- O Globo
A conformação do Supremo Tribunal Federal (STF) e da Corte Suprema dos Estados Unidos está sendo alterada no mesmo momento histórico de viés direitista nos dois países. Nos Estados Unidos, a morte da juíza Ruth Bader Ginsburg, um ícone dos progressistas americanos, pode dar lugar a um plenário majoritariamente conservador, marcando por décadas o entendimento da Suprema Corte.
No Brasil, a aposentadoria antecipada do ministro Celso de Mello, um
exemplo de coerência e defesa da democracia, permitirá que o presidente
Bolsonaro nomeie um ministro claramente conservador, embora não reverta a
tendência progressista da Corte brasileira.
A tentativa de controlar as decisões da última instância do Judiciário provoca
crise política nos Estados Unidos, pois a nomeação da substituta de RBG deveria
ficar para o próximo presidente a ser eleito dentro de 38 dias. Quando o
ministro Antonin Scalia morreu, em fevereiro de 2016, o Senado americano,
dominado pelos Republicanos como agora, não permitiu que o presidente Obama
nomeasse o sucessor, sob alegação de que estava em seu último ano de mandato.
Hoje, os mesmos Republicanos defendem a nomeação por Trump do novo ministro da
Suprema Corte.
O golpe parlamentar dos Republicanos, que fará com que a Suprema Corte fique
com uma maioria de 6 conservadores contra 3 progressistas, está provocando
grande discussão política, e surge a tese de que os Democratas, se ganharem a
eleição para presidente com Joe Biden e o controle do Senado nas próximas
eleições, aumentem o número de juízes da Corte Suprema.
O democrata Franklin Roosevelt também ameaçou aumentar o número de integrantes
da Suprema Corte para conseguir aprovar medidas de seu programa New Deal,
lançado para combater as conseqüências da Grande Depressão de 1929, que estava
sendo barrado pela maioria conservadora.
Propôs ao Congresso, em 1937, lei aumentando a composição da corte para 15
juízes, e estabelecendo a nomeação de um juiz adicional, até o máximo de seis,
para quem superasse a idade de 70 anos, quando o mandato, até hoje, é
vitalício. A juíza Ruth Bader Ginsburg morreu no cargo aos 87 anos Em meio a
uma crise institucional sem precedentes, a Suprema Corte mudou de posição
devido ao juiz moderado Owen Roberts, cujo voto ficou conhecido como “the
switch in time that saved nine” (“a mudança no tempo que salvou nove”, em
tradução livre), e uma maioria a favor do “New Deal” foi formada.
Entre nós, no regime militar, através do Ato Institucional 2, de 1965, o
presidente Castello Branco aumentou de 11 para 16 o número de ministros do STF,
para controlar a maioria, considerada de esquerda pelos militares. Com o AI-5,
três juízes foram aposentados – Evandro Lins e Silva, Hermes Lima e Victor
Nunes Leal – e dois renunciaram em protesto: ministros Antônio Gonçalves de
Oliveira, presidente do tribunal, e Antônio Carlos Lafayette de Andrada.
Podendo nomear cinco novos ministro, Costa e Silva restabeleceu a composição da
corte com 11 ministros, número vigente até hoje. O presidente Jair Bolsonaro já
defendeu o aumento de cadeiras do Supremo de 11 para 21, alegando que a atual
composição da Corte é muito esquerdista. Depois de desistir de manter uma
guerra aberta com o Supremo, Bolsonaro não insistiu mais no golpe parlamentar,
mas pretende nomear um ministro “terrivelmente evangélico” para tentar reverter
decisões como a lei do aborto, que é também um ponto central na campanha dos
conservadores nos Estados Unidos.
O provável indicado é Jorge Oliveira, ministro-chefe da Secretaria-Geral da
Presidência da República. Há outros conservadores na disputa, como o
“terrivelmente evangélico” ministro da Justiça André Mendonça, o
Procurador-Geral da República, Augusto Aras, que tem se esforçado para se
mostrar próximo a Bolsonaro, e o ministro do Superior Tribunal de Justiça, João
Noronha.
Nos Estados Unidos, o presidente Trump indicou a juíza da Corte de
Apelação de Chicago Amy Coney Barret, uma professora da Universidade de Notre
Dame que já tem explicitado posições conservadoras em relação a temas polêmicos
como aborto, imigrantes e posse de armas.
Com 48 anos, garantirá aos conservadores uma longa supremacia na Corte Suprema
dos Estados Unidos.
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