- Folha de S. Paulo
Donos do dinheiro grosso indicam que bateu um medo dos efeitos da epidemia
Agora está evidente que o humor dos donos do dinheiro do mundo mudou por causa da doença do novo coronavírus, a Covid-19, esse nome de ficção científica. De dez dias para cá, as taxas de juros no mercado americano embicaram de vez para baixo, raspando em mínimas históricas.
E daí?
Taxas americanas em baixa indicam que a finança teme a extensão do contágio econômico, da China para outras partes do mundo, derrubando União Europeia e Japão. Acredita que é razoável esperar uma baixa da taxa básica de juros americana. Enfim, quando não se sabe que bicho vai dar é melhor traduzir sua riqueza em dólares.
A moeda americana sobe em relação a todas outras importantes. A perspectiva de crescimento mundial menor e a alta do dólar tendem a derrubar o preço das commodities, de mercadorias muito importantes nas vendas do Brasil para o exterior (grãos, minério de ferro, petróleo), afora outros danos.
Esses humores dos donos do dinheiro grosso podem mudar em dias, claro, a depender de notícias da expansão da Covid-19, como uma redução do número de novos casos da doença, o que não é garantia de nada, porém. Ainda que a China volte a funcionar, o futuro do vírus ainda é incerto e a rapidez da recuperação chinesa também.
Por ora, indicadores indiretos e precários sugerem que a economia chinesa anda no ritmo da parada do maior feriado deles, o Ano Novo, que acabou de passar. Desde o final de janeiro, estima-se que o número de voos no país caiu mais de 80%. Considerada a primeira metade de fevereiro, a venda de carros diminuiu mais de 90% em relação ao ano passado.
Por causa do desconhecimento do destino do novo coronavírus, não se sabe se a China poderá, sem mais e imediatamente, levantar barreiras e voltar a produzir como antes da epidemia. Ainda que o ritmo de expansão da doença se estabilize a partir do final do mês, os chineses dizem por aí que a doença estaria cercada e controlada apenas lá por abril, com a ajuda do tempo mais quente da primavera. Mas nem isso se sabe ao certo: se o novo coronavírus vai se comportar como o de outras infecções respiratórias.
A recuperação chinesa será em “V” (queda e recuperação rápidas) ou em “U” (com um período mais prolongado de estagnação no meio)? Seja como for, não são boas notícias para o Brasil, em lerdíssima e frágil convalescença.
Das moedas mais importantes do mundo, o real é a que mais se desvalorizou no ano, antes e depois das notícias da Covid-19. Em parte, era o esperado: a taxa de juros brasileira caiu, o crescimento do PIB é quase nulo, o real é um veículo rotineiro de especulação. Em outra parte, sabe-se lá.
A dúvida sobre até um crescimento medíocre de 2% não ajuda. A incerteza sobre a aprovação de alguma reforma importante também não, decerto não na visão dos donos do dinheiro. Nas expectativas, nenhuma mudança teria o impacto da reforma da Previdência.
Seria preciso aprovar algo difícil e crucial como o arrochão dos gastos públicos e dos servidores (PEC Emergencial) e mais um pacote de mudanças de “aumento da competitividade” e de facilitação do investimento privado.
A baderna promovida pelos Bolsonaro ameaça até esse programa da elite econômica, que conta com a boa vontade do parlamentarismo branco, elite que, vejam só, começa a se irritar com o capitão da extrema direita.
A familiocracia e sua guarda vão se importar? Por ora, chancelam protestos de rua contra o Congresso. Ocioso lembrar outras atrocidades.
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