Documentário sobre Libelus, organização de estudantes contra a ditadura, ajuda a refletir sobre elite brasileira
Na
quarta-feira, estará no ar o documentário “Liberdade e luta — Abaixo a
ditadura”, do cineasta Diógenes Muniz. Trata da Libelu, organização política de
estudantes surgida em 1976 e extinta em 1985. Os libelus podem ter sido 800,
mas fizeram um barulho danado. Iam para a rua gritando “abaixo a ditadura”
(coisa que raramente acontecia desde 1968). Afastavam-se do MDB e da velha
esquerda. Eram radicais com senso de humor, gostavam mais de rock do que de
samba, mais de Caetano Veloso do que de Chico Buarque. O Serviço Nacional de
Informações dizia que eram uma “dissenção” do Partido Comunista e da “linha
trotsquista”. Os libelus eram jovens, num tempo em que o filósofo francês André
Glucksman dizia que “Brejnev é Pinochet”. Um governava a União Soviética; o outro,
o Chile.
No
documentário de Diógenes Muniz há uma doce viagem à alma dos jovens dos anos
70, na voz de 20 sexagenários lembrando-se da aurora de suas vidas. Só eles
falam, um de cada vez. Em todos os idiomas há o provérbio segundo o qual quem
não é de esquerda aos 20 anos não tem coração, e quem continua de esquerda
depois dos 50 não tem cérebro. Dos 20 libelus entrevistados, cada um tomou seu
caminho e foram para todos os lados. Poucos ficaram mais ou menos no mesmo
lugar. Aí está o valor dos depoimentos e do documentário.
As entrevistas
com os libelus foram gravadas no cenário da Universidade de São Paulo. Só
“Pablo”, um militante que estudava Medicina em Ribeirão Preto falou na sala de
sua casa. Isso não ocorreu por deferência ao ex-ministro da Fazenda de Lula e
ex-chefe da Casa Civil de Dilma Rousseff, mas porque Antonio Palocci está em
prisão domiciliar. Seu depoimento fecha o ciclo de um pedaço da amostra. Quando
foi perguntado se ainda se considerava um homem de esquerda, Palocci não
vacilou: “Claro”.
Não se
mostrou arrependido de ter dançado “conforme a música”, mas ponderou: “Os que
não se meteram em caixa dois não se elegeram... Talvez eu fosse uma pessoa
melhor...”
A
estudantada é a vanguarda da elite brasileira. Vendo-se o documentário de
Diógenes Muniz, pode-se refletir sobre os jovens, o que é fácil. Desde 1786,
difícil é refletir sobre a elite. Até nisso os libelus ajudam.
Serviço: “Liberdade e luta” faz parte
do festival “É tudo verdade” e para vê-lo bastará entrar no site às 21h. É
grátis, mas é preciso fazer um cadastro.
Mito histórico
Outro dia o
vice-presidente Hamilton Mourão lembrou mais uma vez que os Estados Unidos
foram o primeiro país a reconhecer independência do Brasil.
Mourão tem
gosto pela História, e faltam menos de dois anos para o bicentenário do Grito
do Ipiranga. Talvez tenha chegado a hora de se esclarecer esse mito. Em 2017,
num estudo publicado pelos Cadernos do Centro de História e Documentação
Diplomática, Rodrigo Wiese Randig mostrou que o primeiro país a reconhecer a
independência do Brasil foi a Argentina, que à época atendia pelo nome de
Províncias Unidas do Rio da Prata.
A Argentina
reconheceu o Império do Brasil no dia 25 de junho de 1823, e em agosto seu
representante apresentou suas credenciais ao chanceler brasileiro. Os Estados
Unidos só reconheceram o Brasil um ano depois, e o embaixador José Silvestre
Rebelo entregou suas credenciais ao presidente James Monroe no dia 26 de maio
de 1824.
O governo
tem feito pouco, quase nada, para comemorar o Bicentenário da Independência.
Arrisca atolar numa patriotada estéril, como aconteceu em 1972, no
Sesquicentenário, quando a ditadura passeou os ossos de D. Pedro I pelo país
até colocá-los numa cripta nos jardins do Museu do Ipiranga. Anos depois, ela
virou mictório.
Dois meses
depois da entrega de credenciais pelo embaixador brasileiro a James Monroe, D.
Pedro I recebeu o embaixador do reino africano do Benin, na Quinta da Boa
Vista. O Benin estava mais para entreposto de escravizados do que para reino.
A unanimidade esperta
Nelson
Rodrigues já ensinou que toda unanimidade é burra.
A Assembleia
Legislativa do Rio de Janeiro decidiu por unanimidade avançar com o processo de
impedimento do governador Wilson Witzel. A unanimidade pode também ser esperta,
muito esperta.
Trapaça
Apareceu
mais um juiz terrivelmente evangélico na fila do guichê para a indicação do
próximo ministro do Supremo Tribunal Federal. É o juiz William Douglas dos
Santos.
Numa trapaça
da História, William Douglas (1898-1980) foi um desassombrado juiz da Corte
Suprema dos Estados Unidos. Comprou todas as brigas em defesa da liberdade e
ainda por cima defendia o meio ambiente numa época em que pouco se falava
disso. Certa vez, encarou uma trilha de três mil quilômetros.
Aguentou-se
na Corte tendo se metido com um dono de cassinos. Pediu para sair quando,
depois de um acidente vascular, estava trocando as bolas.
Aviso
A
popularidade do capitão, o surgimento de Celso Russomanno nas pesquisas paulistanas
e a promessa de Paulo Guedes de elevar a isenção do Imposto de Renda da Pessoa
Física, beneficiando 15 milhões de pessoas, deveriam levar a oposição a pensar
na vida. O que mais se ouve é que esse mar de rosas acabará quando o auxílio
emergencial for suspenso. Pode ser.
Não custa
repetir uma lição do mestre Marco Maciel, quando um marqueteiro lhe disse que,
segundo as pesquisas, o candidato adversário estava em queda e o dele, em
ascensão:
“Ainda
assim, o senhor acha que a intersecção dessas duas retas ocorrerá antes ou
depois da eleição?”
Sede ao pote
As guildas
dos procuradores precisam controlar a sede da corporação.
Numa festa
catarinense, os doutores conseguiram uma equiparação que colocou a prêmio os
mandatos do governador Carlos Moisés e de sua vice.
A
Advocacia-Geral da União promoveu 606 doutores com um golpe de caneta e foi
obrigada a esquecer o assunto diante da grita.
Eremildo, o idiota
Até um
idiota como Eremildo pode entender que o Ministério da Educação nada tem a ver
com o reinício das aulas.
Néscio, ele não sabe explicar se o doutor Milton Ribeiro também acha que seu ministério não tem nada a ver com o escalafobético edital do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação que, há mais de um ano, tentou torrar R$ 3 bilhões num edital viciado para a compra de equipamentos eletrônicos.
A Controladoria-Geral da União travou o jabuti, mas até hoje não se sabe de onde ele saiu.
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