Varejista Magalu acerta ao tentar ampliar a presença das vítimas do preconceito em cargos de liderança
Ao lançar um programa de treinamento exclusivo para negros, o varejista Magalu despertou reação virulenta nas redes sociais. Por usar a cor da pele como critério para seleção, a empresa foi acusada de racismo. Ao mesmo tempo, a iniciativa foi elogiada por movimentos negros, que a veem como um passo necessário na reparação de injustiças históricas.
O Magalu informou que, na empresa, se identificam como “pretos” ou “pardos” 53% dos funcionários, mas só 16% dos que ocupam cargos de liderança. De acordo com o presidente da empresa, Frederico Trajano, apenas 10 dos 250 trainees já contratados eram negros. Usar a cor da pele como critério é um atalho para corrigir a distorção.
Não apenas no Magalu, programas
semelhantes têm sido ocupados por brancos na quase totalidade. Isso é resultado
de políticas que, ao longo da história, garantiram aos brancos privilégios na
formação acadêmica, mas também do racismo que persiste em processos de seleção.
O Supremo Tribunal Federal tem sido consistente ao aprovar as cotas como forma
de ação afirmativa — e o critério do Magalu não passa de uma cota estipulada em
100%. Embora envolvam discriminação pelo fenótipo, as cotas não constituem, no
entendimento do STF, uma forma de racismo.
Não há ilegalidade, portanto, se uma
empresa privada quer adotar uma política para ajudar a corrigir uma distorção
histórica por meio de discriminação reversa. Trata-se de um único programa de
treinamento, não de um critério de seleção permanente. Há ainda, para a
sociedade, um benefício indireto, na medida em que, mesmo que os selecionados
não sejam contratados, o programa contribuirá para devolver ao mercado
profissionais negros mais capacitados, que poderão assumir posições de comando
noutras empresas.
Mas não é uma decisão isenta de custos.
Para a empresa, há custos internos de duas naturezas. Primeiro, trata-se de uma
seleção mais desafiadora para garantir a qualidade técnica dos profissionais.
Hoje, esse já é um custo mais fácil de mitigar, em virtude das políticas de
ação afirmativa que vêm sendo adotadas nas universidades e têm garantido ao
mercado uma oferta de profissionais negros capacitados bem maior do que poucos
anos atrás.
O segundo custo, revelado pelo
movimento de boicote contra a varejista promovido nas redes sociais, é bem mais
preocupante, na medida em que se estende para fora da empresa. A reação
virulenta resulta do racismo latente na sociedade. Dificilmente haveria a mesma
revolta diante de um programa de treinamento destinado apenas a mulheres.
Políticas de seleção como a do Magalu
oferecem pretexto a reações do tipo e, indiretamente, alimentam o ressentimento
e o discurso racista que maculam a política contemporânea. O Magalu está certo
em querer contratar mais negros para posições de liderança. Transformar isso em
jogada de marketing, contudo, pode contribuir para agravar o problema que a
empresa se propõe a resolver.
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