- O Estado de S.Paulo
Menos afoito do que quando debutou na política, como prefeito, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), constrói agora com método e vagar sua candidatura à Presidência da República. No desgaste do governo federal, ocupa espaços e atrai aliados; conscientemente, o discurso enérgico e o antagonismo com o PT o colocam na disputa por um campo político hoje tomado por Jair Bolsonaro. O embate entre ambos está contratado.
Contudo, há dois poréns: após apelos e juras feitos a Bolsonaro no segundo turno da eleição estadual, Doria será bem recebido pelo eleitorado que, na disputa em 2018, se alinhou com o atual presidente? E, ao final, “rachar” a direita não compreenderia somar zero com Bolsonaro e viabilizar o centro e a esquerda?
O primeiro ponto, o tempo dirá: dependerá da habilidade de Doria, do desempenho do governo e do desgaste de Bolsonaro, em particular.
Já aproximação com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e seu partido, o DEM, visa equacionar a segunda questão: uma aliança com esse desenho lhe daria amplitude da direita para o centro, bem além do jardim bolsonarista. Nesta hipótese, Doria confinaria o presidente no gueto do extremismo, solapando o solo sob seus pés no terreno do antipetismo e da direita moderada. Com a esquerda órfã, desorganizada e dividida, com efeito, suas chances aumentariam. O cálculo é racional; faz sentido.
Mas, cravar apostas a tanto tempo do pleito presidencial, em 2022, faz pouco sentido. Setores de centro, cujo um dos nomes é o do empresário e apresentador Luciano Huck, pelejam por se organizar e obter autonomia em relação a Doria – no próprio PSDB, há lideranças que não o digerem.
Assim, até 2022 um novo centro ainda pode se aglutinar, ganhar embalo e, então, também cortejar e incorporar Rodrigo Maia e o DEM.
Articulador de maioria no Congresso, fiador de reformas e interlocutor com o mercado, o presidente da Câmara dos Deputados ganhou estatura política e hoje se constitui num campo em disputa. É claro que Maia percebe isto e, à parte das declarações de ontem, sabe que na política o tempo é mesmo o senhor da razão.
Há pouca nitidez em relação ao futuro, mas o certo é que, no volátil ambiente político, compromissos e juras de amor feitos hoje valem pouco amanhã.
*Carlos Melo é cientista político e professor do Insper
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