Decisão de conduzir inquérito sob sigilo no Supremo tende a acirrar tensão
Causou desconforto em toda parte a decisão anunciada na quinta (15) pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, deabrir investigação para examinar ameaças sofridas por integrantes da corte e seus familiares.
Não há dúvida de que o assunto merece atenção. Qualquer tentativa de intimidar os membros da mais alta corte de Justiça do país merece o repúdio de todos que reconhecem seu papel como guardiã das regras do jogo democrático.
Mas a forma de reação escolhida pelo tribunal parece contribuir mais para acirrar as tensões no ambiente político do que para barrar as ações dos interessados em acuar os magistrados.
Embora o caminho natural fosse enviar o caso ao Ministério Público e à Polícia Federal para que realizassem as apurações, Toffoli decidiu que o próprio STF presidirá a investigação e confiou a missão ao ministro Alexandre de Moraes.
A medida causa estranheza porque põe à frente do inquérito uma instituição que pode ser chamada a julgar o caso em algum momento, confundindo esses dois papéis.
Toffoli amparou sua decisão num dispositivo do regimento interno do Supremo que autoriza o presidente da corte a abrir inquérito para apurar infrações ocorridas “na sede ou dependência” do tribunal.
Conforme sua interpretação, os ministros representam o STF, e qualquer ofensa a um deles deve ser tratada como se tivesse sido dirigida à entidade ou proferida dentro do prédio.
O magistrado definiu genericamente o escopo do inquérito, sem indicar claramente a natureza das ameaças sofridas nem nomear suas vítimas, e determinou que a investigação seja conduzida sob sigilo.
Sabe-se que um dos seus objetivos é identificar os patrocinadores de uma rede de distribuição de notícias falsas na internet que estaria incitando a animosidade contra os ministros do tribunal, mas o segredo imposto ao inquérito só tem alimentado desconfianças.
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, acusou o STF de extrapolar suas atribuições. Procuradores na linha de frente da Lava Jato, críticos frequentes de ministros, viram uma ameaça à sua liberdade de expressão.
É como se todos os participantes do jogo se movessem para reafirmar prerrogativas e testar limites, em vez de trabalhar por uma convivência harmônica e produtiva.
Caberá ao Ministério Público examinar os resultados da investigação e processar os envolvidos, se surgirem evidências de crimes.
Dado que a iniciativa está em marcha, cumpre ao STF ao menos atuar com celeridade no inquérito e transparência nas conclusões, para minimizar os riscos de aprofundamento do conflito institucional.
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