados. Reagiu dizendo que irá recorrer e afirmou sua autoridade indicando os presidentes do Ibama e do Instituto Chico Mendes da Conservação da Biodiversidade, o ICMBio. São sobressaltos antes mesmo de começar a operar. O Ministério do Meio Ambiente é essencial e suas decisões têm impactos dentro e fora do Brasil.

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