Diante de drama venezuelano, o Brasil deve observar seus princípios constitucionais
Há algum tempo a derrocada do chavismo deixou de constituir apenas um enfrentamento político restrito às fronteiras da Venezuela.
O apego insano do ditador Nicolás Maduro e de um círculo de generais ao poder, em meio ao esfacelamento dos recursos materiais do país, produziu uma crise humanitária de grandes proporções, com crescente repercussão global.
Um dos picos desse drama pode ocorrer neste sábado (23), com a tentativa de entrega de ajuda alimentícia e farmacêutica oferecida por EUA, Brasil e Colômbia ao movimento do líder oposicionista Juan Guaidó, de legitimidade reconhecida por 50 governos no mundo, incluindo Washington e Brasília.
Segundo o plano, representantes de Guaidó, que se pôs em marcha para a divisa com a Colômbia à altura de Cúcuta, cruzariam a fronteira, recolheriam os bens disponibilizados e retornariam à Venezuela para distribuí-los. Operação semelhante ocorreria também na faixa vizinha ao território brasileiro, em Pacaraima, no estado de Roraima.
Maduro, ainda no controle das Forças Armadas, movimenta-se para impedir a doação humanitária, sob o argumento de que se trata de disfarce para uma invasão estrangeira. Sua brutalidade produziu nesta sexta (22) as primeiras vítimas desse lamentável episódio.
Perto da divisa com o Brasil, indígenas que tentavam dificultar a chegada de tropas do ditador venezuelano foram alvejados pelos militares. Duas pessoas morreram baleadas e outras ficaram feridas.
Mesmo após a ordem de Maduro de fechar a passagem para o território de Roraima, o governo brasileiro decidiu manter a oferta como planejada, enfatizando seu objetivo estritamente humanitário.
Os parâmetros para a atuação brasileira nesse entrevero —em que os interesses dos Estados Unidos, ao lado de Juan Guaidó, chocam-se com os de Rússia e China, alinhados a Nicolás Maduro— precisam estar bastante claros.
O emprego de força militar para resolver questões políticas da Venezuela deve ser descartado em nome dos princípios da não intervenção e da autodeterminação dos povos, expressos no artigo 4º da Constituição de 1988.
A pressão contra a estúpida tirania chavista precisa restringir-se ao campo da diplomacia e do auxílio solidário à população venezuelana que padece com a falta de itens básicos de bem-estar, como é o caso agora.
Fossem outros os tempos, não seria preciso reforçar obviedades enraizadas no modo como a República brasileira se relaciona internacionalmente desde a fundação. Mas o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) comporta elementos exóticos, a flertar com modismos inconsequentes.
Mais que nunca, é preciso tirar as crianças da sala de decisões.
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