Os problemas da indústria brasileira se agravaram nos últimos anos com tributação elevada e ineficiente e cenário político e econômico instável
A forte recuperação da indústria nos últimos três meses animou o
setor. No gráfico da produção industrial é possível ver o traçado bastante
nítido de um V: depois de ter mergulhado em março e abril em consequência da
virtual paralisação das atividades causada pela pandemia do novo coronavírus,
voltou a subir de maio em diante. O otimismo, no entanto, tem limites. A
produção ainda está abaixo dos níveis pré-pandemia e a reação não é
generalizada.
Alguns segmentos não respondem com a mesma intensidade,
especialmente os de tecnologia mais elevada. Há perda de espaço da indústria de
transformação.
A necessidade de
isolamento social, o bloqueio aos fluxos de matérias-primas, peças e
componentes e a retração dos mercados interno e externo provocaram a virtual
interrupção das linhas de produção e resultaram em duro golpe no setor, que já
não vinha propriamente bem. Depois de crescimentos módicos em 2017 e 2018, de
2,5% e 1% respectivamente, a produção industrial caiu 1,1% em 2019, puxada pela
queda de 9,7% do setor extrativo, consequência do rompimento da barragem de
Brumadinho no início do ano.
Em janeiro e fevereiro deste ano a indústria vinha mostrando tímida melhora,
com crescimento de 1% e 0,9%, respectivamente, quando a pandemia chegou no
país. A economia como um todo experimentou um baque. A produção mergulhou 9,3%
em março e despencou mais 19,5% em abril. Apoiada em alguns segmentos, no
entanto, que ganharam dinamismo, como alimentos e produtos de informática,
reagiu em maio, com elevação de 8,7%, seguida por 9,7% em junho e 8% em julho.
No entanto, a indústria
terá que segurar esse ritmo extraordinário para neutralizar as perdas da
pandemia porque, na média, ainda está 6% abaixo do patamar em que estava em
fevereiro. No caso de alguns segmentos, a situação é ainda mais difícil por
sofrerem diretamente com a redução da mobilidade das pessoas e dificuldade de
financiamento. Entre eles estão vestuário, couro e calçados, que estão 38,7% e
30,7% respectivamente abaixo do patamar de fevereiro; e, pelos mesmos motivos,
veículos, 32,9% abaixo.
Alguns segmentos já superaram esse desafio, entre os quais aqueles cuja demanda
avançou em consequência da crise sanitária e seus reflexos. Entre eles estão a
produção de bebidas, 11,6% acima de fevereiro; a de equipamentos de informática
e eletrônicos, 8,6% superior; produtos de limpeza e cosméticos, 4,5%; e
alimentos, 3,5%.
Isso não significa,
porém, que o ano deve fechar no azul. Resta muita insegurança em relação à
própria evolução da pandemia, sem falar nas questões de fundo, como o andamento
das reformas econômicas e o ajuste fiscal. De janeiro a julho, a queda
acumulada da produção industrial está em 9,6% na comparação com o mesmo período
de 2019. As projeções do Boletim Focus para o ano de 2020 apontavam no final de
agosto recuo de 7,7%, reduzido para 6,3% ontem, enquanto a previsão para o PIB
é de - 5,05%.
Se esses números se confirmarem, deve-se esperar uma nova redução da
participação da indústria no PIB, que ficou em 20,9% em 2019, em comparação com
26,7% em 2000. Nesse espaço de tempo, a fatia da indústria da transformação
recuou de 15,3% para 11%. No acumulado do primeiro semestre, quando o PIB caiu
5,9%, a indústria da transformação contribuiu com queda de 10,7%.
A indústria brasileira
perde espaço também no cenário internacional. Em dez anos, sua participação
caiu praticamente pela metade, segundo acompanhamento da Organização das Nações
Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido). Em 2010, era de 2%, recuando
de 1,24% para 1,19% entre 2018 e 2019. A retração empurrou o país uma posição
abaixo no ranking de maiores potências industriais, para o 16º lugar. Enquanto
isso, países também emergentes que estavam atrás do Brasil passaram à frente. A
Indonésia está em 10º lugar; o México em 11º; e até a Turquia avançou, para o
15º posto.
O país ainda se destaca em setores de menor tecnologia, como couro e
calçados (4º lugar), papel e produtos de papel (5º); bebidas (7º); alimentos,
metais básicos e vestuário (8º) e produtos químicos, coque e derivados do
petróleo (9º).
Esse ranking retrata bem os problemas da indústria brasileira, que se agravaram
nos últimos anos com dificuldades de infraestrutura, tributação elevada e
ineficiente e cenário político e econômico instável. Esse conjunto inibe
investimentos, especialmente da indústria de maior tecnologia.
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