- Folha de S. Paulo
Falta de dinheiro no governo vai continuar a ser motivo de disputa no Brasil do ano que vem
O governo tem um teto de despesas para cumprir, mas tem gasto menos do que permite esse limite constitucional aprovado em 2016 pelo Congresso, por sugestão de Michel Temer. No entanto, como se sabe, está à beira de faltar dinheiro para pagar bolsas de pesquisa científica, universidades ou o serviço de computação da Receita; o dinheiro para investir em obras cai, tendendo a zero.
Note-se logo que não se trata de decisão de livre arbítrio deste governo. A situação vai melhorar em 2020? Por vários motivos, provavelmente quase nada.
O governo federal gasta menos que o limite permitido porque não arrecada o suficiente nem para chegar ao limite do teto de gastos(porque, de resto, tem outra meta, de limitar o déficit primário), como sabe quem acompanha o noticiário do assunto.
Neste ano, por ora, a previsão é de que o governo gaste pelo menos uns R$ 36 bilhões a menos do que o limite, por falta de receita. Trata-se do valor de um ano de Bolsa Família inteiro ou de dois terços de toda a despesa federal em obras, investimentos, nos últimos 12 meses.
Caso o país crescesse um tico mais em 2020 (e assim a arrecadação de impostos) e/ou o governo possa contar com o dinheiro extraordinário da venda de direitos de exploração de petróleo (“cessão onerosa”), haveria como gastar mais no ano que vem, um meio de diminuir a asfixia. Isto é, haveria como aumentar as despesas além daquelas que são obrigatórias (benefícios previdenciários em geral, salários, seguro-desemprego, mínimos de saúde e educação etc.). Voltar a gastar um tico mais em ciência, por exemplo.
Só que não.
Em 2020, as despesas obrigatórias devem crescer a ponto de comer quase toda essa “folga” fiscal, impedindo o aumento de outros gastos. Então, o teto será o problema, com o que será difícil diminuir de modo relevante essa asfixia de despesas que vemos agora. O governo deve apresentar essas contas detalhadas até o final do mês, quando apresenta o projeto de Orçamento de 2020. Mas, grosso modo, o problema é esse.
A fim de evitar colapsos, as providências são política ou economicamente difíceis. Por exemplo, não aumentar o valor real do salário mínimo (já proposto pelo governo). O ministro Paulo Guedes (Economia) discute com o Congresso a hipótese de acabar com gastos mínimos obrigatórios em itens como saúde e educação ou reajustar tal despesa por menos do que a inflação. São projetos praticamente inviáveis até o final do ano.
Guedes é, pelo menos até hoje, contra a ideia de mexer no teto. Quer, repita-se, que o Congresso decida o que fazer com os recursos limitados (flexibilizando todos os gastos, como aqueles em saúde e educação). Obviamente, não resolve em nada a tensão política, apenas coloca mais gente na briga pelo pirão escasso.
Qualquer ideia de reduzir a carga de impostos torna-se ainda mais demente nesta situação (mesmo mexer com eles, como no IR, ideia fixa de Jair Bolsonaro, é um risco alto).
A fim de evitar o pior neste ano, paralisia crítica, o governo vai fazer umas gambiarras, adiantar receitas e alguma outra mágica e milagre. Enfim, a receita de impostos reage um tico. Dada a situação crítica, é um troco que apenas evita o fechamento, de fato, de partes do governo. Seria um regime de fome, de mera subsistência, se tanto, que continuaria no ano que vem. Também por causa da escassez vai continuar amargo o conflito político —ou daí para baixo.
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