- O Globo
Risco externo e dificuldades internas entram na conta do mercado e visão para o PIB está mais negativa do que no início deste ano
A análise que os economistas de bancos fazem hoje é muito menos positiva do que faziam no início do ano. Antes, as perspectivas eram de retomada, de aprovação de reformas e de recuperação via ajuste fiscal. Um exemplo desse novo tom ocorreu na entrevista de ontem do departamento de pesquisa econômica do Itaú Unibanco. O economista-chefe, Mário Mesquita, não vê dados consistentes de recuperação acurto prazo, prevê a desaceleração da economia global, não tem no cenário a aprovação da reforma tributária e teme os reflexos da política ambiental do governo.
Pelas contas do banco, não haverá recessão técnica, porque o número do segundo trimestre será positivo em 0,5%. Recessão é quando há dois trimestres seguidos de queda.
Houve queda no primeiro. Alguém pode considerar esse número de 0,5% até alto porque os dados setoriais foram todos negativos no trimestre. Eles explicam que a produção industrial foi puxada par abaixo pela indústria extrativa mineral, como reflexo ainda da tragédia de Brumadinho. Mas a indústria de transformação e os serviços vão levar o número do trimestre a um dado positivo.
Há outros bancos e consultorias com projeções mais baixas para o segundo trimestre. O índice do IBGE sai dia 29. De todo modo, no terceiro trimestre, há novo risco de um número negativo. Se isso acontecer, serão dois trimestres, não consecutivos, de encolhimento no ano.
— A economia brasileira continua girando na casa de 1% anualizado. Mesmo que suba 0,5% no segundo trimestre, virá logo em seguida um PIB fraco no terceiro trimestre. Há uma volatilidade grande da recuperação, ela não é firme.
A queda do desemprego será lenta. Seno final de 2018, a PNAD marcava 12,3%, no final deste ano deve estar em 11,8%, e no ano que vem em 11,6% —diz Mário Mesquita, ex-diretor do Banco Central.
Se a reforma tributária for aprovada, não será ampla, acredita o economista. No máximo, um projeto tímido. Na verdade, neste momento há, segundo ele ,“uma inflação de projetos ”.
O Congresso tem duas propostas e são apenas de fusão de impostos sobre consumo, com maior ou menor rapidez na transição. A proposta do governo não foi apresentada ainda e a convergência será difícil.
O assunto normalmente mobiliza estados e municípios e haverá eleições no ano que vem. A “janela” para aprovação de uma reforma sobre esse tema vai até maio.
Mesmo que fosse aprovada, não teria efeito no ano que vem. E só depois de feitas as contas é que se saberia se houve ou não aumento de carga tributária.
Em relação ao mundo, os bancos estão somando os vários sinais ruins vindos de países diferentes. Mário Mesquita acha que o mais provável é um cenário de desaceleração, mas pode haver uma “recessão comercial”. De fato, o encolhimento do comércio é o mais provável se continuarem os conflitos entre China e Estados Unidos:
— China e Alemanha são duas economias muito interligadas pelo comércio. A desaceleração da China atinge a Alemanha e consequentemente o resto da Europa. Ainda há a ameaça de um Brexit forçado na Inglaterra. A sondagem da indústria na China está abaixo de 50 pontos, o que indica contração.
Países como o Brasil não vão poder contar com o mundo para sair da recessão ou acelerar o crescimento. A Argentina deve ter retração de 1,4% este ano e o maior impacto negativo será na cadeia automotiva brasileira.
Mas o efeito maior sobre o Brasil seria de uma desaceleração da China. Aqui na região, o crescimento do México está caindo de 2% para 0,6%. Chile, Peru e Colômbia vão crescer, mas num ritmo menor.
A previsão do Itaú é de que este ano o Brasil cresce 0,8%. Essa é a mediana das projeções. No ano que vem a situação melhora, vai para 1,7%. O impacto positivo no PIB das medidas de liberação do FGTS pode ser anulado pela piora do quadro internacional e da Argentina, na visão de Mesquita.
Antes, a questão ambiental era avaliada no mercado financeiro apenas nos fundos dedicados. De forma lateral. Agora se ouve mais e mais uma análise que joga a questão no centro do dilema econômico brasileiro.
— As principais economias trabalham com gestão ambiental. E isso pode virar barreiras comerciais contra o Brasil, servir de pretexto, mesmo que se tenha acordo como o da União Europeia. O acordo precisará ser aprovado por 27 parlamentos.
Não dá para o país se desviar das normais globais, ainda mais se o objetivo é se inserir mais nas cadeias globais —alerta Mário Mesquita.
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