- O Globo
O Brasil chega na COP-25 numa situação muito ruim, abandonando o protagonismo que sempre teve e praticamente fora do Acordo de Paris, pelo menos longe dos compromissos que o país mesmo havia assumido. É o que pensam o pesquisador Paulo Barreto, do Imazon, e o cientista Ricardo Galvão, ex-diretor do Inpe. A vasta experiência do país em monitoramento e combate ao desmatamento poderia nos levar a ser exemplo nessas reuniões, mas o atual governo optou pelo isolamento e o retrocesso e isso fica claro na mais importante reunião climática anual.
O Brasil sediaria a Conferência das Partes da Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas. Recusou a escolha e passou o ano inteiro produzindo um volume extravagante de más notícias na área ambiental. Mesmo agora, durante a reunião, elas não param. O presidente Bolsonaro anunciou a intenção de liberar a exportação de madeira in natura e prepara para terça-feira o lançamento de uma MP da regularização fundiária que tinha, em uma primeira versão, a ideia de que bastava a autodeclaração para se regularizar a terra. Um convite escancarado à grilagem. Mesmo sem isso, a MP será mais flexível do que a legislação atual.
— A regra que já existe é muito leniente com quem invade a terra pública. Dá um prazo para a pessoa regularizar e ainda dá um desconto. Imagina se piratas se instalassem em áreas do pré-sal e o governo dissesse: já que você ocupou, vou vendê-la para você com desconto. Isso não aconteceria porque a Marinha expulsaria os piratas. Na Amazônia estamos fazendo o contrário, estamos dando desconto para quem ocupou ilegalmente —disse Paulo Barreto.
E agora será feita outra MP com ainda mais vantagens. Será um novo estímulo ao desmatamento. Entrevistei Paulo Barreto e Ricardo Galvão na Globonews. Galvão lamentou que o Brasil esteja na situação em que está:
— O Brasil sempre teve protagonismo na área ambiental, desde a Rio-92. O trabalho do professor José Goldemberg é reconhecido no mundo inteiro. O monitoramento do desmatamento da Amazônia é considerado a melhor série temporal de controle de desmatamento em florestas tropicais. Tudo isso está sendo jogado na lata de lixo. Inclusive essa ideia de exportação de madeira in natura ea de legalizar plantação de cana-de-açúcar no Pantanal e na Amazônia. Vários cientistas já mostraram que isso está errado.
No gráfico com o histórico do desmatamento, os dois mostraram que políticas públicas podem estimular ou conter a destruição da floresta. Os picos de desmate tanto do governo Fernando Henrique, quanto no governo Lula, foram revertidos com repressão ao crime. FH elevou o tamanho da reserva legal e aprovou a lei de crimes ambientais. Lula, através da ministra Marina Silva, comandou uma série de ações de ataque ao crime, e encomendou o serviço de alerta de desmatamento, o Deter, que foi um auxiliar importante. O desmatamento caiu 83% de 2004 a 2012. No atual governo, o alerta foi desacreditado e o diretor do Inpe, exonerado. No final, confirmou-se o aumento grande de desmatamento. E infelizmente isso deve continuar.
—O que nós vimos, pelos dados do Inpe, é que o desmatamento continua muito forte —diz Galvão.
—Você trabalha cobrindo economia. Nela, tudo depende das expectativas. É a mesma coisa na Amazônia. A expectativa é de que podem cometer crime que não serão punidos —diz Barreto.
Em um dos gráficos levados ao programa, Paulo Barreto mostrou que de 2005 até 2013 houve uma queda forte de desmatamento, mas ao mesmo tempo um aumento do valor da produção agrícola. Ou seja, o PIB agropecuário da Amazônia cresceu mesmo com o desmatamento em queda. Isso derruba a tese do atual governo de que a preservação impede o desenvolvimento econômico. Os números provam o oposto. Mas este governo está em conflito com os dados e os fatos.
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