- O Estado de S.Paulo
Relator fecha conta com PIS-Pasep e bancos. Mas Guedes acha que é pouco
Ninguém é inconsequente para menosprezar as projeções sobre o ganho fiscal a ser proporcionado pela reforma da Previdência. Afinal de contas, tanto cálculo e tanta negociação devem-se principalmente à necessidade de pelo menos reduzir o enorme rombo fiscal que ameaça engolir a economia do País. Mas a busca incessante do R$ 1 trilhão parece quase uma obsessão. É como se ficar abaixo desse número, mesmo que por pouco, seja um atestado do fracasso da reforma da Previdência. No relatório apresentado à Comissão Especial, o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) acrescentou duas propostas justamente para aumentar a arrecadação e, com isso, garantir um resultado pouco superior a R$ 1 trilhão – com esses reforços o número chega a R$ 1,13 trilhão e, sem eles, a exatos R$ 913,4 bilhões. E as duas propostas foram questionadas, lá e cá.
A primeira é desviar 28% da arrecadação do PIS-Pasep, originalmente direcionados ao BNDES, para a Previdência, – alternativa criticada por alguns analistas por embutir um risco de encolhimento das funções do BNDES, consideradas cruciais para tirar a economia do buraco. A segunda é elevar a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) dos bancos de 15% para 20% – atacada, por outros, por se tratar de um atalho tributário para não derrubar a marca do trilhão.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, esperou um dia para cravar sua posição sobre o relatório e na sexta-feira dirigiu as baterias contra o Congresso, provocando uma resposta dura do presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Para Guedes, os parlamentares cederam aos lobbies, especialmente de servidores públicos, e as concessões reduziram o ganho fiscal para R$ 860 bilhões. A diferença para os números apontados no relatório corresponderia a aumento de impostos, que a seu ver não deveria ser objeto de mudanças na Previdência. Com isso, simplesmente foi abortada a Nova Previdência. Guedes havia dito várias vezes, inclusive em seus encontros com parlamentares, que um resultado abaixo de R$ 1 trilhão tornaria sem sentido pensar em capitalização.
Para falar a verdade, o relator da reforma moveu-se num terreno bastante movediço, tentando equilibrar a preservação das bases da reforma preparada pelo Planalto com a eliminação daqueles pontos que poderiam implodir suas chances de aprovação. E sem “desidratar” – a palavra do momento – a proposta, com uma redução muito acentuada dos ganhos fiscais. Tudo isso sem contar com uma articulação política eficiente da parte do Planalto. Maia foi mais fundo, ao comparar o governo Bolsonaro com uma “usina de crises” – que logo no dia seguinte se movimentou mais uma vez, com a demissão intempestiva do presidente do BNDES, Joaquim Levy.
Agora, portanto, começa o trabalho para que a proposta que saiu da Comissão Especial não seja desfigurada. Seja qual for o número do ganho fiscal nela implícito: dos R$ 860 bilhões calculados por Guedes ao R$ 1,13 trilhão do relator, considerando-se as medidas para aumento de receita. E, mesmo considerando-se que foram retirados do texto os itens mais controvertidos, como a capitalização e a inclusão de Estados e municípios, esse trabalho promete ser penoso. A turma do Centrão, por exemplo, já se prepara para brigar por novas mudanças no regime de transição e nas regras de cálculo das aposentadorias. Se vingarem, essas alterações provocarão um corte de mais R$ 150 bilhões nas projeções de ganho fiscal. Há dúvidas ainda sobre a tentativa de retomar, no plenário, a extensão das novas regras a Estados e municípios e sobre a manutenção do cronograma de votações.
Que a reforma vai passar, parece que é consenso. As oposições fazem seu papel, tentando tirar mais alguns “pedaços”do texto original, mas reconhecem que, no final das contas, a reforma sai. Os aliados, é óbvio, estão mais confiantes, mas sentem-se incomodados com os ataques de irritação de Guedes, que parece confundir negociação com rendição. Trata-se de ser realista. O melhor a fazer é aprovar com rapidez o texto que resultar das negociações e administrar as contas públicas dentro dessa moldura – com a expectativa de que, dentro de um prazo não tão longo, será necessário batalhar por uma nova reforma. Pelo que se viu até agora no debate da Previdência, as indicações são de que o governo Bolsonaro tem o aval para uma rodada de reformas constitucionais – aliás, ganhou apoio dos mercados e dos setores empresariais justamente para isso–, mas não para uma mudança radical do Estado brasileiro, como parecia ser sua pretensão.
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