quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Reforma tributária, tão urgente quanto mudar a previdência?: Editorial | Valor Econômico

A cada 200 funcionários das empresas, 1 trabalha na área contábil no Brasil. Nos Estados Unidos, a proporção é 1 para mil e, na Europa, 1 para 500, segundo informações divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação. O Brasil é o país onde se gasta mais tempo para lidar com a burocracia tributária no mundo. De acordo com relatório divulgado em 2017 pelo Banco Mundial, as empresas gastam em média 1.958 horas por ano para cumprir todas as regras do Fisco. Segundo o IBPT, existiam na época no Brasil 63 tributos e 97 obrigações acessórias - conjunto de documentos, registros e declarações utilizadas para o cálculo dos tributos e que precisam ser enviados ao Fisco dentro de prazos pré-estabelecidos sob pena de multa.

Este é o cenário no qual ganha relevância a intenção governamental de reduzir e simplificar a carga tributária no país. A reivindicação do setor empresarial nesse sentido é muito antiga. Há décadas, qualquer consulta a executivos e empresários dos mais variados setores sobre o que poderia ajudar no crescimento do país traz como uma das prioridades uma reforma tributária que ajude tanto a baixar os custos como facilitar a burocracia hoje exigida para pagamento de impostos e tributos.

Em seu discurso no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na terça-feira, o presidente Jair Bolsonaro citou a reforma tributária como uma das prioridades do seu governo. E foram muitas as manifestações da equipe econômica nesse sentido.

Ontem, também em Davos, o ministro Paulo Guedes, da Economia, chegou a acenar com a possibilidade de baixar a carga tributária sobre as empresas de 34% para 15%, sem dar maiores detalhes. Para que isso possa, de fato acontecer, o governo terá que encontrar fórmulas para compensar a perda de receita que ao menos inicialmente deverá ocorrer com uma diminuição tão radical das alíquotas dos impostos cobrados das empresas. O próprio Guedes confirmou ontem a intenção de passar a tributar dividendos e juros sobre capital próprio, como destacou, aliás, a edição impressa do Valor de ontem.

O outro lado da questão, menos polêmica e que também poderia ter um efeito importante para as empresas em termos de redução de custos, é como facilitar a cobrança e o pagamento dos impostos, um projeto objeto de estudos da atual equipe econômica. Por enquanto, as informações sobre essa proposta são pouco detalhadas.

O secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, confirmou ao repórter Fabio Graner que a equipe econômica estuda aproveitar a proposta de simplificação do PIS deixada pela equipe do ex-secretário da Receita, Jorge Rachid, ampliando o escopo da medida também para a Cofins. Uma das metas dos 100 primeiros dias de governo seria exatamente finalizar esse projeto. Segundo Cintra, a meta é deixar uma proposta pronta nesse prazo, mas a decisão política sobre como e quando encaminhar a medida é outro capítulo. Ele inclusive retomou uma expressão muito usada pela equipe econômica anterior de que a reforma tributária é um processo, indicando um caminho mais gradualista de simplificação e melhoria do sistema de impostos e contribuições. Ainda assim, o secretário disse que a ideia de fazer uma reforma tributária ampla continua valendo.

A eventual mudança na legislação do PIS/Cofins tem como objetivo simplificar a sistemática de aproveitamento de créditos tributários gerados nas etapas anteriores das cadeias produtivas. Ao melhorar a legislação, busca-se reduzir o litígio entre as empresas e o Fisco e tornar mais racional o sistema, que hoje é repleto de exceções e acaba onerando ainda mais as companhias.

A grande inquietação do lado empresarial é com a calibragem desse novo PIS/Cofins, para que o novo sistema mantenha o mesmo nível de arrecadação. O setor de serviços, mesmo antes de ver a proposta, já tem se colocado contra porque considera muito difícil que as novas alíquotas não acabem aumentando a carga tributária das empresas do setor, que por não terem insumos de cadeia produtiva, como na indústria, não devem ter créditos tributários a abater.

Além disso, Cintra já havia adiantado ao Valor que trabalha para fechar nesses primeiros cem dias de governo um projeto de desoneração da folha de pagamentos, substituindo a contribuição previdenciária patronal de 20% sobre os salários por um tributo sobre faturamento das empresas ou sobre pagamentos, semelhante à antiga CPMF.

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