- O Estado de S.Paulo
Não dá para ficar achando que a batalha está vencida com um crescimento de 0,6% do PIB
Na contramão do crescimento do PIB, anunciado nesta semana, a produtividade da economia brasileira apresentou mais um recuo no terceiro trimestre. O indicador trimestral de produtividade do trabalho (por hora trabalhada), calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), mostrou uma queda de 0,7% em relação ao mesmo período de 2018. É a terceira redução do ano, com tendência de continuar nessa trajetória negativa nos próximos meses. Serviços é o setor mais afetado.
O dado assusta porque era de se esperar uma melhora da produtividade na esteira da retomada da atividade econômica. Pelo menos, esse é o padrão aguardado em qualquer País, principalmente depois de um período de recessão em que as empresas fazem ajustes, cortam custos, melhoram a gestão e deveriam estar investindo.
Não é isso que está acontecendo no Brasil. É o que mostra o Observatório da Produtividade, lançado nos últimos dias pelo Ibre.
O fato é que a produtividade não está reagindo – pelo contrário, continua caindo. O cenário é um indicador de que a recuperação que a economia vive neste momento talvez não seja tão sustentável quanto parece.
“É um sinal de alerta”, avisa o pesquisador do Ibre, Fernando Veloso, em conversa com a coluna. Especialista em produtividade, Veloso avalia que o crescimento atual é vulnerável – ou seja, com sustentabilidade num nível relativamente baixo.
Veloso diz que, se a produtividade não melhorar, o Brasil continuará “por muitos e muitos anos” com uma trajetória de crescimento muito baixa – entre 1%, 1,5%, no máximo 2%.
A produtividade em queda deixa também a economia mais frágil diante do risco de uma mudança no cenário externo, piora da guerra comercial e do déficit em transações correntes do País.
Em outras palavras, enquanto a produtividade não melhorar, a economia não vai crescer mais rápido e de forma sustentável.
É claro que, em um processo de recuperação econômica cíclica, quando existe muita capacidade ociosa e o desemprego é muito elevado, é possível crescer em torno de 2%, 2,5% por dois, três anos. Mas certamente será muito difícil sustentar um crescimento mais elevado durante um período mais longo.
Chama a atenção o fato de que o conceito de produtividade parece muito distante das pessoas, abstrato. Mas não é. Cada vez mais o brasileiro vai sentir no dia a dia seus efeitos.
Durante muitos anos, a produtividade cresceu pouco no Brasil. Desde os anos 80, ela cresce cerca de 0,4% ao ano, mas a renda per capita cresceu mais de 1% pelo bônus demográfico – a população em idade para trabalhar estava crescendo muito mais rapidamente. O bônus terminou no ano passado e passou a ser um ônus, com muito menos incorporação de pessoas no mercado de trabalho. A única forma do padrão de vida melhorar é o trabalhador ficar mais produtivo.
O pesquisador do Ibre prevê que, daqui para frente, as pessoas vão sentir rapidamente a estagnação da produtividade: ela se refletirá em salários que não crescem. Veloso lembra que a geração de empregos está em um patamar vigoroso, não muito diferente do período anterior à recessão.
O problema é que o emprego, antes da recessão, era predominantemente formal. Agora, a composição é muito diferente e predominantemente informal.
As empresas formais têm uma produtividade média quatro vezes superior à das informais. Usam mais máquinas, tecnologia e têm trabalhadores com mais escolaridade.
Tão comemorada pela equipe econômica do governo Jair Bolsonaro, a retomada não está sendo suficientemente vigorosa para melhorar a produtividade. Ela já estava estagnada em 2018 e, em 2019, caiu. Não é difícil imaginar que, se ela estivesse crescendo mais rapidamente, o PIB certamente estaria subindo mais.
Esse problema esteve mascarado por décadas. Não está mais. O governo começou com um discurso de medidas focadas para aumentar a produtividade, mas os avanços ainda são lentos.
Botar as reformas em compasso de espera, como sinalizou o presidente Bolsonaro, é um equívoco e vai retardar o processo de melhoria da produtividade. Elas podem avançar, sim, com foco na redução de desigualdade – uma demanda que cresce na sociedade.
A primeira delas, sem dúvida, é a reforma tributária, que vai virar o ano sem avanços. Na direção oposta, a concessão de incentivos e privilégios continua dando as cartas em Brasília e no Congresso. Não dá para ficar achando que a batalha está vencida com um crescimento de 0,6% do PIB.
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