O ministro da Economia, Paulo Guedes, não ficou satisfeito com o parecer do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) sobre a reforma da Previdência Social. Em entrevista na sexta-feira, Guedes usou palavras duras para criticar as concessões feitas pelo relator, principalmente a mudança na regra de transição para os servidores públicos federais.
Para ter direito à aposentadoria com a remuneração integral do cargo que ocupa e à paridade com os funcionários da ativa, os servidores que ingressaram no serviço público antes de 2003 teriam que trabalhar até 65 anos, se homem, e 62 anos, se mulher, de acordo com a proposta original enviada ao Congresso por Guedes.
O relator alterou a regra. O servidor poderá se aposentar aos 60 anos e com 35 anos de contribuição, se homem, e 57 anos e 30 anos de contribuição, se mulher. Eles terão, também, que pagar um pedágio de 100% sobre o tempo que falta para completar o tempo de contribuição. Se para uma mulher servidora, por exemplo, faltam apenas dois anos para atingir o tempo de 30 anos, ela terá que trabalhar mais quatro anos.
Guedes disse que a mudança que beneficia os servidores, que já são favorecidos em suas aposentadorias, custará R$ 30 bilhões aos cofres públicos em 10 anos. Para não ficar feio, segundo ele, o relator estendeu a nova regra de transição aos segurados do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), mais conhecido como INSS. Com isso, a alteração feita por Moreira custará R$ 100 bilhões em dez anos, de acordo com o ministro.
Com o parecer, a economia a ser obtida com a reforma será de R$ 860 bilhões em 10 anos pois, segundo o ministro, é preciso subtrair do cálculo dos cortes a receita com a elevação da CSLL sobre o lucro dos bancos proposta por Moreira e projetada em R$ 50 bilhões. "Se sair só R$ 860 bilhões de cortes, o relator está dizendo o seguinte: abortamos a Nova Previdência e gostamos mesmo da velha Previdência. Cedemos ao lobby dos servidores públicos, que eram os privilegiados", disse o ministro.
Também usando palavras duras, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), rebateu Guedes, dizendo que o ministro está fabricando "crise desnecessária" e que vai blindar o Congresso contra "as crises diárias provocadas pelo governo". Maia fez uma provocação: "Quero saber por que o ministro Guedes assinou uma regra de transição mais flexível no projeto de reforma para os militares", questionou. Segundo ele, a regra criada pelo relator Moreira é cinco vezes mais rigorosa do que aquela estabelecida para os militares.
As palavras de Guedes, embora ditas em um tom exaltado para quem está em meio a difícil negociação com o Congresso, refletem a frustração do ministro com a retirada do regime previdenciário de capitalização da reforma, que ele chamou de "Nova Previdência". Ele tem plena consciência de que o atual sistema de repartição simples está falido e não garantirá as aposentadorias das gerações futuras. Sem a capitalização, daqui a quatro ou cinco anos o governo terá que propor uma nova reforma da Previdência, pois o problema não está resolvido.
As dificuldades para aprovar mudanças previdenciárias ocorrem em todos os países do mundo. No Brasil, nos últimos anos, os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva alteraram as regras da aposentadoria, e Dilma Rousseff regulamentou o fundo de previdência complementar dos servidores. Ou seja, mais de 20 anos se passaram e nenhum deles conseguiu resolver o problema. Mas, no período, ocorreram alguns avanços.
A proposta do relator tem vários defeitos, mas representa um avanço considerável. Para se ter ideia, a economia de R$ 860 bilhões em dez anos prevista é muito superior ao ganho fiscal de R$ 604 bilhões que a Câmara aceitou conceder ao ex-presidente Michel Temer, quando analisou e alterou a PEC 287/2016.
Guedes tem razão ao criticar a decisão do Congresso de retirar os servidores estaduais e municípios do alcance da reforma. Boa parte dos Estados está em situação falimentar, mas os deputados não querem passar pelo desgaste de aprovar a extensão da reforma para as suas bases eleitorais. O presidente Bolsonaro, em conversa com os jornalistas na sexta-feira, demonstrou uma postura madura ao tratar do assunto. "Se forçar a barra podemos não aprovar, então é natural ceder", disse.
Neste momento, o maior risco é transformar uma vitória importante em derrota, com o acirramento dos ânimos entre governo e o Congresso.
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